Diante da necessidade de conter a crise fiscal e retomar o crescimento, a economia foi a prioridade do governo Bolsonaro em 2019, seu primeiro ano de mandato. A agenda econômica começou com o envio da reforma da Previdência ao Congresso, em fevereiro. Passou pela edição de diversas medidas provisórias para facilitar o ambiente de negócios. E terminou com a apresentação, em novembro, das propostas que o governo espera que sejam aprovadas em 2020 para dar continuidade ao ajuste fiscal.
As medidas econômicas são, nas palavras do ministro da Economia, Paulo Guedes, capítulos de transformação do Estado brasileiro – sempre olhando para a dimensão fiscal, como gosta de ressaltar o ministro. Ou seja, o foco do governo é o controle dos gastos, principalmente os obrigatórios. O objetivo colocar as contas públicas em ordem para que, assim, a economia volte a ter um crescimento duradouro que resulte em geração de emprego e renda.
O primeiro e mais importante capítulo, até aqui, dessa transformação do Estado foi a aprovação da reforma da Previdência. O governo conseguiu passar no Congresso uma proposta robusta – a previsão é de uma economia de R$ 800 bilhões ao longo de dez anos. Também instituiu idade mínima para a aposentadoria, além de outras mudanças significativas.
Logo após a aprovação da Previdência, o governo apresentou ao Congresso um pacote de três propostas de emenda à Constituição (PECs) que pretendem dar continuidade ao ajuste fiscal iniciado pela Previdência, além de descentralizar recursos da União para estados e municípios – uma promessa de campanha de Bolsonaro.
Já a reforma tributária, a reforma administrativa e o projeto que vai acelerar as privatizações ficaram para serem apresentados em 2020. Essas propostas também fazem parte do chamado plano de transformação do Estado desenhado pela equipe do ministro Paulo Guedes.
Mas, em 2019, a equipe econômica não focou somente em grandes reformas. O governo editou a Lei da Liberdade Econômica, que visa a reduzir a burocracia e facilitar a vida de quem quer empreender. Também lançou o programa verde amarelo, para estimular a contratação de jovens pelas empresas. Regulamentou a transação tributária, permitindo que pessoas físicas e jurídicas possam renegociar algumas das suas dívidas com a União. O governo vendeu ainda ativos – como imóveis e ações – e incentivou que as suas estatais-mães vendessem também suas subsidiárias e ativos. E fez concessões para a iniciativa privada no ramo da infraestrutura (principalmente portos e aeroportos).
Outra medida para movimentar a economia foi a liberação do saque de R$ 500 do FGTS (ampliado posteriormente para R$ 998 para parte dos trabalhadores) e a criação do saque-aniversário – um benefício anual para quem quer tirar parte do dinheiro a que tem direito no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço.
Mais ações estão em andamento, como o projeto que torna o Banco Central independente formalmente e a proposta de criar um novo programa de socorro a estados endividados. Também estão em andamento os estudos para privatização de estatais de controle direto.
O governo fechou o ano com a menor taxa básica de juros da história (4,5% ao ano) e deve encerrar 2019 com um crescimento do produto interno bruto (PIB) melhor do que o esperado, apesar de ainda fraco. As contas do governo vão fechar no vermelho, mas abaixo da meta esperada (o que é bom). E a dívida pública começou uma trajetória de queda.
“São números espetaculares frente ao que a gente tinha no início do ano. Estamos terminando o ano numa situação muito melhor”, diz o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida. Ele salienta, porém, que o governo não pode, em 2020, afrouxar a sua política de controle de gastos, nem de reformas, sob o risco de reverter o cenário de melhora que está sendo desenhado.
Confira, abaixo, os principais feitos do governo Bolsonaro na economia, as ações que estão em andamento e os principais projetos que ficaram para 2020.
MEDIDAS NA ÁREA DA ECONOMIA EM VIGOR
1. Reforma da Previdência
Considerada prioridade número um para dar início ao ajuste das contas públicas, a reforma da Previdência foi a principal medida aprovada pelo governo Bolsonaro em seu primeiro ano de mandato. As novas regras de aposentadoria para a iniciativa privada e servidores públicos federais estão em vigor desde 13 de novembro.
Foram oito meses até que a reforma fosse aprovada no Congresso e, depois, mais três semanas até que ela fosse promulgada e entrasse em vigor. E, como esperado, os parlamentares fizerem mudanças relevantes o texto – nenhuma, porém, capaz de mudar a espinha dorsal do projeto do governo.
O governo enviou a proposta de reforma no dia 20 de fevereiro e propôs, entre outras coisas, idade mínima para aposentadoria, aumento do tempo mínimo de contribuição, regras de transição, mudança na forma de cálculo do benefício, novas alíquotas de contribuição e regras mais duras para acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), à aposentadoria rural, ao abono salarial e à pensão por morte. A previsão de economia era de R$ 1,2 trilhão ao longo de dez anos.
Já os parlamentares retiraram alguns pontos, como as mudanças que o governo pretendia para o Benefício de Prestação Continuada (BPC), para a aposentadoria rural e para o abono salarial.
Além disso, o Congresso excluiu a aplicação automática das regras para estados e municípios e afrouxou as regras para algumas categorias, como professores e policiais federais. Mas foi mantido o principal ponto da proposta do governo – o tempo mínimo de contribuição para o INSS.
No fim, a reforma aprovada pelo Congresso vai proporcionar uma economia de R$ 800 bilhões ao longo de dez anos. O governo, apesar de querer uma reforma que tivesse uma economia de cerca de R$ 1 trilhão, saiu satisfeito com o resultado. Foi uma reforma com uma economia robusta. O governo também conseguiu diminuir a distância entre as regras do regime geral, da iniciativa privada, e dos servidores públicos federais.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, só lamentou bastante a exclusão do artigo que permitiria ao governo criar um novo regime previdenciário baseado no sistema de capitalização (por meio do qual cada trabalhador poupa para sua própria aposentadoria).
2. Saque do FGTS e saque-aniversário
A equipe econômica liberou o saque de até R$ 500 das contas do FGTS, ativa ou inativas, e também criou mais uma modalidade para a retirada do dinheiro do fundo: o saque-aniversário. Mais recentemente, ampliou para parte dos trabalhadores a possibilidade de retirar mais recursos do fundo: R$ 998. Foi a principal medida do governo para injetar dinheiro na economia e tentar aquecer o consumo.
Todos os trabalhadores com contas ativas ou inativas no FGTS podem sacar até R$ 500. Por exemplo, se a pessoa tem uma conta ativa e outra inativa, vai poder sacar até R$ 500 de cada uma delas (ou R$ 988 para os trabalhadores que têm até um salário mínimo na conta do fundo). Os saques são feitos nas próprias agência da Caixa e são liberados de acordo com a data de aniversário da pessoa. Os resgates começaram a ser autorizados a partir de setembro e o dinheiro estará disponível para saque até 31 de março de 2020. A expectativa do governo é injetar R$ 40 bilhões na economia com a medida ainda neste ano.
Além do saque imediato, o governo criou o saque-aniversário. Quem tem conta ativa ou inativa no FGTS pode optar por sacar um percentual do dinheiro disponível em sua conta todo ano, de acordo com calendário estabelecido pela Caixa. Esse calendário segue a ordem de aniversário dos segurados. Em contrapartida, quem optar por retirar uma parcela do FGTS todo ano não vai ter direito a receber todo o dinheiro que tem no fundo quando é demitido. Por isso, o saque-aniversário é opcional. A adesão começou em setembro e vai até o dia 31 de dezembro de 2019.
3. Lei da Liberdade Econômica
Na área de negócios, a principal medida aprovada pelo governo foi a Lei da Liberdade Econômica, enviada ao Congresso por meio de medida provisória (MP). A lei estabelece uma série de ações para desburocratizar e facilitar a vida de quem empreende, e também mexe em alguns pontos da legislação trabalhista.
A Lei da Liberdade Econômica tem três principais pontos para diminuir a burocracia para quem tenta abrir um negócio (em especial uma pequena ou média empresa): dispensa de alvará para atividades de baixo risco; limitação do poder do Estado ao criar a figura do abuso regulatório; e determinação de prazos para que os órgãos respondam aos pedidos do empreendedor.
Os pontos mais polêmicos da lei foram os que mexeram com questões trabalhistas. Durante a tramitação no Congresso, a MP ganhou o apelido de “minirreforma trabalhista”, pois modificava um grande número de itens da legislação que foram incluídos no texto a pedido do governo e/ou dos deputados.
Mas logo essa manobra começou a ser questionada, e a maioria dos pontos acabou caindo nas votações em plenário, como a permissão de trabalhos aos domingos e feriados para todos os setores. Alguns, porém, ficaram. É o caso da regulamentação do "ponto exceção" para empresas com mais de 20 funcionários mediante acordo – medida que na prática dispensa o trabalhador de bater ponto de entrada e saída. Há ainda a autorização para criação da carteira de trabalho digital e a autorização para extinção do e-Social e substituição por um novo sistema.
Estudo realizado pela Secretaria de Política Econômica do Ministério da Economia (SPE/ME) estima que as medidas implementadas com a nova lei podem levar a um crescimento de 7% no Produto Interno Bruto (PIB) per capita e a um incremento de 4% na geração de empregos em um período de 10 a 15 anos.
4. Carteira verde amarela
Para combater o desemprego, a principal medida desenhada pela equipe econômica foi a “carteira verde amarela”. Trata-se de um programa de estímulo ao emprego para jovens de 18 a 29 anos. A expectativa é gerar 1,8 milhão de novos postos de trabalho até 2022. O programa consta de medida provisória enviada ao Congresso em novembro. Apesar de estar em vigor, a MP ainda não foi ratificada pelos parlamentares.
Pelo programa, as empresas que contratarem jovens nessa faixa etária para ganhar até R$ 1,5 mil por mês vão ter parte da folha desonerada. Ou seja, a empresa vai pegar menos impostos que incidem sobre a folha de pagamento, tornando o custo de contratação mais baixo. Segundo o governo, o custo deve cair em torno de 33%.
As empresas não vão mais precisar recolher a contribuição patronal ao INSS (que é de 20% sobre a folha), nem as alíquotas do Sistema S, do salário-educação e do Incra. Já a contribuição ao FGTS será de apenas 2% (frente aos 8% habituais). Caso a empresa decida demitir esse jovem depois, terá de pagar uma multa de 20% sobre o saldo do FGTS, e não de 40%.
A desoneração na folha deve custar R$ 10 bilhões ao longo de cinco anos aos cofres públicos, segundo a equipe econômica. Essa perda de arrecadação será compensada com a com a cobrança de INSS sobre o seguro-desemprego, hoje isento. O seguro-desemprego será taxado em 7,5% e o dinheiro vai para a Previdência. Em contrapartida, o tempo de seguro-desemprego vai contar para a aposentadoria.
Esse é um dos pontos mais polêmicos da medida provisória e já enfrenta resistências no Congresso. Além disso, a MP que criou a “carteira verde amarela” também acabou com a multa extra de 10% do FGTS (paga pelas empresas que demitem ao governo) e permite trabalho aos domingos e feriados a todas as categorias. Esse último ponto também é polêmico e deve ser mudado pelos parlamentares.
5. Renegociação de dívidas - contribuinte legal
O governo editou, em outubro, a MP do contribuinte legal, uma medida provisória que permite que pessoas e empresas, sem condições de quitar seus débitos tributários, renegociem a dívidas que possuem com a União. Os descontos poderão chegar até 70% e os prazos para pagamento do débito poderão ser de até 100 meses.
O governo nega que a medida seja mais um Refis – os tradicionais programas de refinanciamento de dívidas. O argumento é que a MP regulariza a chamada “transação tributária”, prevista no artigo 171 do Código Tributário Nacional (CTN), focando na regularização de dívidas de difícil recuperação de pessoas físicas e jurídicas que não têm condições de quitar integralmente seus débitos.
Segundo o governo, 1,9 milhão de devedores inscritos na dívida ativa podem ser beneficiados com a medida. Eles devem mais de R$ 1,4 trilhão à União. O governo também estima que mais de R$ 600 bilhões em débitos, que estão sendo discutidos no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), possam ser renegociados.
6. Venda de ativos (subsidiárias, imóveis e ações)
O governo tinha como meta vender US$ 20 bilhões em ativos em 2019 e, no início de outubro, bateu essa meta com folga. Até a data de fechamento desta reportagem, o governo já tinha levantado, direta ou indiretamente, mais de R$ 100 bilhões com a venda de ativos.
Esse valor inclui as concessões de infraestrutura e a venda de subsidiárias da Eletrobras – que foram realizadas pelo governo Temer, mas o dinheiro para a Eletrobras caiu só neste ano – e da Petrobras (incluindo refinarias). Também foram vendidas ações que a União, a Caixa, o Banco do Brasil e o BNDESPar possuíam em companhias privadas.
Arrecadação com concessões entra diretamente no caixa do governo, assim como a venda de ações que a União tinha em empresas privadas. O restante – venda de subsidiárias, venda de ações que estatais possuem em diversas companhias e venda de e ativos naturais – entram no caixa da estatal-mãe que vendeu o ativo.
O governo também deu início à venda de imóveis da União. A meta é se desfazer de cerca de 4 mil imóveis até 2022 e arrecadar algo em torno de R$ 36 bilhões.
7. Juros
Na área monetária, o governo Bolsonaro foi palco de um marco: a menor taxa Selic da história. A queda da taxa de juros básico da economia – que começou 2019 em 6,5% ao ano e já está em 4,5% – aconteceu principalmente devido à inflação baixa e ao relativo fraco desempenho da economia (a expectativa é de o PIB crescer apenas 1% em 2019). Mas a queda da Selic também ocorreu por causa do ajuste fiscal, que inclui a aprovação da reforma da Previdência e o envio ao Congresso de um pacote de medidas para conter gastos obrigatórios.
Ainda sobre juros, o Banco Central – que é independente informalmente, mas ligado ao governo Bolsonaro formalmente – limitou a taxa de juros do crédito especial a 152% ao ano (8% ao mês). Foi a primeira vez que a autoridade monetária estabeleceu um teto para o cheque especial. Em contrapartida, os bancos vão poder cobrar pela disponibilização dessa modalidade de crédito. A cobrança valerá apenas para clientes com limite superior a R$ 500.
Além do Banco Central, a Caixa Econômica Federal vem liderando uma guerra contra os juros. O banco público já baixou os juros do financiamento imobiliário e do cheque especial.
MEDIDAS DA ÁREA DE ECONOMIA EM ANDAMENTO
1. PEC do pacto federativo
Depois da aprovação da reforma da Previdência, o governo enviou ao Congresso um pacote de propostas de emenda à Constituição (PECs) para dar continuidade ao ajuste fiscal. A principal delas é a PEC do Pacto Federativo, em tramitação no Senado. O texto deve ser votado pelos parlamentares ao longo do próximo ano.
Ela propõe transferir R$ 400 bilhões que ficariam com a União para todos os estados e municípios ao longo de 15 anos. O repasse será feito através de uma nova política de distribuição do que é arrecadado com salário-educação e, principalmente, com recursos de exploração de petróleo e gás natural (royalties e participações especiais).
Em troca, o governo estabelece uma série de contrapartidas. A mais importante delas é o fim das ações judiciais que pedem a compensação da Lei Kandir, que desonerou as exportações de ICMS – que é um imposto estadual.
Além de repartir recursos com estados e municípios, a proposta unifica o mínimo constitucional que deve ser gasto em saúde e educação. O objetivo é dar mais liberdade para os gestores públicos manejarem o orçamento. Ainda do lado do orçamento, o texto propõe a desvinculação das receitas, com exceção do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), Fundo de Participação dos Estados (FPE) e outras vinculações constitucionais. Ou diminui o porcentual das verbas orçamentárias que obrigatoriamente têm de ser destinadas a áreas específicas.
A PEC cria o Conselho Fiscal da República, que vai zelar pelas contas públicas de todos os entes federativos. Esse conselho será formado por representantes do governo federal, do Legislativo e do Judiciário. A intenção é uniformizar a divulgação dos orçamentos públicos e avaliar a sustentabilidade financeira dos entes federativos, incluindo a União.
A PEC também propõe que os benefícios tributários serão reavaliados a cada quatro anos. No âmbito federal, a partir de 2026, eles não poderão ultrapassar 2% do PIB – hoje as renúncias fiscais da União somam cerca de 4% do PIB.
Já para conter gastos obrigatórios, a PEC constitucionaliza o Estado de Emergência Fiscal para quando as contas públicas da União, estados e municípios saírem de controle. Sempre que isso acontecer, o “estado de emergência” será acionado e será possível segurar alguns gastos obrigatórios, como reajuste de servidor, progressão de carreiras, promoções, além de proibir novos concursos públicos e poder reduzir a jornada de trabalho do servidor em 25% (e, consequentemente, cortar o salário na mesma medida).
O ponto mais polêmico da PEC é a extinção de municípios com menos de 5 mil habitantes que tenham arrecadação própria inferior a 10% da sua receita total. Esses municípios deverão ser incorporados pelo vizinho se a PEC for aprovada. Houve, porém, bastante rejeição a esse ponto e a tendência é que ele caia no Congresso.
2. PEC Emergencial: medida para o governo fazer economia
A proposta de emenda à Constituição (PEC) Emergencial também faz parte do pacote enviado pelo governo no pós-reforma da Previdência. Ela é, na verdade, um desmembramento da PEC do Pacto Federativo com medidas para conter as despesas obrigatórias. O objetivo do governo é que ela seja aprovada rapidamente, antes da PEC do Pacto Federativo. Com isso, o “estado de emergência” já pode ser acionado e o ajuste fiscal começar.
A PEC Emergencial estabelece que sempre que um ente entrar em “estado de emergência fiscal”, ele estará proibido de dar reajuste; promoção; progressão de carreira; criar novos cargos; contratar pessoal; e realizar concurso público. Além disso, vai poder cortar a jornada e o salário do servidor em até 25%. As medidas terão validade por um ou dois anos.
A União entrará automaticamente em “estado de emergência” quando descumprir a regra de ouro – mecanismo que proíbe que o governo contraia dívidas para pagar despesas correntes (salários, aposentadorias, despesas de custeio da máquina pública). Já nos estados e municípios o "estado de emergência" passa a vigorar quando a despesa corrente ultrapassar 95% da receita corrente líquida.
A proposta já caminhou na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, mas só deve ser votada em Plenário em 2020.
3. PEC dos fundos públicos
Outra proposta de emenda à Constituição (PEC) que compõe o pacote de ajuste fiscal é a PEC dos fundos públicos. Essa proposta, caso aprovada pelo Congresso, elimina os 248 fundos infraconstitucionais – ou seja, cuja criação não está estabelecida pela Constituição. Eles só poderão ser recriados caso aprove-se uma lei complementar em até dois anos. São quase R$ 220 bilhões parados nesses fundos que poderão ser liberados para pagar a dívida pública.
São exemplos de fundos que poderão ser extintos: Fundo de Desenvolvimento do Ensino Profissional Marítimo, Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações, Fundo Especial de Treinamento e Desenvolvimento e Fundo de Garantia para a Promoção da Competitividade.
Os fundos constitucionais, que totalizam 33, não estão incluídos na PEC e serão preservados.
O texto também já caminhou na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, mas só deve ser votado no plenário em 2020.
4. Independência do Banco Central
O governo enviou em abril um projeto de lei complementar ao Congresso para dar autonomia formal ao Banco Central (BC). É uma das principais bandeiras da agenda liberal da economia e um sonho do presidente da instituição, Roberto Campos Neto. Seu avô, o economista Roberto Campos, tentou tornar o BC autônomo, mas não teve sucesso. O principal objetivo do governo com a medida é reduzir o risco de ingerência política na instituição monetária.
Se o projeto for aprovado pelos parlamentares, o BC passa a ser formalmente independente do governo e a instituição perde o atual status de ministério e deixa de estar vinculada ao Ministério da Economia. Além disso, o presidente da autoridade monetária passaria a ter um mandato de quatro anos, podendo o prazo ser prorrogado pelo mesmo período.
Atualmente, o Banco Central já funciona de maneira autônoma, mas isso não está no papel. Ou seja, não há uma independência formal, apenas um acordo para que o governo federal não interfira nas decisões na autoridade monetária.
O projeto ainda está em tramitação e a votação só deve ser finalizada em 2020.
5. Plano Mansueto de socorro aos estados
Em junho, o governo enviou à Câmara Plano de Equilíbrio Fiscal (PEF), também chamado de "Plano Mansueto", que permite que estados em crise financeira peçam empréstimos com garantias da União desde que adotem medidas de ajuste fiscal. É um dos capítulos do plano de transformação do Estado desenhado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, e pelo secretário do Tesouro, Mansueto Almeida.
O projeto cria um novo programa de socorro a estados endividados. Esse programa permite que unidades da federação em crise financeira possam ter acesso a crédito com garantias da União desde que se comprometam a colocar em prática um pacote de ajuste fiscal.
O programa será destinado aos estados considerados sem capacidade de pagamento e que, por isso, levam notas baixas (C e D) na avaliação anual do Tesouro. Hoje, esses estados não podem pegar empréstimos usando a União como garantia, pois somente estados com notas A e B têm essa vantagem.
A previsão do governo é que o PEF dê o aval a empréstimos de R$ 40 bilhões ao longo de três ou quatro anos para os estados que entrarem no programa. Esses empréstimos serão obtidos pelos estados junto a bancos e organismos internacionais, e a União entrará como garantidora. Ou seja, se o estado não pagar, a dívida fica com a União. Empréstimos com garantia da União são mais baratos e fáceis de serem tomados.
Para aderir ao programa, os estados têm que adotar pelo menos três de oito medidas de ajuste fiscal sugeridas pelo programa. Entre elas, estão: autorização para privatização de estatais estaduais/municipais, adoção do teto de gastos, desestatização do serviço de saneamento, redução dos benefícios tributários e revisão do regime jurídico dos servidores.
O projeto está parado na Câmara.
6. Privatização de estatais de controle direto
O governo Bolsonaro vai terminar 2019 sem privatizar nenhuma estatal de controle direto. Esse cenário, porém, deve mudar a partir de 2020. O governo já incluiu 17 estatais de controle direto no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) e/ou no Programa Nacional de Desestatização (PND). O PPI é um primeiro passo rumo à privatização e, quando uma estatal é incluída no PND, o governo confirma a sua intenção de privatizá-la.
Para 2020, é esperada a venda de cinco estatais de controle direto: ABGF, Casa da Moeda, Ceagesp, Ceasaminas e EMGEA. O governo quer privatizar ainda a Eletrobras. Mas, para isso, precisa da autorização do Congresso. O projeto já está na Câmara.
7. Abertura do mercado de gás
Mais uma ação do governo na área da economia foi o início da abertura do mercado de gás natural. O objetivo é gerar um “choque de energia” barata no país, segundo o ministro da Economia Paulo Guedes. O gás natural é usado, principalmente, por indústrias. Atualmente, a Petrobras tem o monopólio, direta ou indiretamente, de produção, transporte e distribuição.
O primeiro passo para a abertura foi o acordo assinado entre a Petrobras e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para que a estatal saia do mercado de transporte e distribuição de gás.
Também está em andamento uma nova regulamentação para que os estados que têm distribuidoras locais de gás permitam o acesso de terceiros aos gasodutos (hoje há restrições) e que consumidores possam comprar de qualquer distribuidor. O governo quer, ainda, incentivar esses estados a venderem suas distribuidoras regionais.
MEDIDAS NA ECONOMIA AINDA A FAZER
1. Reforma administrativa
O envio da reforma administrativa do funcionalismo público federal foi prometido diversas vezes neste ano, mas ficou para 2020. Apesar de o projeto ter ficado pronto dentro do Ministério da Economia, ele não teve aval total do presidente Jair Bolsonaro, que solicitou algumas modificações. O Planalto também pediu para segurar o envio da medida para evitar protestos numa época de “clima quente” na América do Sul.
A reforma administrativa vai atingir, principalmente, os novos servidores públicos. Segundo informações que vazaram à imprensa, a ideia é reduzir o número de carreiras, diminuir os salários de entrada e aumentar o tempo de progressão para que os funcionários demorem mais para chegar o topo da carreira. O texto também deve prever ações para medir desempenho dos funcionários.
O ponto mais polêmico é o possível “fim” da estabilidade. A ideia da equipe econômica é garantir estabilidade somente após determinado tempo de serviço público e para carreiras de Estado.
2. Reforma tributária
Outra reforma que foi prometida diversas vezes foi a tributária. Mas ela também ficou para 2020. A ideia do governo era enviar uma ampla proposta de emenda à Constituição para reformular o sistema tributário, unificando impostos, desonerando a folha e mexendo com o Imposto de Renda (IR). Em compensação, seria criado um imposto sobre movimentações financeiras, nos moldes da antiga CPMF.
Os planos foram por água abaixo assim que a ideia de recriar a CPMF veio à tona. O presidente Bolsonaro barrou a reforma e o secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra, que vinha coordenando os trabalhos sobre o texto, foi demitido.
Com isso, a equipe econômica teve que redesenhar a sua proposta de reforma tributária. A ideia agora é dividi-la em quatro fases: a primeira é criar um imposto federal de valor agregado em troca da unificação do PIS e do Cofins. Depois, haveria a transformação do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) em um tributo seletivo, incidindo apenas sobre a produção de produtos como cigarros e bebidas. A terceira etapa inclui a desoneração da folha de pagamentos. E a última, mudanças no Imposto de Renda (IR).
No caso da folha, ainda não se sabe como o governo vai propor a desoneração total, já que colocar uma CMPF para compensar a perda de arrecadação foi vetada. Já para o IR, a ideia é aumentar a faixa de isenção de pessoas físicas, reduzir a alíquota máxima cobrada pelas empresas e rever as deduções.
3. Fast track da privatização
O governo prometeu enviar em 2019 um projeto de lei para acelerar as privatizações, em especial das estatais de controle direto. A avaliação é que para vender uma estatal leva-se de um ano e meio a dois – muito tempo dentro das pretensões da atual equipe econômica. Para acelerar o processo, o governo deve propor pular algumas etapas hoje obrigatórias para a privatização, como passar pelo Programa de Parcerias e Investimentos (PPI), e tirar a exclusividade do BNDES na modelagem dos editais de privatização. O governo também deve colocar nesse projeto todas as estatais que quer privatizar, para ter a autorização legislativa de uma só vez.
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