| Foto: Ana Volpe/Agência Senado

O Senado impôs uma das maiores derrotas do governo na reforma da Previdência ao derrubar as novas regras para o abono salarial. Pelas contas da Instituição Fiscal Independente (IFI), o revés reduzirá em cerca de R$ 70 bilhões a economia proporcionada pela nova legislação ao longo de uma década. O Ministério da Economia estima perda ainda maior, de R$ 76 bilhões.

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O abono salarial é um benefício no valor de até um salário mínimo (R$ 998) pago anualmente a todos os trabalhadores que atendam a todas as seguintes condições:

  • tenham carteira assinada há pelo menos cinco anos;
  • tenham trabalhado em emprego formal por no mínimo 30 dias no ano anterior; e
  • tenham recebido até dois salários mínimos (R$ 1.996) por mês em emprego formal no ano anterior.
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O pagamento é proporcional ao tempo trabalhado: se o funcionário ficou seis meses empregado com carteira no ano de referência, receberá meio salário mínimo de abono.

Hoje cerca de 23,7 milhões de brasileiros têm direito ao benefício, que em 2018 custou R$ 17,2 bilhões ao Tesouro.

O que o governo queria mudar no abono salarial

No texto original da reforma, o governo pretendia pagar o benefício apenas a quem recebe no máximo um salário mínimo por mês. Com isso, cerca de 90% dos atuais beneficiários deixariam de receber o abono, o que geraria uma economia de R$ 150 bilhões em dez anos aos cofres federais, segundo a IFI.

A proposta, no entanto, foi bombardeada desde o início. Parlamentares de oposição tentaram derrubar as novas regras em todas as fases de tramitação da reforma. Além do argumento da justiça social, que é contestado por muitos estudiosos, deputados e senadores apontaram que o abono não é questão previdenciária e, portanto, não deveria fazer parte da reforma.

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As regras que deputados e senadores alteraram

A primeira derrota para o governo veio na Câmara dos Deputados, que decidiu que teriam direito ao benefício aqueles que recebem até R$ 1.364,43 por mês. Com isso, estima-se que 46% dos trabalhadores que hoje ganham o abono deixariam de recebê-lo.

O golpe fatal nas pretensões do ministro Paulo Guedes veio no Plenário do Senado. O governo precisava de 49 votos para rejeitar uma emenda do partido Cidadania que eliminava da reforma qualquer alteração em nas regras atuais do abono, mas conseguiu apenas 42. Com isso, segue valendo a atual legislação, resumida no início deste texto.

A mesma proposta, de derrubar qualquer mudança no abono, havia sido rejeitada horas antes, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, por 15 votos a 10. No Plenário, no entanto, o governo não conseguiu prevalecer.

Benefício aumenta ganho de trabalhadores que já são protegidos

A ideia de restringir o acesso ao abono salarial não surgiu no governo de Jair Bolsonaro. É discutida por economistas e técnicos do Executivo há muitos anos. A primeira limitação no seu pagamento foi aprovada em 2015, no governo de Dilma Rousseff (PT), quando o benefício passou a ser proporcional ao tempo trabalhado no mercado formal no ano anterior.

Quem defende reduzir o gasto com o abono argumenta que ele representa um peso grande para as contas públicas – nos últimos 20 anos, o gasto anual passou de 0,09% para 0,25% do PIB, segundo a IFI – e privilegia trabalhadores que já são protegidos, por serem empregados formais. Além disso, não chega a milhões de pessoas que vivem na informalidade.

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Um documento preparado pelo Ministério da Fazenda no fim da gestão de Michel Temer (MDB) afirmava que o abono é uma política "pouco eficiente tanto do ponto de vista distributivo quanto no incentivo à formalização no mercado de trabalho". Segundo o texto, "cerca de 67% dos beneficiários do abono encontram-se entre os 60% mais ricos da população".

O relatório, chamado de Panorama Fiscal Brasileiro, propunha o pagamento do abono apenas a quem ganha até um salário mínimo, "dada a sobreposição com outros programas sociais (Bolsa Família, Salário Família e benefícios previdenciários,
principalmente) que atendem os mesmos beneficiários".

A avaliação dos técnicos do governo é de que o Bolsa Família é mais focalizado, isto é, beneficia mais as camadas mais pobres da população. E, com isso, tem potencial muito maior de reduzir a pobreza, a um custo proporcionalmente mais baixo que o abono. Hoje cerca de 13,5 milhões de famílias recebem o Bolsa Família, a um custo de R$ 30 bilhões por ano.

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