Presidente da Câmara, Arthur Lira, recebeu o presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, para tratar do distritão| Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados
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Encampada pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e por bancadas de diversos partidos, a reforma eleitoral discutida no Congresso poderá mudar o modelo atual para a eleição de deputados e vereadores já nas eleições de 2022. Chamado de “distritão”, o novo modelo vem gerando polêmica e questionamentos, mas a ideia dos defensores é a avançar ainda em julho com essa mudança, que consta da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma eleitoral.

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Atualmente, vereadores e deputados (estaduais e federais) são eleitos pelo sistema proporcional. Nesse modelo, os assentos nas Casas Legislativas são distribuídos a partir de cálculos, desconhecidos da maioria dos eleitores, que incluem o número total de votos válidos e a votação total de cada candidato de uma legenda somado aos votos em seu partido (voto na legenda).

Terminada a apuração, calcula-se o chamado "quociente eleitoral", que vem a ser o número de votos que um candidato precisa para ser eleito. O quociente eleitoral se dá a partir de uma operação matemática em que se divide o número de votos válidos pela quantidade de cadeiras que haverão de ser preenchidas no Legislativo.

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O quociente eleitoral entra então no cálculo do "quociente partidário", que determina quantas vagas cada partido terá direito. Para chegar ao quociente partidário, entram os votos de todos os candidatos daquela sigla, os votos na legenda e as "sobras" de votos dos chamados "puxadores de voto" – candidatos com votação muito acima da média.

Partidos que têm muitos votos de legenda e candidatos "puxadores de voto", com mais votação do que o necessário para se eleger, acabam tendo direito a mais vagas. Elas são preenchidas pela lista dos mais votados naquela sigla.

Na prática, esse modelo permite que um candidato menos votado se eleja e que um mais votado de outra legenda fique de fora.

Já no modelo distritão, são eleitos simplesmente os candidatos mais votados, sem nenhum cálculo. Nesse modelo, em vez de priorizar o apoio a partidos, a tendência é de políticos que são mais conhecidos sejam beneficiados, já que eles tendem a conquistar mais votos do que um político estreante, por exemplo.

Os defensores do distritão argumentam que a nova modalidade simplificaria a compreensão, pelo eleitorado, pois somente quem tem maior votação se elege. E o distritão também asseguraria uma maior representatividade, pois seriam os detentores da maioria dos votos do eleitorado são eleitos.

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As críticas ao modelo do distritão

Mas há críticas ao modelo do distritão. Para Arnaldo Monteiro, professor de Ciência Política e mestre em Direito Eleitoral pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), o distritão tende a encarecer as campanhas eleitorais.

“Seria necessário ampliar ainda mais o número de propaganda por todo o distrito, correspondente à unidade federativa sede da disputa, para que o candidato conquiste mais votos, situação que levaria a um maior gasto de recursos financeiros”, argumenta. O distrito (ou distritão), no caso, seria o estado nas eleições estaduais e o município nas eleições municipais.

O modelo proposto também é alvo de críticas por parte do ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Segundo ele, o distritão enfraquece as minorias.

“Vejo que o distritão tem os problemas de não baratear o custo das eleições, enfraquecer os partidos e diminuir a representação sobretudo de minorias. Portanto, eu o vejo com reservas também. Mas, de novo, essa é uma matéria para o Parlamento”, disse o presidente do TSE durante uma audiência pública na Câmara dos Deputados.

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A argumentação de que a representação das minorias seria enfraquecida se baseia justamente no fato de que o atual modelo permite que candidatos com menos votos se elejam.

Distritão misto é ideia para vencer resistências

O distritão já chegou a ser proposto outras duas vezes pelos deputados, em 2015 e 2017, mas acabou sendo derrotado ambas as vezes pelo plenário da Câmara.

Contudo, agora os defensores do modelo articulam duas medidas para tentar acabar com as resistências. Uma delas seria o “distritão misto”, que destinaria metade das cadeiras para os mais votados e mantém a outra metade no modelo atual, proporcional. Nesse caso, o deputado que entrasse pelo modelo do distritão não “puxaria” votos para o proporcional.

No modelo que vem sendo concebido, São Paulo, por exemplo, elegeria 35 deputados federais por uma lista dos mais votados no estado, e seus votos não entrariam na conta que definiria os outros 35 escolhidos de forma proporcional. São Paulo elege 70 deputados federais.

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A proposta do distritão misto é uma tentativa de romper as resistências dos partidos de esquerda e centro-esquerda. Contudo, integrantes do Centrão avaliam que caso não haja adesão dessas legendas, a tendência é o que o distritão puro seja levado adiante.

Relatora da reforma eleitoral, a deputada Renata Abreu (Podemos-ES) acredita que esse seria um meio termo e uma forma de transição para o modelo “distrital misto”. Esse é sistema adotado para a eleição do parlamento da Alemanha. Nesse caso, o país seria divido em distritos que elegeriam cada um seu deputado (um único parlamentar por distrito). A outra metade seria escolhida pelo sistema atual. De acordo com a relatora, esse o voto distrital misto entraria em vigor na eleição de 2026.

Com isso, o distrital misto obrigaria o eleitor a votar duas vezes: um voto para candidatos em um distrito pré-estabelecido pela Justiça Eleitoral e outro para uma lista de candidatos apresentada pelos partidos. Esse modelo conta com a simpatia do presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, por exemplo.

"Não vejo o distritão como um sistema definitivo, acredito que ele possa ser um sistema transitório para o distrital misto, o que possibilita um acordo com os parlamentares”, argumenta Renata Abreu. Para a deputada, o modelo acabaria com os "puxadores" de votos.

O PT, que tem a maior bancada dentro da Câmara ao lado do PSL, com 53 deputados, tem sido a legenda mais resistente às mudanças. A presidente da sigla, deputada Gleisi Hoffmann (PR), disse que o distritão é a “personalização da política”.

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“Não são as personalidades que individualmente mudam a sociedade, mas os programas apresentados pelos partidos que fundamentam sua atuação. E as lideranças que conduzem o processo político são resultado do coletivo. A proporcionalidade do Parlamento é fundamental para a democracia. E os partidos são instrumentos para isso”, diz Gleisi.

Quando a reforma eleitoral pode ser votada

O presidente da Câmara, Arthur Lira, trabalha com um cronograma de aprovação da reforma eleitoral nos próximos dias, até o começo do recesso parlamentar, em 17 de julho. Com isso, o Senado teria em torno de dois meses para votar a proposta, para que ela passe a valer já nas eleições do ano que vem.

Uma mudança eleitoral tem de ser aprovado com pelo menos um ano de antecedência para entrar em vigência na eleição seguinte. Ou seja, a reforma eleitoral tem de estar votada até o início de outubro deste ano para valer para 2022.

Por se tratar de PEC, é preciso de ao menos 60% de votos em votação em dois turnos tanto na Câmara quanto no Senado – ou seja, ao menos 308 deputados e 49 senadores.

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