Há 15 anos, parlamentares vêm discutindo uma nova lei geral para os licenciamentos ambientais na Câmara dos Deputados. O tema polêmico não divide apenas as bancadas ruralista e ambientalista da Casa: sem consenso entre os parlamentares, o projeto de lei foi se arrastando em comissões e não chegou ao plenário.
A versão que deve ser votada na volta do recesso branco também tem suas controvérsias: pode dispensar o licenciamento para atividades rurais, modifica prazos para licenças e prevê condições especiais e simplificadas para alguns tipos de obras, como melhorias em estradas. Além disso, prevê que órgãos como a Funai e Fundação Palmares percam o poder vinculante que possuem hoje para o veto a pedidos de licença.
O tema deve entrar na pauta da Câmara na volta dos deputados ao trabalho por dois fatores principais. O primeiro é o endosso do presidente da Câmara, rodrigo Maia (DEM-RJ) ao tema, que faz parte de sua agenda de desburocratização da economia. O outro é que a proposta caiu na relatoria do novato Kim Kataguiri (DEM-SP), que coordenou um grupo de trabalho para discutir o assunto e foi elogiado pela habilidade na interlocução com os dois grupos.
Também pesa para o retorno do tema à pauta legislativa a nova política ambiental do governo de Jair Bolsonaro. Crítico contumaz das leis brasileiras, o ministro do meio ambiente, Ricardo Salles, costuma dizer que o excesso de burocracia acaba prejudicando o setor.
Em maio deste ano, o ministro falou sobre a questão no 91º Encontro Nacional da Indústria da Construção Civil, no Rio de Janeiro. Ele disse que o tema ambiental no Brasil era manipulado por uma agenda ideológica contrária ao desenvolvimento e que o país necessidade de uma legislação que proporcione segurança jurídica, previsibilidade e respeito à propriedade privada e aos contratos. "Hoje não basta conseguir a licença [ambiental], ainda tem que rezar para que elas continuem válidas, para que não sejam derrubadas. Não existe isso em nenhum país do mundo", declarou.
O que está em jogo
O licenciamento ambiental é um tipo de ferramenta de gestão pública que permite a localização, instalação, ampliação e operação de empreendimentos e atividades, como a construção de estradas e hidrelétricas. Quem dá essa licença são órgãos ambientais estaduais ou o próprio Ibama, quando se trata de grandes projetos.
Basicamente, o processo de licenciamento é dividido em três etapas: licença prévia (solicitada na fase de planejamento), licença de instalação (detalhamento do projeto de construção) e licença de operação (autoriza o início das atividades).
A proposta relatada por Kataguiri pretende acelerar esse processo, estabelecendo prazos para cada etapa do licenciamento. O Instituto Socioambiental (ISA), por exemplo, considera esse um ponto problemático. “O efeito pode ser o inverso do que se pretende. Ao invés de acelerar a emissão de licenças, a falta de condições institucionais dos órgãos ambientais pode resultar no indeferimento de licenças”, alertou em texto que elenca as principais questões sensíveis do projeto.
Kataguiri defende a agilidade do licenciamento e o estabelecimento de prazos para repostas, sejam positivas ou negativas. “É uma oportunidade de que todos os órgãos manifestem suas deficiências e que elas sejam endereçadas pelo poder Executivo competente”, declarou à Agência do Rádio.
O texto também prevê a dispensa de licenciamento ambiental para algumas atividades, como a agropecuária, de caráter militar e serviços de melhoria, modernização e manutenção de infraestrutura de transportes, como rodovias, ferrovias e portos. No caso dos produtores rurais, para ter a dispensa do licenciamento, é preciso obter a validação do Cadastro Ambiental Rural (CAR) – a inscrição autodeclaratória passaria a ter efeitos de licença. Já para a modernização de estradas, a dispensa da licença é vista com reservas porque há relação entre desmatamento e asfaltamento de rodovias, principalmente na região da Amazônia.
As mudanças propostas também retiram o poder vinculante de instituições como a Funai e Fundação Palmares, que trabalham com comunidades indígenas e quilombolas. Hoje, esses órgãos podem vetar a concessão de licenças ambientais. Caso o projeto de lei avance do modo como está, elas perderam essa participação. Também terão a participação restringida o ICMBio e o Iphan, responsáveis pela gestão de unidades de conservação e patrimônio histórico.
Além disso, o PL também deixa de estabelecer prazo máximo para alguns tipos de licença (única, de operação e corretiva), o que permitiria emissão de autorizações com prazo de cem anos ou mais.
Tramitação
Com o apoio de Rodrigo Maia, a expectativa é de que o projeto de lei entre na pauta da Câmara ainda este ano. Um grupo de trabalho, criado em junho, realizou uma série de audiências públicas para discutir o texto. Esse trabalho foi encerrado no começo de julho. O texto está ponto para ser analisado no Plenário, onde só precisa de maioria simples para ser aprovado e enviado para o Senado.
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