O caso do desaparecimento e provável duplo assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista inglês Dom Phillips está mais perto de ser elucidado pela Polícia Federal do Amazonas. O termo “provável” é uma formalidade, visto que, apesar da confissão de um dos suspeitos, que levou as autoridades até os corpos na reserva do Javari, falta ainda a confirmação oficial da identidade dos restos mortais por peritos de criminalística da PF em Brasília.
Na quarta-feira (16), o pescador Amarildo da Costa Oliveira, o “Pelado”, confessou os crimes e mostrou onde Bruno e Phillips foram mortos a tiro, depois mutilados, queimados e jogados numa vala. Ele teria agido junto com o irmão, Oseney da Costa de Oliveira, conhecido como “Dos Santos”. A Polícia prossegue com as investigações para descobrir se há mais pessoas envolvidas no duplo homicídio. Pereira e Phillips desapareceram no dia 5 de junho, quando retornavam de barco ao município de Atalaia do Norte, que fica próximo da entrada das terras indígenas do Vale do Javari.
Nesta quarta-feira à noite, o assessor jurídico da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Unijava), Eliésio Marubo, afirmou que um terceiro suspeito foi detido em conexão com as execuções. O delegado da Polícia Federal Eduardo Alexandre Fontes havia dito que, a qualquer momento, novas prisões poderiam acontecer. Mas a prisão do terceiro suspeito ainda não foi confirmada oficialmente.
Unijava diz que foi crime político e que caso não termina aqui
O líder indígena alertou que o caso não termina com a identificação de dois criminosos. Em nota, a Unijava disse que se trata de um crime político. E que já havia alertado sobre as ameaças e a iminência de um ataque em vários ofícios enviados ao Ministério Público Federal (MPF), à Polícia Federal (PF) e à Fundação Nacional do Índio (Funai). A Unijava teria indicado “a composição de uma quadrilha de pescadores e caçadores profissionais vinculados a narcotraficantes, que ingressam ilegalmente em nosso território para extrair nossos recursos e vende-los nos municípios vizinhos. Fornecemos informações através de nossas denúncias às autoridades competentes”. Os indígenas reclamam que providências não foram tomadas com a devida rapidez.
Dois meses antes de desaparecer, Bruno Pereira, segundo o jornal O Globo, denunciou uma organização criminosa que atua na pesca e caça ilegal no Vale do Javari. Ele entregou ao MPF um mapeamento da área, com indicação de local e fotos dos envolvidos na organização criminosa. Os promotores pediram a abertura de uma investigação. Em represália, Bruno e o líder Beto Marubo receberam um bilhete de ameaça de morte, como último aviso: "Sei que quem é contra nós é o Beto Índio e Bruno da Funai, quem manda os índios irem para área prender nossos motores e tomar nosso peixe. Só vou avisar dessa vez, que se continuar desse jeito, vai ser pior para vocês. Melhor se aprontarem. Tá avisado", diz trecho da carta deixada no escritório da Unijava em Tabatinga.
Segundo reportagens da Globo News e do Estadão, há indícios de que Amarildo Costa de Oliveira, o "Pelado", foi executor de um crime pensado e encomendado por um traficante de drogas peruano. A denúncias de ambos, sobre crimes ambientais na Amazônia, estaria prejudicando as ações de cartéis que atuam na região, com transporte de armas e drogas, pistolagem e lavagem de dinheiro.
Dom Phillips fotografou homens que o ameaçavam
Um dia antes do desaparecimento, indígenas testemunharam ter um grupo de homens armados fazendo ameaças a Bruno Pereira e Dom Phillips, levantando armas para o alto. O inglês teria tirado algumas fotografias do grupo. As buscas começaram em 5 de junho, depois de Bruno e Phillips desaparecerem no trajeto entre a comunidade ribeirinha São Rafael e a cidade de Atalaia do Norte. Eles tinham se deslocado para perto de uma base de vigilância da Funai para fazer entrevistas com nativos.
O caso teve repercussão internacional e mobilizou protestos por várias cidades da Europa e dos Estados Unidos, todos com o apelo “Onde estão Bruno Pereira e Dom Phillips?”. O primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, disse que estava profundamente preocupado com o desaparecimento do compatriota e ofereceu ajuda ao governo brasileiro, “no que o Brasil precisasse”.
Em entrevista, o presidente Bolsonaro lamentou que os dois tivessem se arriscado a andar sozinhos, sem escolta, numa região onde já eram ameaçados e mal vistos. Três dias depois do desaparecimento, a juíza Maria Pinto Fraxe, da 1ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Amazonas, a pedido da Unijava e da Defensoria Pública da União, determinou que o governo reforçasse as operações de buscas, com uso de helicópteros, embarcações e mais equipes.
Bolsonaro afirmou que determinou "busca incansável"
Na sexta-feira, 10 de junho, policiais federais encontraram “material orgânico aparentemente humano” no rio próximo ao porto de Atalaia do Norte, que seguiu para perícia criminalística. No mesmo dia, o presidente Bolsonaro, em discurso na Cúpula das Américas, em Los Angeles, afirmou que o governo fazia uma “busca incansável” pelos desaparecidos e que rogava a Deus para que fossem encontrados com vida.
No dia 13, Bolsonaro repetiu que os dois homens “foram imprudentes ao entrar numa área completamente inóspita sozinhos, sem segurança e aconteceu o problema”. “Esse inglês era mal visto na região, porque fazia muita matéria contra garimpeiros, questão ambiental. Então, naquela região lá, que é bastante isolada, muita gente não gostava dele”, disse Bolsonaro. “Ele tinha que ter mais que redobrada atenção para consigo próprio e resolveu fazer uma excursão. A gente não sabe se alguém viu e foi atrás dele, lá tem pirata no rio, lá tem tudo que possa imaginar”
Embaixada comete gafe e se desculpa
Uma trapalhada foi cometida pela Embaixada brasileira no Reino Unido, no dia 13. Autoridades informaram aos parentes de Dom Phillips que dois corpos haviam sido encontrados na floresta, mas a informação foi negada pela Polícia Federal. Depois, o próprio embaixador enviou mensagem ao jornal The Guardian, para onde Phillips trabalhava, se desculpando pelo equívoco.
Dom Phillips, de 57 anos, morava no Brasil há 15 anos, por último fazendo reportagens como freelancer para o jornal britânico The Guardian. Escrevia o livro “Como Salvar a Amazônia”. Fez carreira jornalística cobrindo o cenário musical e, em 2007, viajou ao Brasil pela primeira vez. Morou em São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia, colaborando para veículos como The New York Times, Washington Post e Financial Times. Era casado com Alessandra Sampaio, com quem teve três filhos.
O indigenista Bruno Pereira, 41, era servidor licenciado da Funai. Em outubro de 2019 foi exonerado do cargo de coordenador-geral de Índios Isolados de Pouco Contato, mas não se afastou da região e acabou contratado com consultor da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari. Segundo depoimento de amigos, Bruno enfrentava e denunciava os invasores. E já temia que pudesse ser morto. Sofria repetidas ameaças por deflagrar operações contra garimpeiros e pescadores que invadiam as terras indígenas. Deixa a mulher, a antropóloga Beatriz Matos, e dois filhos pequenos.
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