O presidente Jair Bolsonaro fez um apelo nesta terça-feira (7), nas redes sociais, para que os desentendimentos entre militares de seu governo e o escritor Olavo de Carvalho sejam "uma página virada". Disse que deve aos militares sua "formação e admiração", mas credita sua vitória na eleição presidencial de 2018 à influência de Olavo, considerado o guru do bolsonarismo.
Mais tarde, questionado pela imprensa sobre se iria pedir ao escritor para baixar o tom em relação às críticas aos militares, Bolsonaro disse que "Olavo é dono do seu nariz, assim como eu sou do meu e você é do seu". "Eu recebo críticas muito graves e não reclamo. O pessoal fala muito em engolir sapo e eu engulo sapo pela fosseta lacrimal", afirmou.
Apesar de todas as evidências em contrário, Bolsonaro refuta a ideia de que há uma divisão dentro do governo entre as alas militar e olavista. Em perguntas e respostas, entenda a relação entre Olavo e o clã Bolsonaro, os frequentes embates entre olavistas e militares, e como isso influencia nos rumos da gestão federal.
1) Qual a relação de Bolsonaro com Olavo?
Bolsonaro conheceu Olavo de Carvalho a partir de seus filhos, em especial o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ), que são admiradores do escritor. Em março, durante a viagem presidencial aos EUA, Bolsonaro, Eduardo e Olavo estiveram em um jantar na residência oficial do embaixador do Brasil em Washington. Ao deixar o jantar, durante o qual foi homenageado por Steve Bannon, ex-estrategista de Donald Trump , Olavo disse ter conversado apenas quatro vezes com o presidente brasileiro e afirmou que não sabia ao certo quais eram as ideias políticas dele.
No início do mês, Bolsonaro concedeu ao escritor o mais alto grau da Ordem de Rio Branco, condecoração dada pelo governo do Brasil para "distinguir serviços meritórios e virtudes cívicas, estimular a prática de ações e feitos dignos de honrosa menção."
2) Qual a influência de Olavo no governo Bolsonaro?
Apontado como guru de Bolsonaro, Olavo foi responsável pela indicação de dois ministros: Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e Ricardo Vélez Rodríguez, demitido do Ministério da Educação (MEC) no início de abril. Seu sucessor no ministério, o economista Abraham Weintraub, foi aluno do escritor. O assessor especial do presidente para assuntos internacionais, Filipe Martins, também é seguidor de Olavo.
Até o momento não está muito claro qual o tamanho da influência do escritor nas tomadas de decisão do governo. Contudo, Olavo é apontado como o pivô de diversas demissões no MEC, e Vélez foi demitido após ter sofrido diversas críticas do escritor.
3) Qual a origem dos conflitos entre Olavo e militares?
Olavo tem feito críticas públicas à atuação dos militares no governo Bolsonaro, inclusive o vice-presidente Hamilton Mourão, e já pediu a seus ex-alunos que deixem o governo. As críticas a Mourão tiveram início porque, na visão de Olavo, o vice tem contrariado publicamente, via imprensa, as posições da agenda que ajudaram a eleger Bolsonaro, como a oposição ao aborto e a transferência da embaixada do Brasil em Israel.
O escritor é um crítico da imprensa e defende que a gestão Bolsonaro não mantenha um bom relacionamento com jornalistas e empresas jornalísticas. Para Olavo, o presidente deve se comunicar diretamente com seus leitores via redes sociais e eventos públicos.
Além disso, a disputa entre olavistas e membros das Forças Armadas chegou a travar as atividades do MEC.
Em abril, um vídeo em que Olavo criticava os militares foi postado no canal oficial de Bolsonaro no YouTube, mas a publicação foi apagada. Um dia depois, Mourão disse que Olavo deveria se limitar à "função de astrólogo", e Bolsonaro afirmou que as críticas do escritor não contribuem com o governo.
4) Como os filhos do presidente ajudam a acirrar esse conflito?
Enquanto o presidente adotou tom mais ameno sobre o conflito entre Olavo e os militares, em especial por meio do porta-voz da Presidência, os filhos de Bolsonaro mantiveram tom crítico em relação a Mourão. Isso ficou mais visível nas redes sociais de Carlos Bolsonaro, um dos responsáveis por criar a estratégia de comunicação do pai na internet.
Nesta terça-feira (7), o deputado Eduardo Bolsonaro saiu em defesa de Olavo, mesmo após críticas dos militares às declarações recheadas de palavrões e ataques aos generais em publicações do escritor.
5) Como os embates atrapalham o dia a dia do governo?
Na visão de auxiliares do presidente, o governo acaba deixando para segundo plano discussões consideradas fundamentais como a reforma da Previdência e outros projetos que estão em debate para ter de dar explicações públicas sobre o conflito entre olavistas e outros setores que apoiam Bolsonaro.
Olavo já criticou lideranças do Poder Legislativo, como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o que impacta diretamente na pauta de votações da Casa. É nela que tem início a tramitação de todos os projetos que são encaminhados pelo Executivo ao Congresso.
As críticas de olavistas a Maia irritaram o deputado, que chegou a ameaçar deixar a articulação da reforma da Previdência, considerada fundamental pelo governo para o sucesso da pauta econômica.
6) Quais os capítulos mais recentes dessa crise?
No último fim de semana, Olavo xingou o ministro-chefe da Secretaria de Governo, general Santos Cruz, ao criticar um comentário do militar sobre redes sociais. Uma resposta veio do ex-comandante do Exército general Villas Bôas.
O general, que hoje é assessor especial do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), fez reprimendas a Olavo, a quem chamou de "Trótski de direita". A fala foi endossada por militares das Três Forças, que veem em Villas Bôas uma liderança do grupo.
Olavo, por sua vez, disse que os militares se escondem "por trás de um doente preso a uma cadeira de rodas" – o ex-comandante é vítima de doença degenerativa grave.
Nesta terça-feira (7), senadores de PSL, DEM e PSDB saíram em defesa do general Villas Bôas e criticaram o guru do bolsonarismo. Não foi a primeira vez. Parlamentares como os deputados Delegado Waldir (PSL-GO) e Alexandre Frota (PSL-SP), e o senador Major Olímpico (PSL-SP) já se queixaram publicamente das interferências de Olavo no governo.
7) Como Bolsonaro tem reagido ao embate e o que esperam os militares?
Jair Bolsonaro tem transmitido mensagens contraditórias sobre o que pensa acerca do embate entre Olavo e militares. Ao mesmo tempo em que adota tom apaziguador em entrevistas e em textos lidos pelo porta-voz da Presidência, mantém elogios públicos ao escritor por meio de postagens nas redes sociais, silenciando sobre integrantes das Forças Armadas.
Os militares demonstram insatisfação em relação à postura do presidente e veem na ambiguidade de suas manifestações públicas a ausência de defesa pública das Forças Armadas, das quais já foi membro como capitão do Exército.
Na manhã desta terça-feira (7), Bolsonaro elogiou o escritor, ressaltou que ele tornou-se rapidamente um “ícone” e fez questão de dizer que o admira. Na sequência, participou de almoço com a cúpula militar. Segundo relatos, generais presentes no almoço chegaram a questionar o presidente sobre os ataques. Um deles avaliou inclusive que eles não contribuem com o êxito do governo.
O presidente ouviu as críticas e, de acordo com assessores palacianos, minimizou o conflito. Ele tratou o episódio como superado e disse que é hora de virar a página.
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