Parlamentares da oposição estão apostando na estratégia de entrar em choque direto com o ministro da Justiça, Flávio Dino, em comissões no Congresso Nacional. O objetivo é gerar repercussão nas mídias sociais e criar pontos de rivalidade com o governo.
O ministro já atendeu a quatro convites feitos por deputados e senadores para falar de assuntos como: o decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que ampliou as restrições à posse e ao porte de armas de fogo, as tentativas do governo de restringir a liberdade de expressão nas redes sociais e os atos de vandalismo de 8 de janeiro.
Dino mostrou intransigência e deboche em todas as sessões e as conversas acabaram sempre em bate-boca, frases feitas, alfinetadas do governo e da oposição. A oposição conseguiu apenas avanços limitados em pautas da sua agenda, como uma pequena ampliação do prazo de recadastramento das armas de fogo compradas na gestão do presidente Jair Bolsonaro.
O deputado Delegado Paulo Bilynkyj (PL-SP), autor de um dos pedidos para que Dino compareça à Câmara, chegou a dizer que a esquerda tenta “moldar o debate”, na comissão de Segurança Pública da Casa. “Eles falam em democracia, mas querem enfiar goela abaixo, eles falam que são abertos ao debate, mas quando a gente critica eles dizem que nós estamos perdendo tempo, que nós não podemos criticar”, ressaltou o parlamentar.
Mas para o vice-líder do PSOL, deputado Pastor Henrique (PSOL-RJ), os convites e convocações para Dino ir ao Congresso são injustos. “A perseguição política ao ministro Flávio Dino está tornando a Comissão de Segurança Pública uma caricatura, ela não faz nenhum debate mais profundo sobre segurança. Tem um caráter quase passional, de ressentimento, com relação ao ministro”, afirmou o deputado.
Deputados aprovaram duas convocações para que Dino explique suas declarações
Na última terça-feira, a Comissão de Segurança Pública da Câmara aprovou duas convocações para Dino voltar à Câmara. Nesta semana, ele esteve no Senado. Pelas novas convocações, o ministro terá que explicar declarações na quais acusou praticantes de tiro que possuem licença de CAC (Caçador, Atirador e Colecionador) de vender armas para o crime organizado. .
O ministro da Justiça também vai ter que explicar de que forma as invasões de terras promovidas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) interferem na segurança urbana e rural. Esse requerimento foi apresentado pelo deputado Tenente Coronel Zucco (Republicanos-RS).
Por que a oposição aposta nos embates se o governo não cede e suas pautas não avançam?
O cientista político Cristiano Noronha, sócio e vice-presidente da Arko Advice, avalia que a estratégia da comissão, ao bater na tecla de convocação do ministro da Justiça gera engajamento. “O ministro Flávio Dino tem criado sempre algum tipo de atrito, seja provocando partidos de oposição ou vice-versa; então a base ligada ao ex-presidente Bolsonaro também faz isso, para criar pontos de rivalidade”.
Para Noronha, “quando fazem isso eles criam um certo engajamento, repercussão nas redes sociais. Essa investida acaba ajudando a fazer um contraponto com o governo, ou a oposição não tem com quem rivalizar”.
Esse comportamento, segundo Lucas Fernandes, coordenador de Análises Políticas da BMJ Consultores Associados, garante repercussão tanto para o governo quanto para a oposição. Ao mesmo tempo que parlamentares e ministros param suas agendas para participar de um debate, eles ganham notoriedade e influência. Caso do ministro da Justiça, Flávio Dino.
Lucas Fernandes lembra que o titular da Justiça é um dos nomes mais influentes do atual governo, e isso só faz com que ele desponte na cena política nacional.
Uma ação mais efetiva da oposição para avançar em suas pautas seria a criação de Projetos de Decreto Legislativo, que podem anular os decretos do presidente Lula. Um exemplo disso aconteceu no caso da derrota do petista na Câmara ao tentar acabar com Marco do Saneamento. Medida similar está sendo cogitada pela oposição para derrubar o decreto do desarmamento.
Parlamentares sobem o tom ao "convocar"ao invés de "convidar" ministro
A convocação de um ministro tem um peso político mais elevado do que o convite para que ele fale em uma comissão. A Constituição estabelece que a Câmara dos Deputados, o Senado Federal, ou qualquer comissão das duas Casas, podem convocar ministros de Estado ou titulares de órgãos diretamente subordinados à Presidência da República para prestarem, pessoalmente, informações sobre assunto previamente determinado.
A ausência sem a justificativa adequada é considerada crime de responsabilidade. Dino recebeu recentemente duas dessas convocações. Os argumentos apresentados pelos deputados governistas de que o ministro sempre teve boa vontade e aceitou os convites não sensibilizaram a maioria da comissão.
Sobre as inúmeras convocações feitas pela oposição a Dino, Fernandes, o analista da BNJ, diz que trata-se de um comportamento tradicional entre as oposições de qualquer governo. Mas no caso específico da Segurança Pública mostra que a oposição vai continuar buscando embates.
Sobre o debate em torno de convite ou convocação ao ministro, o cientista político esclarece que a convocação, por não poder ser recusada, tem mais poder no âmbito político. “Se for um convite, o ministro pode mandar um representante, e a repercussão não seria tão grande”.
O deputado Tenente Coronel Zucco (Republicanos-RS), que apresentou vários pedidos para Dino ser convocado, disse que essas são “convocações responsáveis”, e que têm como objetivo apenas “responder a vários questionamentos que ficaram sem resposta em outras oportunidades”. Para ele, as convocações do ministro não atrapalham o andamento da comissão, com a votação de outras pautas.
O presidente da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, deputado Sanderson (PL-RS) afirmou: “Esperamos que de parte a parte, parlamentares governistas e oposicionistas façam os questionamentos sempre buscando respostas de interesse público, e o ministro da Justiça, assim como o ministro do GSI, contribuam com a verdade e o esclarecimento sobre tudo possa ser levado à sociedade brasileira”.
Bate-boca entre Dino e oposição tende a continuar, diz analista
Cristiano Noronha, da Arko Advice, disse acreditar que a tendência é que esse tipo de embate perdure durante todo o governo, a menos que surjam fatos que mudem o foco das atenções. “Esse tipo de debate que envolve temas como armas, invasões de terras e manifestações é fruto da disputa política. A oposição ao governo deve manter questões polêmicas em evidência, isso mantém apoiadores ativos, ocupando espaço na mídia e nas redes sociais”.
O governo ficará responsável pela definição da data da ida do ministro Dino, à Comissão de Segurança Pública para prestar esclarecimentos à oposição. O presidente da comissão, deputado Sanderson, acredita que a reunião será realizada na semana de 22 a 26 de maio. Nesse período também deverá ser ouvido o ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, general Marcos Antônio Amaro dos Santos.
Amaro também foi convocado a prestar esclarecimentos sobre os vídeos em que o ex-ministro da pasta, Gonçalves Dias, aparece facilitando a entrada de manifestantes no dia 08 de janeiro nas sedes dos Três Poderes.
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