O anúncio do senador Alessandro Vieira (MDB-SE), nesta segunda-feira (16), de que vai protocolar pedido de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado para investigar irregularidades na condução dos inquéritos das fake news e das milícias digitais divide opiniões entre os apoiadores do impeachment do ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal (STF).
Enquanto alguns enxergam na CPI uma chance de agregar mais munição ao movimento pelo impeachment de Moraes, outros observam que Vieira tomou um gesto isolado capaz de tirar o foco prioritário na destituição imediata do magistrado e esvaziar a mobilização. Os líderes da oposição preferiram ainda não se pronunciar sobre a proposta, enquanto avaliam os prós e os contras dela para a estratégia principal.
Moraes é o relator desses inquéritos na Corte e é alvo de novo requerimento para ser destituído do cargo, apresentado no último dia 9 com o apoio explícito até agora de ao menos 29 senadores, segundo apuração da Gazeta do Povo. A oposição afirma ter 36 nomes favoráveis à abertura do processo contra Moraes, dos 81 senadores.
A CPI examinaria questões como falta de transparência, violações ao sistema acusatório e prorrogações indevidas em procedimentos investigativos conduzidos pelo ministro. Para analistas consultados pela Gazeta do Povo, os principais alvos da CPI proposta por Vieira coincidem com boa parte dos argumentos do pedido de impeachment, mas têm o aspecto de não personalizar a investigação, focando na revelação de eventual ilicitude na condução dos inquéritos, sem questionar o mérito das decisões judiciais.
Para outros observadores, Vieira, eleito em 2018 dentro de uma onda favorável a candidatos ligados à segurança pública, gastou capital político quando enfrentou o governo de Jair Bolsonaro (PL) durante a pandemia. Agora, o senador traz a proposta de uma CPI focada em Moraes, buscando se diferenciar de outros colegas que defendem o impeachment do ministro.
De toda forma, o maior obstáculo ao movimento para afastar Moraes está na figura do presidente, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que tem o poder exclusivo de pautar ou engavetar o impeachment. Nesse sentido, o maior engajamento da oposição tem sido por pressioná-lo com o placar de apoiadores declarados e indecisos em relação ao pedido de impeachment protocolado no último dia 9. Os senadores acreditam que 41 promessas de apoio já seria possível ao menos iniciar o processo.
O surgimento de um segundo placar sobre tema semelhante – o pedido de CPI – poderia ser visto como concorrente ou biombo para indecisos. Nesse caso, seria necessário colher 27 assinaturas de senadores para protocolar o pedido.
Uma mostra do esforço concentrado na abertura imediata do processo de impeachment é a campanha proposta pelo deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) contra os candidatos nas eleições municipais filiados ao PSD, partido de Pacheco e que reúne a maioria dos indefinidos sobre o impeachment, nas contas da oposição. A oposição também planeja um ato público contra a inação de Pacheco em Belo Horizonte.
Com seu enfoque nos inquéritos do STF, a expectativa de especialistas é que a comissão possa ajudar a trazer parte do majoritário grupo de indecisos para o lado dos apoiadores do impeachment. “O país não pode ficar paralisado por uma disputa de narrativas, onde uma aponta suposta trama golpista que justificaria atuação judicial de exceção e outra considera perseguição qualquer decisão judicial desfavorável”, ponderou Vieira.
A assessoria do senador informa que já contabiliza 17 assinaturas de apoio, entre as quais a de Carlos Portinho (PL-RJ).
CPI pode reforçar as evidências jurídicas para impeachment e dobrar resistências
Ao tentar abrir uma terceira via na discussão polarizada em torno da análise dos abusos cometidos por Moraes, o autor do requerimento da CPI poderá ajudar a oposição a dobrar resistências internas ao impeachment. “Só o acesso efetivo e pleno aos fatos trará luz a esta disputa estéril e permitirá que a sociedade avance”, afirma Vieira, o autor do pedido.
Para o cientista político Ismael Almeida, embora o pedido de CPI soe tardio, ele se alinha ao esforço dos defensores do impeachment de Moraes. Vieira, que foi um dos mais atuantes na tentativa de instalar em 2019 a CPI da Lava Toga, destinada a investigar crimes de ministros do STF, recoloca o debate em outro momento especialmente tenso envolvendo a Corte e o Senado.
“A iniciativa do senador vai além da disputa entre governo e oposição, o que confere caráter mais técnico. A decisão de agir também pode indicar que ele se sente respaldado para avançar. Outro ponto relevante é que a instalação da CPI pode fortalecer a base jurídica para eventual processo de impeachment, oferecendo mais evidências e argumentos”, disse.
Senador quer que CPI supere polarização em torno de Moraes e evidencie abusos
Vieira aponta em seu requerimento que, desde a criação do inquérito das fake News (2019) e das milícias digitais (2021), várias medidas inconstitucionais foram tomadas, como a exclusão de perfis em redes sociais. “Além disso, houve a concentração de funções no relator, assumindo competências exclusivas do Ministério Público”, sublinha.
Segundo o parlamentar, a prática de não divulgar o conteúdo dos inquéritos privou sociedade e investigados de direitos e enfraqueceu a segurança jurídica. “A credibilidade da Justiça e o respeito à separação de poderes estão ameaçados. A falta de mecanismo para fiscalizar o STF e o excessivo poder concentrado em um só ministro são anomalias a serem enfrentadas”, disse.
CPI pode manter tema de impeachment aquecido ou justificar seu esvaziamento
Luiz Felipe Freitas, consultor político do escritório Malta Advogados, avalia que a CPI cumpre o papel inicial de manter o tema do impeachment em evidência. Quanto à postura individual de Vieira, ele ressalta o histórico de independência do senador: durante a pandemia de Covid-1 Vieira se alinhou à oposição ao governo de Jair Bolsonaro (PL).
Freitas expressa, contudo, ceticismo sobre a viabilidade da comissão, a exemplo de obstáculos enfrentados por outras tentativas, como a CPI da Lava Toga. Ele teme até que senadores recuem no pedido de impeachment, considerando os efeitos da corrida eleitoral sobre seus posicionamentos. “O tempo dirá se a CPI foi sugerida no momento mais oportuno”, disse.
O autor do pedido de CPI planeja reunir informações para propor medidas legislativas que busquem corrigir as falhas apontadas e garantir o cumprimento dos princípios constitucionais no âmbito das investigações.
Em paralelo, há na Câmara um pedido com assinaturas suficientes para a abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito. Lá o objetivo é mais amplo. A CPI do Abuso de Autoridade, proposta pelo deputado Marcel Van Hattem (Novo-RS), quer apurar crimes de juízes de tribunais superiores como um todo.
Para analistas e políticos, a investigação na Câmara se justificaria mais do que a do Senado, uma vez que os deputados não estão envolvidos no julgamento de Moraes, atribuição exclusiva dos senadores. Com isso, o tema poderia ser explorado em paralelo nas duas Casas do Congresso sem disputas, com a Câmara servindo de caixa de ressonância da sociedade.
Por outro lado, uma CPI no Senado criaria um segundo palco para o tema na Casa, além de justificar a eventual tese de que ela deveria preceder ou retardar o pedido de impeachment.
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