A ministra do Planejamento, Simone Tebet, teria recebido pedido do presidente Lula para ajudar a Argentina em organismo multilateral. Ela nega.| Foto: Divulgação/Flickr Simone Tebet
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A notícia divulgada pelo jornal O Estado de São Paulo de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teria agido pessoalmente para viabilizar um empréstimo de US$ 1 bilhão da Corporação Andina de Fomento (CAF) à Argentina em agosto, a fim de facilitar a renegociação de sua dívida com o Fundo Monetário Internacional (FMI), provocou forte e imediata reação dos parlamentares da oposição.

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Após a negativa do governo de interferência na política do país vizinho, a oposição quer investigar o que de fato ocorreu. As eleições argentinas acontecem no próximo dia 22, e as pesquisas apontam uma possível vitória do candidato libertário Javier Milei, que se coloca também como um opositor de Lula.

O deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) protocolou nesta quarta-feira (4) um pedido de investigação no Ministério Público Federal para apurar se Lula usou dinheiro público brasileiro para financiamento indireto da campanha eleitoral argentina. Além dele, diversos parlamentares demonstraram indignação com os fatos denunciados na reportagem.

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"A ação de Lula é mais uma que usa o dinheiro do povo brasileiro e em especial do mais pobre, que paga impostos nesse país em maior proporção que os mais ricos para financiar projetos políticos de sua preferência na América. É uma interferência indevida no processo eleitoral da Argentina utilizando o dinheiro do povo brasileiro”, disse o deputado Marcel Van Hatten (Novo-RS)

De acordo com a reportagem do Estadão, a ministra do planejamento, Simone Tebet teria recebido um telefonema de Lula, solicitando o seu apoio ao pedido de empréstimo argentino, já que ela representa o Brasil na CAF, também chamado de Banco de Desenvolvimento da América Latina.

A assessoria de imprensa de Tebet negou que o telefonema tenha acontecido, mas seu ministério de fato votou a favor da Argentina no CAF. O Ministério do Planejamento disse que o voto favorável era uma operação normal.

Mas a reportagem do Estado de São Paulo diz ainda que Lula teria influenciado outros países-membros do banco a aprovar o financiamento. A Gazeta do Povo não conseguiu confirmar as informações com fontes independentes.

Ao todo são foram 19 votos favoráveis e dois contrários ao empréstimo. O dinheiro do empréstimo foi enviado ao Fundo Monetário Internacional para pagar a rolagem da dívida argentina, o que propiciou um novo aporte do fundo de US$ 7,5 bilhões. Depois, a Argentina quitou o empréstimo com o CAF.

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O senador Rogério Marinho protocolou um requerimento para que a ministra Tebet seja ouvida na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado. O texto do documento diz que a autodeterminação dos povos e a não-intervenção são princípios constitucionais que regem as relações internacionais do Brasil. "Assim sendo, a possibilidade de interferência no processo eleitoral de outro país é tema que merece explicação a essa comissão e a esse Parlamento", diz o requerimento.

A deputada Júlia Zanatta (PL-SC) informou que está articulando pedido similar com os membros da Comissão de Fiscalização e Controle (CFFC) da Câmara. Ela diz entender que já começam a surgir "vergonhosas evidências" sobre "o plano de intervenção de Lula na eleição da Argentina", para barrar o avanço de Milei.

O esforço para garantir empréstimo do banco multilateral à Argentina se junta às muitas ações públicas do petista motivadas por seu desejo de auxiliar o país vizinho e, indiretamente, beneficiar o candidato governista e ministro da Economia, Sergio Massa, na corrida presidencial.

Lula já fez solicitações de ajuda financeira para o governo argentino ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), ao Banco do Brics e até mesmo ao próprio FMI, em diferentes momentos e em âmbitos nacionais e internacionais.

Para o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), essas ações deixam claro que Lula está interferindo na eleição da Argentina para prejudicar Milei. “Democracia relativa a todo vapor”, provocou. "Este é o Foro de São Paulo, uma quadrilha internacional", acusou o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP).

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O Foro de São Paulo foi fundado pelo ditador cubano Fidel Castro (1926-2016) em parceria com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na década de 1990, logo após o colapso da União Soviética. O objetivo oficial da organização é integrar povos da América Latina e do Caribe, mas na prática funciona como uma confraria de governantes, políticos e organizações ativistas em nome de um projeto político de esquerda para o subcontinente.

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A presidente da CFFC, a deputada Bia Kicis (PL-DF), listou questionamentos em torno do gesto de Lula de se empenhar para socorrer financeiramente o governo amigo de um país vizinho. "É democrático o presidente do Brasil usar da força do seu país junto a um banco para interferir nas eleições da Argentina? Não é uma afronta à soberania e à autodeterminação dos povos? Ela também prometeu representar como parlamentar junto aos órgãos competentes para avaliar as condutas do chefe do Executivo.

No Senado, a notícia também gerou protestos e promessas de ações para buscar esclarecimentos. O senador Sérgio Moro (União Brasil-PR) expressou a sua preocupação de que Lula esteja tentando ajudar a Argentina a manter um grupo político que prejudicou severamente a economia e o tecido social do país vizinho. Moro afirmou que, mesmo que a Argentina obtenha algum alívio a curto prazo, isso não mudará a "gestão econômica desastrosa do populismo de esquerda".

Luiz Carlos Heinze (PP-RS), por sua vez, condenou as ações, afirmando que Lula não distingue limites entre o Estado e o partido. "O Brasil não suporta mais tais abusos dos petistas", disse ele, argumentando que essas atitudes fortalecem argumentos para um impeachment do presidente. "A esquerda brasileira está desesperada. O jogo está mudando na Argentina, logo muda aqui também", provocou o senador Flávio Bolsonaro na sua conta da rede social X (ex-Twitter).

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O próprio candidato de oposição favorito nas pesquisas de intenção de voto, Milei, reagiu a essas notícias, rotulando o presidente brasileiro como um "comunista nervoso" e acusando-o de atacar diretamente a sua candidatura. “A casta vermelha treme. A liberdade avança!”, escreveu ele na plataforma X.

Candidato Massa negociou com Haddad alternativas de socorro

De toda forma, além dos discursos de Lula a favor de um tratamento menos severo por parte do FMI em relação à Argentina e os seus apelos para que outros organismos multilaterais flexibilizem suas regras para fornecer assistência ao governo de Alberto Fernández, o próprio Massa se reuniu com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em 28 de agosto, para discutir maneiras de aliviar a escassez de divisas na segunda maior economia do Mercosul. Entre elas, se discutiu a possibilidade de usar a moeda chinesa nas transações comerciais bilaterais em vez do dólar.

A Argentina está enfrentando uma gravíssima recessão e uma inflação anual superior a 120%, o que se reflete no contexto social, político e, sobretudo, no cenário eleitoral. Enquanto Lula defende o fortalecimento do Mercosul, Milei promete retirar a Argentina do bloco. Esses desdobramentos geopolíticos têm implicações tanto para a política interna brasileira quanto para a estabilidade da região, algo que preocupa Lula profundamente.

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