A dívida de R$ 165,5 bilhões de Minas Gerais com o governo federal não foi gerada apenas pelo atual governador Romeu Zema (Novo-MG), que assumiu a gestão do estado em 2019 e que foi reeleito em primeiro turno no ano passado. Grande parte disso se refere a um passivo deixado pelos antecessores dele por conta de empréstimos adquiridos entre os anos de 2008 e 2013 e uma capitalização junto à União em 1990, segundo secretários.
Ao todo, estes empréstimos somaram US$ 6,1 bilhões, que foram sendo corrigidos ao longo dos anos com a variação cambial e juros cobrados.
Parte deste dinheiro se refere ainda a contratos assinados em 1990, quando o estado teve de tomar dinheiro para assumir as dívidas deixadas pela extinção ou privatização dos bancos estatais MinasCaixa, Bemge e Credireal, e que levaram a um refinanciamento com a União em 1998 – o débito deu um salto de R$ 18,6 bilhões para R$ 141 bilhões em 2023.
Este montante se tornou uma bola de neve que chegou à disputa política atual e isolou Romeu Zema da aliança firmada entre o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o atual presidente do Congresso, o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
O governo de Lula, através do ministro Fernando Haddad, da Fazenda, se aliou a Pacheco na proposta de encontrar uma solução para a crise financeira que enfraqueça Zema e fortaleça o senador para a disputa à sucessão do Palácio Tiradentes em 2026.
A estratégia também enfraqueceria Zema como uma nova força da direita junto – ou, apenas a pouca distância – de Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP). O governador do estado mais rico do Brasil, São Paulo, é apontado como o sucessor natural à Presidência da República em 2026 se for mantida a inelegibilidade de Jair Bolsonaro (PL).
Juros fizeram a dívida disparar
O governo de Zema justifica a dívida bilionária deixada pelos seus antecessores aos indicadores econômicos usados para formular o porcentual de juros utilizados. Haddad chegou a dizer que ele é responsável por R$ 60 bilhões do total devido.
Desde 1990, quando o estado teve de tomar dinheiro da União para sanear as contas dos bancos estatais, passaram pelo governo local políticos como Newton Cardoso (MDB), que fez a primeira transação, Hélio Garcia (PTB), o também emedebista Itamar Franco, os tucanos Aécio Neves e Antônio Anastasia (hoje no PSD, mesmo partido de Pacheco) e, até a eleição de Zema, o petista Fernando Pimentel.
Zema afirmou categoricamente durante as duas eleições em que foi eleito que o estado já estava quebrado quando foi deixado por Pimentel.
O Sindicato dos Servidores da Tributação, Fiscalização e Arrecadação do Estado (Sinfazfisco-MG) afirmou que o índice de correção usado no período dos empréstimos, o Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI), foi o fator determinante para se criar o “ovo da serpente”. Em 2017, o indicador foi substituído pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que é considerado pela União como a inflação oficial do país.
Levantamento feito pela Gazeta do Povo aponta que a a variação do IGP-DI entre 2008 e 2017 teve uma alta de 58,82% no período (veja aqui), já o IPCA desde então acumula 31,7%.
O governo mineiro disse que a evolução média da dívida após a mudança do indicador foi de 8% nos últimos cinco anos, com um crescimento de 36% no período. A variação para cima da inflação se refere a outros encargos embutidos, mas que ajudou a diminuir o passivo em R$ 9,5 bilhões.
O refinanciamento de 2022, das parcelas não pagas por liminares da Justiça, no valor de R$ 41 bilhões, também garantiu uma redução de mais R$ 6 bilhões nos encargos de inadimplência.
Pacheco passa na frente de Zema para solucionar dívida
Como a intenção é fortalecer Pacheco para a sucessão ao Palácio Tiradentes em 2026, ele apresentou a Haddad nesta semana uma proposta para solucionar a dívida mineira.
Pacheco anunciou a intenção de solicitar judicialmente a prorrogação da obrigação do estado mineiro em relação à dívida até 31 de março de 2024. Atualmente, Minas está desobrigado do pagamento até 20 de dezembro, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), permitindo a adesão ao regime de recuperação fiscal.
Pacheco e Haddad tem o apoio, ainda, do ministro Alexandre Silveira, de Minas e Energia (MME), que é mineiro, do mesmo partido do presidente do Congresso, e amigo de Lula.
No entanto, Pacheco critica esse regime, alegando que ele “não resolve o problema, apenas adia e aumenta o valor da dívida”.
“A União é credora, com trânsito em julgado, pode exigir o pagamento [da dívida], mas está colaborando com o estado para aguardar e ter um desfecho positivo nisso”, disse o senador.
Há a possibilidade de uma nova adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) e uma proposta alternativa que envolve a federalização de empresas estatais, como a Cemig, Codemig e Copasa, usando participações acionárias para quitar a dívida.
Enquanto o novo modelo é discutido, Zema indicou que continuará tratativas com a Assembleia Legislativa para aderir ao RRF e segurar as empresas estatais nas mãos do estado. O modelo da recuperação fiscal, no entanto, tem gerado insatisfação e levado outros governadores a pedirem revisões, buscando prolongamento do prazo e a alteração do indexador da dívida.
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