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Grupo Os Garantistas, formado por advogados de direita, querem se aproximar do Judiciário e ter atuação no Congresso. Na imagem, a estátua que é símbolo do Direito
Grupo Os Garantistas, formado por advogados de direita, querem se aproximar do Judiciário e ter atuação no Congresso. Na imagem, a estátua que é símbolo do Direito| Foto: Unsplash / Tingery Injury Law Firm

Advogados e juristas de direita estão formando um novo grupo, batizado de Os Garantistas, para fortalecer a atuação jurídica em defesa de pautas conservadoras no Congresso Nacional. Coordenado pela advogada Karina Kufa e com a participação de juristas de renome, o grupo busca influenciar o Legislativo e o Judiciário, além de capacitar advogados para uma atuação mais estruturada e eficaz.

Os Garantistas se articulam dez anos depois do surgimento do grupo de advogados da esquerda progressista Prerrogativas, que ajudou a acabar com a Operação Lava Jato e aproximaram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva do seu então oponente e hoje vice-presidente, Geraldo Alckmin. O Prerrogativas também ficou conhecido por mover ações e fazer propaganda contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e o senador Sergio Moro (União).

A coordenadora de Os Garantistas, Karina Kufa, é advogada do ex-presidente Jair Bolsonaro e também colunista da Gazeta do Povo. Ela afirma que o grupo que está ajudando a organizar será diferente do Prerrogativas. Suas atividades vão se restringir ao aspecto jurídico de suas pautas.

O novo grupo de advogados deve enfrentar desafios como a aceitação na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que tem proximidade com a esquerda, e a resistência de parte da mídia e do Judiciário. Para lidar com essas dificuldades, os fundadores do grupo buscam criar regras e procedimentos bem estruturados antes de se lançar oficialmente, o que deve ocorrer ainda no segundo semestre deste ano.

Os organizadores dizem que já contam com a adesão de aproximadamente dois mil advogados e juristas (o Prerrogativas diz ter cerca de 500). A formatação, a definição das regras e a divisão de subgrupos de acordo com os temas que deverão ser tratados no Os Garantistas ainda estão em andamento.

A advogada Karina Kufa destaca a importância de ganhar espaço nos Três Poderes. O grupo também tem a intenção de aumentar a participação em audiências públicas e em outros debates tanto no Parlamento quanto no Judiciário, sempre em busca do "possível".

Ela explica que o grupo também busca qualificar assessores e advogados do ponto de vista jurídico, para que essas pessoas possam auxiliar parlamentares a elaborar projetos melhores, por exemplo. A ideia dos advogados é atuar mais nos bastidores, dando suporte aos parlamentares em questões mais técnicas, segundo Karina Kufa.

A advogada cita como exemplo o projeto que recentemente ganhou os holofotes da política nacional por pretender equiparar a pena da realização de aborto após a 22ª semana ao crime de homicídio. De acordo com ela, se já houvesse um suporte mais atuante como se pretende fazer, talvez o texto tivesse sido elaborado de forma que enfrentasse menor resistência, e assim tivesse sido possível avançar na discussão.

O projeto de lei do deputado Sóstenes Cavalcante enfrentou criticas e sua tramitação foi interrompida porque em casos de estupro previa uma pena mais alta para a mulher estuprada que decidisse abortar em relação à pena que o estuprador receberia.

O autor já admitiu que fará mudanças no texto, que, de acordo com a promessa do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), deverá voltar a tramitar também neste segundo semestre, com a criação de um grupo ou comissão para debater a questão.

Esse episódio, na opinião de Karina Kufa, mostra que a articulação política, por si só, não é suficiente. Para ela, é essencial ter um respaldo jurídico para fortalecer os debates no Congresso. "Já presenciei votações em que deputados votam sem nem saber do que estão falando," comenta.

Outros temas, como a anistia ao ex-presidente Jair Bolsonaro e a cruzada do Supremo contra as supostas notícias falsas, devem ser trabalhados no Congresso, segundo Karina. Mas eles devem ser tratados com algum alinhamento com o Judiciário, para que não sejam considerados inconstitucionais "depois do árduo trabalho de aprovação das leis".

Os Garantistas vão tentar maior aproximação e diálogo com poder Judiciário

O grupo pretende atuar em questões legislativas, na articulação com o Judiciário e na qualificação de advogados para manter um engajamento contínuo. A busca de uma aproximação com o Judiciário teve início em 2022, quando alguns setores da direita tentaram maior diálogo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Mas a ideia é atuar sempre "dentro do possível", reforça Karina Kufa.

Ela diz que em algumas oportunidades será preciso deixar de lado o posicionamento adotado por conservadores no contexto político de polarização intensa. "Eu acho que, tendo um caminho mediador, as coisas ficariam mais facilitadas. Cada poder tem seu espaço e cada um tem que respeitar suas posições, não adianta ir para a rede social brigar e reclamar, tem que trabalhar de forma mais construtiva, de diálogo", pontua a advogada.

O grupo de advogados de direita deverá ainda dar suporte aos parlamentares em temas que não sejam apenas das chamadas pautas de costumes, como aborto e drogas, mas também em assuntos de perfil mais liberal e também avaliar a regulamentação da reforma tributária, ainda em andamento no Congresso Nacional.

Grupo não quer atuar como Prerrogativas, aliado de Lula

"Acho que a gente está num momento em que é imprescindível que tenha um grupo que possa se manifestar em prol dos interesses da direita, como fizeram na esquerda, na Lava Jato. O que a gente pretende é defender ideias, e não atacar pessoas nem instituições", destaca a advogada Kufa.

Onze dos 12 advogados que participaram, por exemplo, do julgamento no Supremo que derrubou a prisão após condenação em segunda instância eram do Prerrogativas. O entendimento que permitia a prisão era entendido pela Lava Jato como um dos mais fundamentais instrumentos para o combate à corrupção no país.

Outra integrante de Os Garantistas, a jurista Ângela Gandra, filha do também jurista Ives Gandra Martins, concorda que eles não devem agir como o grupo de advogados pró-Lula e é categórica ao afirmar: "não vamos ser o Prerrogativas. Nós não queremos mais o debate político-ideológico. Nós queremos defender o direito como instrumento da justiça e não a serviço de cada grupo", afirma.

Para ela, o grande objetivo é defender os valores conservadores dentro do ambiente jurídico. "Fazer de forma sistemática para formar, informar e performar, não de forma radical, mas dentro do pluralismo, dentro do diálogo", salienta.

Na opinião de Ângela Gandra, muitas pautas conservadoras hoje não avançam porque sofrem um debate muito ideologizado. "Às vezes a gente não atinge outras pessoas pelo modo, pela forma. Muitas vezes não existe uma composição entre a própria direita", completa a jurista.

Os Garantistas terão que enfrentar resistência da entidade de classe

O cientista político Antônio Flávio Testa também acredita que o grupo poderá embasar e qualificar o debate de pautas caras aos conservadores, mas alerta que Os Garantistas deverão esbarrar na entidade de classe dos advogados, a Ordem dos Advogados do Brasil. A OAB, recentemente, conseguiu suspender as atividades de outro grupo criado por advogados de direita, a Ordem dos Advogados Conservadores do Brasil (OACB).

A OACB teve as atividades suspensas pela 17ª Vara Federal do Distrito Federal após a OAB alegar que a organização conservadora estaria envolvida em atividades ilegais, como a oferta de serviços jurídicos por uma entidade não registrada na Ordem. A OAB também acusou a OACB de utilizar sigla e símbolos similares aos pertencentes à Ordem dos Advogados do Brasil.

A Ordem dos Advogados Conservadores do Brasil surgiu em 2019 e ficou nacionalmente conhecida em 2021, quando ameaçou processar quem publicasse injúrias e difamações contra o ex-presidente Jair Bolsonaro. O grupo de advogados também esteve na mira do Supremo Tribunal Federal (STF), por publicações nas redes.

Em resposta a uma representação do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB), Moraes disse que a entidade teria "empreendido verdadeiro tumulto contra a democracia brasileira por intermédio de seus perfis em redes sociais”, com postagens que supostamente estimularam acampamentos em frente a quartéis, contra juristas que “apoiam este governo” do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e ativismo do STF.

“As postagens colacionadas desbordam do simples exercício da livre manifestação do pensamento e representam verdadeira ameaça ao Estado Democrático de Direito”, escreveu o Conselho na justificativa que embasou a decisão de Moraes de suspender as garantias individuais de membros da entidade.

Mas as fundadoras do novo grupo de advogados conservadores estão otimistas e dizem que não vão se curvar às pressões. Ainda não há uma data oficial para o lançamento da nova organização, tampouco se sabe se o grupo vai se formalizar ou se atuará sem constituir uma organização oficial, como faz o Prerrogativas.

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