A China não quer a guerra comercial com os Estados Unidos, mas tampouco a teme. Na verdade, segundo Yang Wanming, embaixador da China no Brasil, a disputa não é direcionada a um país específico, mas sim a toda cadeia de valor global. "O objetivo (da Casa Branca) é usar o bullying e a máxima pressão para tirar o maior proveito", disse.
Há oito meses no país, Yang viu a relação entre China e Brasil se estreitar. Ele afirma, porém, que o comércio entre os dois países tende a sofrer no médio e longo prazos. "A guerra comercial provocada pelos EUA arruinou a confiança do mercado internacional e aumentou o risco de recessão global. Economias emergentes, como a brasileira, sofrerão consequências negativas."
Nessas circunstâncias, afirma, é ainda mais importante que China e Brasil defendam a cooperação internacional e o multilateralismo. Em outubro, o presidente Jair Bolsonaro visitará a China. No mês seguinte, é a vez de o presidente chinês, Xi Jinping, vir ao país, para a cúpula dos Brics. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Quem perde mais com a guerra comercial: China ou EUA?
Ninguém sai vitorioso de uma guerra comercial. Toda a comunidade internacional, inclusive China e EUA, é vítima. A China é o maior parceiro comercial dos EUA, e vice-versa, e essa parceria tem sido mutuamente benéfica. Produtos chineses reduziram o custo de vida das famílias americanas. Já a razão do déficit comercial dos EUA com a China está na estrutura econômica do país. A Casa Branca diz que o comércio com a China causou prejuízo aos EUA e decidiu, unilateralmente, impor tarifas adicionais às exportações chinesas. O objetivo é usar o bullying e a máxima pressão para tirar o maior proveito [para si]. Trata-se de uma violação grave das regras da OMC [Organização Mundial do Comércio], que prejudica o sistema multilateral do comércio e a ordem econômica mundial.
"A guerra comercial arruinou a confiança do mercado internacional e aumentou o risco de recessão global. Economias emergentes, como a brasileira, sofrerão consequências negativas"
A China pode intensificar a disputa para que o presidente Donald Trump não seja reeleito?
A China não quer uma guerra comercial, mas tampouco teme essa guerra comercial. Jamais cedemos em princípios essenciais. Em resposta à decisão de Washington, a China foi forçada a tomar contramedidas. Após a crise financeira de 2008, a China teve papel fundamental na manutenção da estabilidade financeira internacional e na promoção do crescimento econômico global. Atualmente, é a China que responde às pressões do protecionismo, defendendo o multilateralismo e o livre comércio. Diante dos atritos que se alastram há mais de um ano, a China acredita que divergências e conflitos entre os dois países só serão resolvidos com diálogo e negociação.
Mesmo se o presidente Donald Trump não for reeleito, a China voltará a confiar nos EUA?
A história e a realidade provaram repetidas vezes que a cooperação China-EUA é a única alternativa correta para os dois lados. A China sempre tem sido a favor de trabalhar com os EUA para construir relações pautadas na cooperação e na estabilidade. Mas isso exige que os dois lados busquem o mesmo objetivo. Os EUA devem perceber que só quando suas políticas externas e comerciais voltarem à trajetória correta e saudável é que serão preservados os interesses de longo prazo dos EUA e da comunidade internacional.
Há um propósito dos EUA para impedir a China de se tornar a maior economia do mundo?
Não queríamos comentar a intenção dos EUA de iniciar a guerra comercial. O fato é que o atual governo, desde o início, segue a política America First e adotou uma série de medidas unilaterais e protecionistas. Ao iniciar a guerra comercial contra a China, Washington usa as tarifas adicionais como ameaça para provocar atritos comerciais com seus principais parceiros, entre eles o Brasil. Essa guerra comercial não é direcionada a um país específico, mas sim à cadeia global de valor, à confiança dos investidores e às normas e ordem internacionais.
O que a China pretende fazer sobre a disputa em torno do 5G?
Por algum tempo, os EUA mobilizaram o aparato estatal para difamar uma empresa chinesa e sua tecnologia 5G, sem nenhum fundamento. Até tentaram impedir outros países, como o Brasil, a desenvolver parceria com a Huawei. Seu objetivo é usar essa tecnologia como ferramenta para inibir o desenvolvimento de outros países e preservar seus privilégios. Isso impede a partilha dos dividendos da quarta revolução industrial, representado pela tecnologia 5G, uma inovação que tem impacto no progresso da humanidade. A China está disposta a compartilhar conquistas científicas e tecnológicas, como o 5G, com o Brasil e outras partes, sobre base de benefícios mútuos e ganha-ganha.
Há alguma expectativa de quanto tempo esse conflito com os EUA pode durar?
Neste momento, a China e os EUA concordaram em realizar a 13.ª rodada de negociações comerciais, em outubro. As duas equipes devem se preparar com seriedade para tentar alcançar avanços. A precondição para pôr fim a essa guerra é Washington abandonar suas práticas equivocadas.
O Brasil pode se tornar um parceiro comercial mais importante para a China, uma vez que é uma alternativa para a segurança alimentar e energética chinesa?
No curto prazo aumentaram, de fato, as exportações brasileiras de soja para a China. No entanto, no longo prazo, o comércio China-Brasil será prejudicado com a guerra comercial. Primeiro, porque ela danificou o sistema multilateral de comércio, arruinou a confiança do mercado internacional, aumentou o risco de uma recessão mundial e economias emergentes como a brasileira sofrerão. Segundo, porque a guerra enfraqueceu as cadeias de produção, suprimento e valor, trazendo incerteza à parceria sino-brasileira no médio e longo prazos. Nossos dois países são promotores e defensores do sistema multilateral de comércio e da economia mundial aberta. Na conjuntura atual, é ainda mais importante que China e Brasil defendam juntos a ordem do comércio internacional baseada na cooperação e protejam o multilateralismo.
"A administração Bolsonaro, desde o início, tem mantido boa interação com o lado chinês"
O fato de o presidente Bolsonaro ser declaradamente anticomunista e admirador dos EUA, tendo indicado inclusive seu filho para a embaixada do Brasil no país, preocupa a China?
A China sempre respeita a escolha da política externa do Brasil ou de qualquer outro país. Mas o fato é que a administração Bolsonaro, desde o início, tem mantido boa interação com o lado chinês. Em poucos meses de governo, o vice-presidente, Hamilton Mourão, fez uma visita bem-sucedida à China e reuniu-se com o presidente Xi Jinping. A visita iniciou o intercâmbio de alto nível e traçou planos para a cooperação pragmática bilateral em vários campos. As visitas de alto nível são tão frequentes que criaram um recorde no relacionamento bilateral. O presidente Bolsonaro fará visita de Estado à China em outubro e o presidente Xi Jinping virá aqui em novembro para a 11.ª Cúpula dos Brics. Esses contatos colocarão a parceria estratégica China-Brasil em novo patamar.
O que a China espera da visita do presidente Bolsonaro ao país?
Atualmente, as duas equipes estão intensificando os preparativos para garantir resultados frutíferos dessa viagem. Duas maiores nações em desenvolvimento nos hemisférios Oriental e Ocidental, China e Brasil, têm grande potencial e amplo espaço de cooperação.
O senhor acredita pessoalmente que Trump será reeleito?
É um assunto interno dos EUA e a decisão cabe ao povo americano. Mas, independentemente de quem seja o presidente, se ele conseguir promover uma relação entre EUA e outros países baseada no respeito mútuo, tratamento igual e benéfico a todos os lados, a relação vai ser saudável. Se os EUA continuarem com a mentalidade de hegemonia e o bullying com outros países, com medidas unilaterais para o próprio proveito, não só as relações entre os EUA e outros países vão ser prejudicadas, mas também a economia e o comércio mundial. Os EUA são o maior país do mundo e o mais potente. Eles devem tomar medidas externas mais responsáveis e saudáveis.
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