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Congresso fica esvaziado na semana de São João
Deputados e senadores não apresentaram novas emendas para Segurança Pública no Amapá em 2023| Foto: Zeca Ribeiro / Câmara dos Deputados

Considerado o estado mais violento do Brasil pelo Anuário de Segurança Pública, o Amapá não teve emendas parlamentares apresentadas para a área de Segurança Pública em 2023. Apesar de contar com oito deputados federais e três senadores, a unidade federativa não registrou no ano passado emendas individuais ou de bancada destinadas para compor o orçamento da segurança.

Os dados foram apurados no Portal Transparência e na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LOA) de 2023. Para que uma emenda seja enviada para determinada área, ela recebe uma classificação específica que orienta a destinação dos recursos. É importante ressaltar que o parlamentar é responsável pela apresentação da emenda, já o empenho, ou seja, a reserva do dinheiro, fica a cargo do governo federal. O pagamento é a última etapa do processo, quando o valor destinado pela emenda é efetivamente depositado na conta do favorecido.

Apesar disso, o Amapá chegou a receber R$ 5,48 milhões em emendas para a segurança pública em 2023, mas esse montante é fruto de emendas liberadas em outros anos e cujo pagamento vinha sendo postergado. Somadas todas as emendas (individuais, de bancada estadual e de comissões) e considerando todas as áreas de destinação, o estado recebeu R$ 568 milhões em 2023 provenientes de emendas parlamentares.

Para 2024, apenas a deputada federal Silvia Waiãpi (PL-AP) destinou emendas para segurança pública. Dos R$ 2,7 milhões autorizados, apenas R$ 348 mil foram empenhados pelo governo até agora.

Amapá tem quase 70 mortes por 100 mil habitantes

Publicado na semana passada, o documento produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FSP), com base em dados de 2023, mostrou que o Amapá possui quase 70 mortes por 100 mil habitantes, indicando um salto de quase 40% em relação ao ano anterior. A média nacional é de 22,8 mortes por 100 mil habitantes. A cidade de Santana, na região metropolitana de Macapá, foi considerada a mais violenta do país, com quase 93 mortes por 100 mil habitantes.

Os dados abrangem as mortes violentas intencionais: homicídio doloso, latrocínio, lesão corporal seguida de morte, mortes de policiais e mortes decorrentes de intervenção policial.

Mas qual a participação das emendas nesse contexto? Apesar de o governo do estado ser o responsável pela política de Segurança Pública, as emendas parlamentares podem contribuir para o desenvolvimento de ações para a área, como verba para o reforço no policiamento e compra de equipamentos de segurança.

Nesse contexto, os parlamentares podem destinar emendas de duas formas: por meio das emendas de bancada estadual e das emendas individuais. Na primeira opção, os congressistas deixam as diferenças políticas de lado e fecham acordo sobre um valor a ser destinado em conjunto para o estado que os elegeu. Por exemplo, em 2023, a bancada do Rio de Janeiro destinou aproximadamente R$ 16 milhões somente para a Segurança Pública.

No caso do Amapá, o mesmo não foi feito. De acordo com a plataforma Siga Brasil, mantida pelo Senado, a emenda de bancada para a segurança pública, listada em 2023, foi apresentada em 2019. O valor orçado foi de R$ 151 mil, mas não chegou a ser empenhado pelo governo federal. Como não há prazo para o pagamento, emendas de outros anos acabam sendo reapresentadas pelos parlamentares para avaliação do Executivo.

Por outro lado, a bancada do Amapá destinou recursos para as áreas da Saúde (R$ 84 milhões), Defesa Nacional (R$ 59 milhões), Educação (R$ 40 milhões), Assistência Social (R$ 30 milhões), Agricultura (R$ 20 milhões) e outros setores (R$ 32 milhões). Ao todo, foram enviados quase R$ 270 milhões em emendas de bancada.

Nas emendas individuais, cada parlamentar indica o valor e o local para onde a emenda será destinada, o que também não foi feito pelos deputados e senadores do estado nortista com relação à area de segurança pública.

Ao comentar a situação, o analista político Luan Sperandio, diretor do Ranking dos Políticos, destacou que a falta de um representante da segurança pública entre os parlamentares amapaenses pode explicar a ausência de emendas para o Amapá.

Na composição da Comissão de Segurança Pública da Câmara, o estado conta com apenas um representante no colegiado: Silvia Waiãpi (PL-AP), que ocupa a vaga de suplente na comissão. A parlamentar foi a única que apresentou emendas para a área de segurança em 2024.

“Não há entre eles um representante cuja principal plataforma seja a segurança pública, o que pode explicar a ausência de emendas destinadas especificamente para essa área. Poderiam ser feitas emendas para contribuir no trabalho de inteligência e investigação de crimes, material para policiamento ostensivo, programas de articulação de política pública sobre drogas e no enfrentamento ao feminicídio.”, disse Sperandio.

Quem são os parlamentares do Amapá

Deputados:

  • Acácio Favacho (MDB-AP)
  • Augusto Puppio (MDB-AP)
  • Dorinaldo Malafaia (PDT-AP)
  • Josenildo (PDT-AP)
  • Professora Goreth (PDT-AP)
  • Silvia Waiãpi (PL-AP)
  • Sonize Barbosa (PL-AP)
  • Vinicius Gurgel (PL-AP)

Senadores:

  • Davi Alcolumbre (União-AP)
  • Randolfe Rodrigues (PT-AP)
  • Lucas Barreto (PSD-AP)

A reportagem procurou os senadores para esclarecer a falta de destinação de emendas para a segurança pública em 2023, mas não recebeu retorno até a publicação da matéria. O espaço segue aberto para posicionamentos futuros.

Emendas priorizam aumento do capital político e retorno eleitoral

A discrepância orçamentária na destinação de emendas parlamentares é vista por analistas políticos como estratégica. Deputados e senadores irão priorizar áreas que possuam forte apelo eleitoral, como Saúde e Educação. Por outro lado, a questão da segurança é vista como ponto em que o peso pelas decisões de política pública ficará a cargo do governador.

Segundo a Constituição Federal, cabe ao Senado representar os estados e resolver demandas regionais a nível Legislativo. Nesse contexto, o cientista político Elton Gomes, professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI), avalia que investimentos nas áreas acima possibilitam aos senadores maior influência sobre suas bases eleitorais.

“Saúde e Educação são os maiores orçamentos da República. É natural que haja a concentração de emendas nesses setores porque dão aos senadores maior poder de influência para seus clientes políticos nos estados. Eles sempre vão procurar fazer parte de acordos que envolvam a expressiva quantidade de recursos, nesse caso, recursos do orçamento da União”, disse Gomes.

Indagado sobre o impacto do levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública para os senadores do Amapá, em destaque para Alcolumbre, favorito para presidir o Senado em 2025, o cientista político Adriano Cerqueira, do Ibmec de Belo Horizonte, ressalta que, nessas situações, a capacidade de articulação dos congressistas acaba suprimindo os desgastes políticos que poderiam ocorrer.

“Deveria ser um problema interno, deveria ser um problema para ele, tentando se reeleger, mas sabemos que os mecanismos de dominação regional desses políticos são muito grandes. Os recursos que eles manejam no Senado Federal e também o acesso privilegiado a ministérios acabam superando qualquer divergência que se tenha para esses políticos”, disse Cerqueira.

Guerra de facções é responsável por aumento da violência no Amapá

Desde 2023, o Amapá vem registrando forte movimentação de facções criminosas em torno de disputas por pontos de drogas no estado. Além das organizações locais, grupos do Rio de Janeiro e São Paulo também atuam na região pelo controle do comércio. O foco estaria na capital do estado, Macapá. O coronel Márcio Dias, da Polícia Militar de Minas Gerais, explica que a capital se tornou estratégica para o crime.

“As organizações criminosas competem ferozmente pelos portos estratégicos de Santana e Macapá, que são pontos de escoamento de drogas para a Europa e outros continentes. Esses portos são fundamentais para o tráfico internacional de drogas, servindo como pontos de saída para grandes carregamentos de cocaína e outras substâncias ilícitas”, disse o policial militar.

Para o pesquisador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e da Universidade do Estado do Pará (UEPA), Aiala Couto, a escalada da violência no estado também ocorre pelo crescimento das facções locais, oriundas de gangues. Além disso, ele destaca outros elementos que contribuem para a situação.

“O Amapá é um estado estratégico para o crime organizado. O tráfico de drogas, o contrabando de madeira, o contato com a Guiana Francesa e o Suriname e a expansão do garimpo ilegal são atividades criminosas que vêm se constituindo nessa região há bastante tempo”, disse o pesquisador.

A reportagem procurou o governo do estado para tratar do assunto, mas até o fechamento desta matéria não recebeu retorno. Em nota enviada ao g1 do Amapá, na última quinta-feira, o secretário adjunto de Justiça e Segurança Pública do Amapá, Marko Scaliso, argumentou que o conflito entre facções já existia em 2023.

"Em janeiro foi que teve o boom da guerra entre duas facções aqui locais, em janeiro foram 40 mortes, fevereiro do ano passado, 42 mortes só em um mês, assim, índice muito alto, então a gente já entrou na gestão com essa guerra instaurada", explicou o secretário.

Ele também afirmou que foram realizadas ações em locais estratégicos da cidade para amenizar os índices de violência.

"Melhoramos nosso efetivo policial, em Santana nós triplicamos nosso efetivo, mesma coisa aqui em Macapá e com isso, colocando policiamento na rua, estabelecendo protocolo dentro da cadeia onde saem as ordens para que esses crimes seriam realizados, conseguimos reduzir", disse Scaliso.

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