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Queda de braço

Como Paulo Guedes venceu, por enquanto, a disputa na Esplanada entre gastar ou economizar

Bolsonaro e Paulo Guedes
Bolsonaro e Paulo Guedes. (Foto: Marcos Correa/PR)

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O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) convocou reunião no Palácio da Alvorada, na noite da quarta-feira (12), para indicar um pacto em respeito do teto de gastos. "Nós respeitamos o teto dos gastos, queremos a responsabilidade fiscal, e o Brasil tem como realmente ser um daqueles países que melhor reagirá à questão da crise", disse. A declaração pública foi um sinal de fortalecimento do ministro da Economia, Paulo Guedes, alvo de críticas dentro do próprio governo por defender a contenção de gastos.

Minutos depois do pronunciamento do presidente, um dos seus filhos, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), publicou em suas redes sociais: "Sob o comando do Ministro Paulo Guedes, teremos uma nova visão econômica no Brasil, com responsabilidade, privatizações e liberalismo, seguindo a demanda do povo nas urnas".

As manifestações de Bolsonaro e de seu filho mostram que o ministro da Economia se fortaleceu e reverteu o placar desfavorável de uma batalha que trava na Esplanada. Guedes havia sido impactado com os pedidos de exoneração de dois de seus principais auxiliares: Paulo Uebel, secretário de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, e Salim Mattar, secretário de de Desestatização e Privatização.

Ambos pediram para deixar o Ministério por não conseguirem avançar em seus campos de atuação. A diminuição do Estado foi uma das principais bandeiras de campanha de Bolsonaro no campo econômico e é defendida por Guedes como essencial para a retomada do crescimento do país. No entanto, o programa de privatizações prometido pelo ministro ainda não saiu do papel. Na terça-feira (11), dia em que a demissão de Mattar e Uebel foi anunciada, Guedes disse que estava se consolidando uma "debandada" no ministério.

A principal disputa que Guedes trava na Esplanada remete não exatamente às privatizações, mas à política de diminuição da intervenção do Estado na economia. Ele é contra programas de expansão de gastos públicos. Já outros ministros de Bolsonaro, como Tarcísio Gomes de Freitas (Infraestrutura), Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional) e Braga Netto (Casa Civil) pregam mais investimentos, como caminho para a criação de estrutura, a geração de empregos e a movimentação da economia. O grupo chegou a esboçar um programa com este perfil, o Pró-Brasil. O choque de visões tem levado a conflitos que se tornaram públicos em algumas ocasiões – e, até a quarta-feira (12), estavam desfavoráveis para Paulo Guedes.

Pacto político prestigia Paulo Guedes

A "recuperação" de Paulo Guedes se iniciou ainda na manhã da quarta, quando Bolsonaro publicou em suas redes sociais uma postagem em que defendia as privatizações e a desburocratização.

"Os desafios burocráticos do Estado brasileiro são enormes e o tempo corre ao lado dos sindicatos e do corporativismo e partidos de esquerda. O Estado está inchado e deve se desfazer de suas empresas deficitárias, bem como daquelas que podem ser melhor administradas pela iniciativa privada", escreveu Bolsonaro.

Em outro trecho do texto, o presidente minimizou os impactos da saída de Uebel e Mattar: "Em todo o governo, pelo elevado nível de competência de seus quadros, é normal a saída de alguns para algo que melhor atenda suas justas ambições pessoais. Todos os que nos deixam, voluntariamente, vão para uma outra atividade muito melhor".

Outro gesto simbólico foi Bolsonaro ter declarado publicamente ser a favor do teto de gastos ao lado dos presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) – além de outras lideranças do Congresso. Com isso, ele sinalizou que Guedes terá o respaldo do Legislativo.

O presidente também indicou um reforço à agenda liberal. Isso porque o presidente da Câmara é um defensor dessa política. Maia apoiou a implantação do teto de gastos, durante o governo de Michel Temer (MDB), e foi o principal articulador para a aprovação da reforma da Previdência, em 2019.

Em seus pronunciamentos, Maia e Alcolumbre disseram que Câmara e Senado "não faltarão" ao governo na aprovação de medidas econômicas. Mas ambos cobraram, indiretamente, que o governo efetive o envio de projetos. Maia falou que a Câmara votará a reforma administrativa, que representaria corte de gastos com o funcionalismo, "assim que o presidente entender importante". Já Alcolumbre declarou que a reunião serviu para "nivelar as informações" entre os chefes de poder.

A reunião contou com a presença do deputado Vitor Hugo (PSL-GO), que deixará o posto de líder do governo na Câmara, que ocupa desde o início da gestão Bolsonaro. Ele será substituído por Ricardo Barros (PP-PR). A escolha do novo líder é também um movimento de Bolsonaro em direção ao Centrão, grupo numeroso de deputados e que influencia nas votações da Câmara.

Guedes ainda é um "superministro"?

Durante a campanha eleitoral de 2018 e nos primeiros meses do mandato de Bolsonaro, o governo tinha como referência dois "superministros": Sergio Moro, na Justiça e Segurança Pública, e Paulo Guedes, na Economia.

Moro deixou o governo em abril, trocando acusações com o presidente, e desde então se tornou inimigo do bolsonarismo. Guedes, ao comentar sobre as demissões de Uebel e Mattar, falou que os setores do governo mais inclinados a gastos poderiam aproximar Bolsonaro de um impeachment. A declaração abalou defensores do presidente.

Mas o que se deu após a confirmação da saída dos ex-secretários foram gestos para contornar a crise. Diferentemente de outros que deixaram o governo – como Moro e o também ex-ministro Santos Cruz (Secretaria de Governo) – Mattar agiu de forma a não responsabilizar Guedes e nem Bolsonaro por sua decisão. Em entrevistas a diferentes veículos de imprensa, o ex-secretário atribuiu sua saída à insatisfação com o sistema político, com derrotas sofridas pelo governo no Congresso e com a rígida estrutura estatal.

Outro ato para arrefecimento de crise foi a negativa da possibilidade de queda de outras duas peças-chave do Ministério da Economia: Waldery Rodrigues, secretário de Fazenda, e Carlos da Costa, secretário de Produtividade. Rumores sobre a demissão de ambos circularam na manhã da quarta e acabaram desmentidos posteriormente pelo ministério.

"Dinheirinho" e eleição: o pano de fundo da disputa na Esplanada

O fortalecimento de Guedes não deve levar à extinção do Pró-Brasil, programa para acelerar obras federais. Ministros que apoiam o projeto esperam fazer o lançamento oficial da iniciativa nos próximos dias, após Braga Netto se recuperar da Covid-19. Segundo reportagem da Folha de S. Paulo, o montante investido no Pró-Brasil deve ficar na casa dos R$ 4 bilhões – quantia bem inferior do que os R$ 35 bilhões desejados pelos idealizadores da proposta.

Outro filho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), disse em entrevista recente ao jornal O Globo que esperava que o ministério da Economia arrumasse "um dinheirinho" para a realização das obras.

Embora Bolsonaro tenha fortalecido Guedes com as últimas movimentações, a realização de obras de grande escala se conecta com a busca pela reeleição, que começa a aparecer no cenário de preocupações do presidente.

Bolsonaro vive atualmente um momento de "troca de popularidade": ele tem perdido apoio em segmentos que o sustentavam, como a população mais rica, mas tem recebido mais suporte no Nordeste, a única região do Brasil que votou contra ele em 2018. A realização de obras de relevo se encaixa na busca pela consolidação dessa popularidade, assim como o auxílio emergencial, que pode se prorrogar até o fim do ano.

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