O empresário Paulo Marinho foi peça-chave na vitória de Jair Bolsonaro (PSL) nas eleições presidenciais. A casa dele, no Rio de Janeiro, foi uma espécie de quartel-general improvisado da campanha, que recebeu gravações do programa eleitoral do hoje presidente e sediou até mesmo a primeira reunião da equipe ministerial após a vitória nas urnas. A materialização da aproximação entre Marinho e os Bolsonaro foi a indicação do empresário como primeiro suplente de Flávio, o filho do presidente eleito para o Senado.
O vínculo, entretanto, não foi muito além do período eleitoral. Marinho relata que desde outubro teve poucos contatos com o presidente e com o núcleo mais próximo de Bolsonaro. E mais do que um distanciamento natural, Marinho deu um passo na mão oposta a Bolsonaro: aliou-se a um potencial rival do presidente na eleição de 2022, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB). Marinho se tornou o presidente do PSDB do estado do Rio de Janeiro e fala abertamente que trabalhará para que Doria seja o próximo eleito para o Palácio do Planalto.
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O empresário, em diversas entrevistas, alega que sua ligação com Doria não representa uma traição a Bolsonaro. Primeiro porque ambos são amigos há décadas, e Marinho alega que teve em Doria seu nome ideal para concorrer à presidência em 2018 – o apoio a Bolsonaro, na ocasião, teria sido uma espécie de "voto útil", a melhor alternativa para derrotar o PT. E o segundo motivo é que Marinho tem em mente uma promessa de Bolsonaro, a de que o hoje presidente não concorrerá à reeleição.
Chefiar o PSDB do Rio é o primeiro desafio que Marinho terá em sua missão de pavimentar o caminho de Doria ao comando do país. Uma tarefa que parece mais complexa do que a que desempenhou a favor de Bolsonaro em 2018, pelo fato de o PSDB ser ruim de voto no Rio e, mesmo assim, reunir alguns caciques locais de expressão considerável.
Um homem de amizades influentes
Marinho nunca disputou uma eleição como cabeça de chapa e sequer ocupou qualquer cargo público. No entanto, sempre esteve próximo da política.
Seu rol de amizades é grande. A lista inclui políticos como o ex-governador do Rio, Moreira Franco, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux, responsável pelo seu casamento, e até mesmo o ex-ministro José Dirceu, figura histórica do PT que hoje Marinho trata como maior rival na política.
Outra amigo importante de Marinho é o ex-ministro Gustavo Bebianno, que comandou a Secretaria-Geral da Presidência no início do governo Bolsonaro. Marinho e Bebianno são próximos há décadas e foi o vínculo entre ambos que levou o empresário à campanha de Bolsonaro. Marinho relata que se juntou à equipe de Bolsonaro quando o grupo em torno do hoje presidente "cabia numa kombi" e a candidatura era "tratada como piada".
A trajetória empresarial de Paulo Marinho inclui uma carreira de sucesso no mercado financeiro e a participação em bancos e também no Jornal do Brasil. Curiosamente, apesar de reconhecido como empresário de sucesso, Marinho é um dos raros suplentes de senador que declarou à Justiça Eleitoral patrimônio menor do que o do cabeça de chapa. Os bens de Marinho equivaliam a R$ 752.716,49, de acordo com o que informou na época da eleição. Já Flávio Bolsonaro relatou ser proprietário de posses que correspondiam a R$ 1.741.758,15.
Perto, mas longe o suficiente
O fato de não ter tido mais proximidade com Bolsonaro após a eleição não parece ser um problema para Marinho. Ao contrário – o empresário utiliza a situação como um benefício, por não precisar se vincular a questões mais controversas que envolvem o governo.
Por exemplo, o filósofo Olavo de Carvalho. Marinho disse em diferentes entrevistas que o "guru" da família Bolsonaro não teve qualquer peso no período eleitoral. Olavo, atualmente, causa divisões até mesmo dentro do grupo de apoiadores mais ferrenhos do presidente – para muitos bolsonaristas, o filósofo tem prejudicado o trabalho do governo ao criticar os militares, em especial o vice-presidente Hamilton Mourão. Marinho também se esquiva de proximidade com Carlos Bolsonaro, o filho "02" do presidente, tido como outra fonte de controvérsias.
A postura de Marinho se reflete até mesmo na linguagem que utiliza quando fala do governo. Bolsonaro é sempre citado como "capitão", um título solene. Já os militantes aguerridos do bolsonarismo são chamados por Marinho de "bolsominions", expressão comumente vista na boca de oposicionistas.
O neotucano
Marinho foi aclamado como presidente do PSDB do Rio de Janeiro, em junho. Embora faça questão de ressaltar sua amizade com João Doria, diz que o atual presidente nacional dos tucanos, o ex-deputado Bruno Araújo, foi também determinante para que chegasse à função.
O empresário tem encampado no Rio de Janeiro o mote do "novo PSDB", lançado nacionalmente por Doria. Ele é tratado pelo PSDB como um "sopro de vida" para o partido no Rio. A legenda é historicamente fraca no estado. Nunca elegeu um prefeito da capital e a única vitória para o governo do estado veio no cada vez mais distante ano de 1994. Em 2018, o tombo foi ainda maior: os tucanos elegeram apenas dois deputados estaduais e não conseguiram nenhuma vaga na Câmara. A candidata do partido ao Senado, Aspásia Camargo, recebeu menos de 2% dos votos válidos.
"Paulo é dinâmico, empreendedor. É um bom líder e está conduzindo reuniões propositivas em torno do partido. A chegada dele oxigena o PSDB e alinha o diretório do Rio com as diretrizes do Bruno Araújo e do João Doria", disse Bruno Lessa, vereador em Niterói e membro da executiva do PSDB do Rio.
Para Lessa, o fato de Marinho ter obtido um forte vínculo com Bolsonaro na eleição de 2018 não o desautoriza a comandar o PSDB local. "Ele teve uma opção eleitoral que muitos tiveram, a de derrotar o PT. Aliás, o PSDB perdeu muitos eleitores justamente por não conseguir se aproximar desse sentimento", destacou.
A euforia de Lessa e de outros tucanos em torno de Marinho, entretanto, não é unanimidade. A chegada do empresário para o comando do PSDB-RJ é contestada por um dos principais expoentes do partido no estado, o deputado estadual Luiz Paulo Corrêa da Rocha. Num texto publicado em seu site, o parlamentar chamou as modificações no PSDB local de "golpe partidário".
"Parece que é o desejo no Rio de Janeiro de se colocar o ovo do PSL no ninho tucano para nascer um filhote do PSL. E é exatamente isso o que nós não queremos, com todo o respeito ao PSL. Porque o PSL é outra instituição. Nós não queremos esse ovo chocado no ninho tucano, como fosse o tucano aí parecido com o tico-tico. Estamos, portanto, na resistência a esse projeto de força, a esse projeto virulento que está tisnando a trajetória do PSDB", escreveu Luiz Paulo.
Marinho disse, em entrevista recente à jornalista Andreia Sadi, da Globo News, que o PSDB "vai eleger o novo prefeito do Rio de Janeiro". O empresário nega a intenção de se candidatar e diz que o nome tucano para o cargo será conhecido "no tempo certo". Caso realmente o PSDB confirme uma candidatura, terá entre os adversários um antigo colega de Marinho: Rodrigo Amorim, deputado estadual pelo PSL, que se apresenta como "soldado de Bolsonaro".