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Sucessão presidencial

O que o fim da Lava Jato diz sobre o papel da agenda anticorrupção nas eleições de 2022

Manifestacao contra o PT e pelo impeachment da presidente Dilma Roussef, em Curitiba. Tag: Fora Dilma, Fora PT, protesto (Foto: Gazeta do Povo)

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O fim da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, anunciado na quarta-feira (3), encerra um ciclo iniciado em 2014, quando a operação foi deflagrada e atingiu em cheio o mundo político. A extinção da força-tarefa também antecipa uma tendência para 2022: o discurso anticorrupção não terá papel central nas eleições presidenciais. E somente um possível candidato teria condições de tentar reverter essa tendência: o ex-juiz Sergio Moro.

A agenda de combate à corrupção teve papel importante em 2014 e foi decisiva em 2018. Em 2014, a Lava Jato já revelava o esquema de desvios de dinheiro da Petrobras nos governos do PT; e contribuiu para que o então candidato a presidente Aécio Neves (PSDB) quase fosse eleito. Mas Dilma Rousseff (PT) se reelegeu. Ela, porém, não resistiu ao avanço da Lava Jato: perdeu popularidade e sofreu o impeachment em 2016. Já em 2018, o combate à corrupção foi uma das principais bandeiras de Jair Bolsonaro.

Mas vários fatores enfraqueceram a agenda anticorrupção desde então. O desmonte da Lava Jato atrapalhou o avanço das investigações – e, consequentemente, o assunto perdeu espaço no debate público. A operação também sofreu uma série de ataques e críticas; e parte da população passou a vê-la de forma negativa. A saída de Sergio Moro do Ministério da Justiça também esfriou a agenda dentro do governo Bolsonaro e o debate no Congresso de projetos sobre o assunto.

Mas Moro continua como um nome forte na disputa pela Presidência em 2022. E ele teria condições de tentar levar o combate à corrupção para o centro das discussões, caso seja candidato. Nenhum outro pré-candidato de peso que atualmente pleiteia a Presidência tem se destacado como defensor dessa bandeira.

Levantamento recente do Instituto Paraná Pesquisas mostra que, no cenário atual, Moro empataria tecnicamente com o presidente Jair Bolsonaro em um eventual segundo turno. De acordo com a pesquisa, realizada no fim de janeiro, Bolsonaro tem 39,1% contra 37,6% de Moro. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos. Segundo a pesquisa, o ex-juiz da Lava Jato é o único pré-candidato ao Planalto que, neste momento, teria condições de vencer Bolsonaro.

O que Moro teria de fazer como candidato

O diretor da Paraná Pesquisas, Murilo Hidalgo, diz que Sergio Moro tem um grupo de apoiadores (e potenciais eleitores) justamente pela imagem que construiu à frente da Lava Jato. Mas, segundo ele, a participação do ex-juiz no governo Bolsonaro gerou mais perdas do que ganhos.

“Ele tem uma imagem de anticorrupção muito forte perante a sociedade. Mas sua passagem no governo foi muito ruim. Pelo que a gente analisa, se ele não tivesse entrado no Executivo, hoje ele estaria liderando as pesquisas em todos os cenários”, diz Hidalgo.

Ainda segundo o diretor da Paraná Pesquisas, só será possível mensurar a real força política do ex-juiz da Lava Jato quando ele decidir se filiar a algum partido político e confirmar que tem interesse em disputar um cargo eletivo.

Murilo Hidalgo diz ainda que, além disso, para poder empunhar a bandeira anticorrupção, Moro terá de ter cuidado ao escolher suas alianças políticas. “Quando ele fizer essa opção vamos ter uma visão melhor de como será a aceitabilidade do nome dele na sociedade. Tudo vai depender das alianças que ele construir e qual será o partido escolhido, pois em muitas siglas tem gente denunciada por corrupção. Aí vamos poder mensurar o impacto disso com os eleitores”, afirma Hidalgo.

O diretor da Paraná Pesquisas avalia ainda uma das melhores opções para Moro seria trilhar o mesmo caminho que Bolsonaro fez em 2018. “Só o vejo tendo sucesso numa disputa presidencial se tentar uma carreira solo e em um partido pequeno, pois qualquer outra aliança que ele fizer na campanha, será cobrado por isso." Partidos de tamanho médio para grande tendem a sempre ter políticos envolvidos em denúncias de corrupção.

Pelo menos uma sigla sonha em ter Moro em seus quadros: o Podemos – partido que levanta a bandeira do combate à corrupção no Congresso. A legenda cortejou Sergio Moro e tentou a filiação partidária logo que ele deixou o Ministério da Justiça, no ano passado.

No entanto, o senador Lasier Martins (Podemos-RS) admite que talvez já não seja de interesse do ex-juiz da Lava Jato participar do jogo político. “O Sergio Moro foi convidado para ingressar no Podemos para concorrer à Presidência. Mas agora ele está em um emprego em que se ganha muito dinheiro. Acho difícil [o Moro tentar a carreira política]. Temos dúvida se ele iria deixar um lugar tão confortável e tão bem pago para se meter na política”, afirma Lasier. Em dezembro de 2020, Sergio Moro aceitou o convite da Consultoria Alvarez & Marsal, com sede em Washington (EUA), para atuar como diretor de compliance na área de disputas e investigações.

Além disso, o próprio Moro já disse em diversas ocasiões que não tem interesse em disputar cargos eletivos.

Discurso anticorrupção não será decisivo em 2022, dizem analistas

Especialistas em comunicação e política avaliam que o discurso de combate à corrupção não será decisivo em 2022.

De acordo com o marqueteiro político Marcelo Senise, as eleições municipais de 2020 deram um cenário do que o eleitor vai querer para o Brasil nos próximos anos. “O discurso anticorrupção ainda tem seu peso e tem engajamento, mas ele não dominou na eleição municipal", diz Senise. Em geral, em 2020, os eleitores escolheram nomes conhecidos.

Com base nos resultados das eleições municipais, o marqueteiro aposta em dois perfis de candidatos fortes para 2022: o político com experiência de gestão (e que apresente resultados concretos) ou a "novidade total" (um nome de fora da política novo, que consiga representar os anseios da população).

Seguindo essa mesma linha de raciocínio, Aninho Irachande Mucundramo, professor do Instituto de Ciências Políticas da Universidade de Brasília (UnB), também aposta que a Lava Jato já não terá mais força para gerar votos em 2022.

“Temos hoje um ataque a Lava Jato dos dois lados: dos que foram atingidos por ela e pelos que se beneficiaram dela em 2018. A pauta de combate à corrupção deverá aparecer de forma mais genérica, como sempre, mas não para que políticos usem como única premissa para serem eleitos”, diz Mucundramo.

Projetos anticorrupção estão parados no Congresso

No meio político, a agenda de combate à corrupção esfriou. Projetos que tratam do assunto pouco avançaram no Congresso Nacional na atual legislatura. E as prioridades para 2021, tanto do governo quanto de deputados e senadores, não incluem a pauta anticorrupção.

O pacote anticrime, apresentado por Sergio Moro quando era no ministério da Justiça, acabou sendo desconfigurado durante sua tramitação. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que permite a prisão de condenados em segunda instância judicial não avança. A PEC que acaba com o foro privilegiado para políticos e magistrados está parada na Câmara há mais de 700 dias. E, por outro lado, projetos que enfraquecem o combate à corrupção estão avançando.

Na visão do senador Lasier Martins (Podemos-RS), parte do Congresso se aproveitou do anseio da população por mudanças nas eleições de 2018. Para ele, esses políticos usaram apenas o discurso, mas se omitiram diante das matérias anticorrupção logo depois.

“O Congresso Nacional se omite muito. A eleição de 2018 transmitiu um recado que não foi aprendido: 85% dos senadores foram substituídos. Aí, vêm as eleições para a presidência do Senado e da Câmara e o que nós vimos foi um aliciamento financeiro vergonhoso [para eleger os candidatos a presidente das duas Casas]”, afirma Lasier.

Já a deputada Adriana Ventura (Novo-SP), presidente da Frente Parlamentar Mista Ética Contra a Corrupção, diz que o combate à corrupção não é a prioridade de muitos parlamentares.  “Muitos foram eleitos com essas bandeiras de combater privilégios e a corrupção. Da nossa parte, muitos esforços foram feitos. Mas não tem um apelo suficiente; não tem vontade política”, afirma a parlamentar.

Para ela, os políticos que pregam o combate à corrupção precisam se engajar para levar as propostas até o plenário. Segundo ela, com a cobrança da sociedade, nenhum parlamentar terá coragem de votar contra as matérias dessa área.

“Todos os parlamentares que têm o discurso anticorrupção vão ter que mostrar o que fizeram. Quando a proposta vai para plenário, todo mundo vai votar a favor. E é esse movimento e empenho interno que eu espero que os parlamentares que se comprometeram a combater a corrupção tenham” completa Adriana Ventura.

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