Parlamentares que defendem a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que autoriza a prisão após condenação em segunda instância judicial voltaram a pressionar para que a matéria seja tirada da "geladeira" na Câmara. Eles lembraram que, se a PEC 199/19 estivesse em vigência, o traficante André do Rap não teria sido solto, pois ele já foi condenado por juízo de segundo grau. Mas, além de reduzir a impunidade em casos de corrupção e criminalidade, a proposta teria outro efeito benéfico para a sociedade: iria dar mais rapidez a todo o Judiciário e beneficiaria qualquer cidadão que recorre à Justiça.
A possibilidade de agilizar toda a Justiça ocorre porque a PEC determina que o chamado trânsito em julgado (fim do julgamento) ocorre na segunda instância judicial. E isso não vale apenas para casos de crimes comuns e de corrupção. A PEC 199/19 também abrange matérias cíveis, tributárias, previdenciárias, trabalhistas, eleitorais e das demais áreas da Justiça brasileira.
Seriam beneficiados, por exemplo, o aposentado que entra com uma ação judicial para melhorar seu benefício; o trabalhador que ingressa na Justiça do Trabalho pedindo seus direitos; a empresa que questiona cobranças indevidas de impostos pelo Estado. Em vez de ter de esperar três ou até quatro julgamentos para o caso ser resolvido, haveria um posicionamento já na segunda instância.
A PEC estabelece que os recursos protocolados em cortes acima da segunda instância – Tribunal Superior do Trabalho (TST), Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Supremo Tribunal Federal (STF) – continuariam a existir. Mas seriam considerados, na prática, como um novo processo.
“Com a PEC da segunda instância, idosos que hoje ingressam com ações previdenciárias para reajustar uma aposentadoria ou pensão em R$ 200, R$ 300, vão ter uma prestação jurisdicional em tempo mais razoável”, disse o deputado Fabio Trad (PSD-MS) à Gazeta do Povo. Trad é relator da PEC na comissão especial da Câmara criada para discutir a proposta.
“O que propomos é muito mais do que prisão em segunda instância”, disse o presidente da comissão especial da PEC, deputado Marcelo Ramos (PL-AM), numa reunião online do grupo realizada em 30 de setembro. “O que propomos é uma verdadeira reforma do poder Judiciário. A mais profunda e estruturante reforma do poder Judiciário, que, sendo aprovada, vai entregar ao país um Judiciário mais célere, mais efetivo e que resgate a confiança das pessoas.”
Rodrigo Maia pressionado a agilizar a PEC da prisão em segunda instância
A reunião online da comissão especial realizada no 30 foi uma forma de pressionar o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ, a determinar a reinstalação oficial do grupo – o que ele vem resistindo a fazer. Sem a reinstalação oficial, a PEC não pode avançar.
Pressionado por causa do caso de André do Rap, cuja soltura só foi possível por uma mudança na lei aprovada pelo Congresso, Rodrigo Maia chegou a prometer na terça-feira (13) a colocar a PEC em votação ainda neste ano. Apesar disso, ele também afirmou que não se pode misturar a discussão sobre o caso do traficante solto pelo Supremo Tribunal Federal (STF) com a discussão da prisão em segunda instância.
Como são os processos penais no Brasil e em outros países
O sistema de processo penal brasileiro é uma legítima “jabuticaba” jurídica. Um réu acusado numa instância federal pode recorrer, por exemplo a quatro instâncias: as Varas Criminais Federais, os Tribunais Regionais Federais (TRFs), o STJ e o STF. O processo, no entanto, pode ser ainda mais lento. A partir da segunda instância, há recursos internos nas Cortes que podem ampliar cada jurisdição em outros dois ou três graus. Assim, na prática, a Justiça brasileira não chega a ter quatro, mas até oito instâncias.
É uma situação diferente da de outros países. Nos Estados Unidos, por exemplo, a prisão após condenação em segunda instância é permitida, mas ela também pode ocorrer em caso de o réu assumir a culpa.
Na Holanda, embora o réu possa esgotar todas as possibilidades de recursos, a Suprema Corte local julga apenas a aplicação da lei, não sendo acionada com a mesma frequência que no Brasil.
Em Portugal, há três instâncias, das quais apenas crimes com pena acima de oito anos chegam ao último grau. Na Alemanha, apesar da prisão ser decretada após o esgotamento de todos os recursos, apenas crimes graves, como homicídios, chegam à última instância.
PEC da prisão em segunda instância é constitucional ou não?
A antecipação do trânsito em julgado para a segunda instância de todas as matérias, conforme previsto na PEC 199/19, é motivo de questionamentos sobre sua constitucionalidade.
O professor da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (UnB) Cristiano Paixão, procurador regional do Trabalho, tem sérias dúvidas sobre a constitucionalidade da PEC. “Tudo indica que é inconstitucional e inoportuna sua discussão misturando o tema da política legislativa e criminal com questões eleitorais, tributárias, trabalhistas e outras”, diz ele.
O debate da prisão após condenação em segunda instância, no entendimento de Paixão, não deveria trazer junto a antecipação do trânsito em julgado para todos os processos. “Possivelmente há uma mistura complicada. São situações que devem ser tratadas de modo distintas. Entendo a preocupação e respeito quem defende esse posicionamento, mas me parece inconstitucional”, analisa. “Nossa Constituição fala no artigo 5.º que a condenação só se dá após o trânsito em julgado. E isso tem sido observado a partir de uma ótica equivocada e política”, acrescenta.
A discussão da segunda instância, avalia Paixão, está muito relacionada à Lava Jato. Diante da polarização criada no país, ele prega cautela na condução do debate. “Estamos falando de direitos de pessoas. Temos um sistema carcerário que já é sobrecarregado; temos o maior número de detentos do mundo, além de vários outros problemas. Parece ser muito contrário ao constituinte ampliar esse sistema com mais apenados, principalmente quando já tem prisão provisória e preventiva para situações específicas”, justifica. “Não me parece que seja uma medida que tenha amparo na Constituição e não me parece oportuno discutir isso.”
O deputado Fábio Trad, relator da PEC 199, contudo, defende a ampliação da segunda instância e não vê inconstitucionalidade alguma. “Ao meu sentir, seria inconstitucional se se limitasse à área penal. O texto só ganha constitucionalidade justamente porque é extensivo a outras áreas do Direito, uma vez que o trânsito em julgado é conceito unitário”, sustenta Trad. Para ele, não pode transitar em julgado em determinado momento para uma área e não para todas. “Não se pode fragmentar, pois violaria o princípio da presunção de inocência.”
A PEC 199, prossegue Trad, não viola a Constituição porque não altera uma cláusula pétrea. As cláusulas pétreas estão previstas no artigo 5.º da Constituição, mas o texto altera o sistema de recursos do sistema processual, previsto nos artigos 102 e 105. “Tanto isso é verdade que a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), quando recebeu a primeira PEC, que é aquela que alterava o artigo 5, rechaçou [a proposta]", diz Trad, se referindo a outra proposta de emenda à Constituição que pretendia permitir a prisão em segunda instância.
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