O deputado federal Pedro Lupion (PP-PR) assume em fevereiro a presidência da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), a bancada ruralista, segmento importante do Congresso Nacional e que representa um dos braços de maior relevância da economia brasileira. O setor apoiou em peso Jair Bolsonaro (PL) nas duas últimas campanhas presidenciais e, de acordo com o deputado, deve agora fazer oposição ao presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), "no que for necessário".
Lupion disse que o segmento tem "afinidade ideológica" com Bolsonaro e assegura que no governo do atual presidente diversas conquistas foram obtidas, como a abertura de mais mercados no exterior, o enfraquecimento de movimentos sociais e o aumento da segurança no campo.
Disse que vê com bons olhos alguns dos nomes cotados para assumir o Ministério da Agricultura da gestão petista, como o senador Carlos Fávaro (PSD-MT) e o deputado Neri Geller (PP-MT). Lupion afirma que outro nome cotado, o do também deputado Sérgio Souza (MDB-PR), "seria um sonho" para o setor. Souza é o atual presidente da FPA.
Lupion é crítico à PEC fura-teto, considerada por ele um "cheque em branco" para Lula e que tem, segundo ele, o defeito de assegurar poucos recursos ao agronegócio.
O futuro presidente da FPA disse ainda que a bancada apoia a reeleição de Arthur Lira (PP-AL) à Presidência da Câmara e que enxerga o setor dividido em relação à disputa para o comando do Senado - parte dos parlamentares defende a recondução de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), enquanto outros preferem Rogério Marinho (PL-RN).
Leia abaixo a entrevista concedida por Lupion à Gazeta do Povo.
O senhor apoiou Bolsonaro, assim como a maior parte dos membros da bancada ruralista. A FPA vai ser uma entidade de oposição ao governo Lula?
Pedro Lupion: No que for necessário, sim. No que for possível, não. O nosso papel é de proteger o setor, de defender os interesses de um setor da economia. Nós somos a bancada ruralista, a gente tem que defender o produtor rural. No que tiver ataque ao nosso setor, seja no direito à propriedade, seja em legislação, seja em prejuízo aos avanços do nosso setor, a gente tem que reagir. Agora, é óbvio que nossa responsabilidade como políticos lá é a criação de pontes para, obviamente, ter um relacionamento melhor e atingir nossos objetivos. Mas, se radicalizarem, a gente também tem que radicalizar.
Por que o governo Bolsonaro foi tão favorável ao agro? Por que o apoio maciço do segmento ao Bolsonaro?
Primeiro, por alinhamento ideológico claro. Acho que a grande maioria da FPA, na época e até hoje, tem um alinhamento ideológico um pouco mais à direita. Então havia essa tranquilidade. Quando Bolsonaro foi eleito, ele inovou; foi atrás das bancadas temáticas pedir apoio para formação de ministérios, e naquele momento achou-se por bem indicar a Tereza Cristina para ser ministra da Agricultura, que fez um belíssimo trabalho. Foi elogiada por todo mundo.
Então é óbvio que, como na época ela era a presidente da FPA, nós acabamos tendo uma ligação muito forte com o governo, inclusive dentro do Ministério da Agricultura. O Ministério do Meio Ambiente acabou tendo uma boa relação conosco também. Não foi um "libera geral", mas nós conseguimos discutir ações e avançar em alguns temas.
A questão de direito à propriedade e reforma agrária mudou completamente o perfil. Deixou de ser politizada para ser algo de titular efetivamente os assentados, e tirar essas pessoas de movimentos sociais, dando a elas o título da priopriedade para elas serem produtores rurais de verdade. Isso tudo a gente tem que aplaudir, tem que elogiar.
É óbvio que não se espera esse mesmo tipo de relacionamento com o governo do PT. Até porque a campanha eleitoral deixou isso muito claro. Nós fomos atacados algumas vezes, criticados outras, mas até agora o governo [Lula] tem tentado de alguma maneira demonstrar uma certa disposição de diálogo. Em alguns atos não, em algumas situações tem pisado na bola com a equipe de transição, mas tem sempre tentado não ir para o confronto direto.
Qual é o espaço que a esquerda tem na bancda? A esquerda não participa hoje da FPA por que não quer ou por que não seria bem recebida?
Porque não quer. Porque pensa diferente da gente. A esquerda até tem uns parlamentares na FPA - tem do PDT, tem do PSB, tem parlamentares que apoiaram o Lula e são da FPA. É o caso do Neri Geller, do Marcelo Castro (MDB-PI), da Kátia Abreu (PP-TO), do Arnaldo Jardim (Cidadania-SP), que é meu vice-presidente eleito. Não existe esse problema. Não há uma proibição para alguém participar da FPA.
Mas é óbvio que, quando se trata de política de agronegócio e de produção, a gente está falando de direito à propriedade, de multinacionais, de um setor que depende muito de política externa. E isso faz com que o raciocínio, principalmente no que se defende de política de mercado, e de economia, seja diferente.
Como o senhor avalia o trabalho, em relação ao agro, da equipe de transição governamental?
A transição é comandada por algumas pessoas que são da bancada. O senador Fávaro, o deputado Neri Geller e tantos outros que são do nosso convívio pessoal. Eu não gostei do material que foi divulgado [relatório feito pela equipe de transição, que criticou a atuação do governo Bolsonaro para o setor]. Me assustou um pouco o desmantelamento do Ministério da Agricultura, colocar a agricultura familiar lá no Desenvolvimento Agrário, tirar florestas plantadas do agro e colocar no Meio Ambiente. Mas são todos temas que dá para debater. Dá para discutir. Eu acho que são pessoas que entendem do setor e que foram bem preparadas para aquele momento para fazer um raio-X do que está hoje no nosso agro.
Agora, tem muitas coisas que a gente tem que proteger e não pode perder. Por exemplo, nós abrimos mais de 200 mercados internacionais que nós não tínhamos. Ou seja, houve um avanço com a última gestão do Ministério de Relações Exteriores, do Itamaraty, de nós colocarmos adidos agrícolas em todas as embaixadas, em trabalhar para vender a imagem do Brasil e do agro para fora.
Então são temas que a gente precisa defender sempre para que não perca tudo aquilo que foi avançado nos últimos quatro anos. Aí assusta um pouco o relatório que foi apresentado. Mas isso tudo dá para a gente ir convivendo, debatendo, discutindo. E, no que depender da gente no Congresso, defender os interesses do setor.
Até agora não foi definido o ministro da Agricultura de Lula. Essa demora incomoda ou preocupa o senhor?
Depende do ponto de vista. Às vezes, é até bom. Porque se fosse de primeira, poderia ir um "xiita", alguém complicado. Mas pelos nomes que a gente tem visto em disputa, são nomes que nos agradam.
O senador Fávaro?
O Fávaro é um, mas já surgiu o nome do próprio Sérgio Souza, que para nós seria um sonho. O MDB poderia colocar o Sérgio lá, o que para nós seria maravilhoso. Tanto o Sérgio quanto o Fávaro, o Neri, Nilson Leitão [ex-deputado federal do PSDB-MT], Arnaldo Jardim, são todos nomes que estão transitando por aí. Inclusive, escutei o nome da Ana Amélia [ex-senadora, do PSD-RS]. São nomes que têm o nosso respeito e tem uma boa interlocução conosco.
É óbvio que o Ministério da Agricultura precisa ter uma boa interlocução com a bancada ruralista. Se não, é muito difícil. Lembro dos tempos passados de radicalização em que a troca de ministro da Agricultura era constante. Porque a bancada derrubava, literalmente. Longe da gente falar que nos dias atuais há algo parecido a chegar a esse ponto. Mas pelos nomes que estão circulando por aí, a possibilidade nos agrada.
Qual é a opinião do senhor sobre a divisão do Ministério da Agricultura, com a recriação de pastas como do Desenvolvimento Agrário e da Pesca?
Muito mal. Não gosto. Primeiro porque, quando a gente briga com todo mundo junto, brigando por orçamento, por estrutura, por espaço, a gente tem muito mais força tendo um "superministério" da Agricultura como nós temos hoje. Não vejo necessidade nenhuma, nenhuma de, por exemplo, tirar a agricultura familiar do Ministério da Agricultura. Acho isso uma pena.
O pessoal fala muito que "não podemos tratar como iguais os desiguais". Mas qual desigualdade é essa? A desigualdade que no último Plano Safra cerca de 70% dos contratos foi de Pronaf [Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar]? Nós estamos fazendo políticas públicas para a agricultura familiar. E estamos falando do Paraná, em que 90% do nosso agro é de agricultura familiar. São quase 300 mil propriedades aqui. Diferente de quando a gente trata do cenário de Mato Grosso, Pará, Rondônia, Maranhão em que são aqueles megalatifúndios. Nós tratamos a agricultura familiar como igual.
Então eu acho isso [a divisão do Ministério] muito ruim. Porque a gente divide orçamento, divide políticas, acaba tendo uma formação e um confronto dentro do mesmo setor, "isso é familiar, isso não é, isso merece, isso não merece". Por exemplo: o Paraná é o maior produtor de frango do país. E 99% do frango produzido no Paraná é produzido em pequenas propriedades. É uma agricultura familiar, com pai, mãe e filhos trabalhando numa granjinha pequena, a grande maioria de cooperados. A fruticultura aqui é toda de pequenas propriedades. É difícil a gente separar isso. Eu acho muito ruim.
E outra coisa que acho péssima e que vai travar o sistema é a gestão das florestas plantadas. Nós temos aqui [no Paraná], por causa da Klabin, muitas florestas plantadas, de eucalipto e pinus, com reflorestamento, e passar isso para o Ministério do Meio Ambiente significa um retrocesso total, porque a gente vai ter que pedir autorização para o Ibama para cortar um eucalipto. É um negócio que não vai funcionar. Não tem gente para fazer isso funcionar. A gente tem que encarar: estamos falando de atividades agro-silvo-pastoris. Isso está com o Ministério da Agricultura. A silvicultura de reflorestamento é uma atividade agropecuária. Não tem porque ela ser tratada como atividade ambiental. Atividade ambiental é manejo de floresta nativa, não é plantio de eucalipto. Isso vai atrapalhar muito, com certeza.
Qual é a opinião do senhor sobre a possibilidade de Marina Silva retornar ao Ministério do Meio Ambiente?
Eu acho complicado. A experiência que nós, do agro, tivemos com ela, principalmente aqui no Paraná, foi muito ruim. Ela criminalizou praticamente toda a região Sul e Sudeste do estado do Paraná. Fez um decreto de criação de parques e reservas ambientais que inviabilizou muitas áreas de produção. Não é alguém que tenha perfil de diálogo conosco. Existem outros nomes bem melhores. Mas graças a Deus, o que estou ouvindo ultimamente é que ela continuaria no Congresso, e não seria ministra. Agora, se for, lamento e vamos ter que enfrentar.
Qual é o posicionamento do senhor e da FPA para as disputas para as presidências de Câmara e Senado?
Falando como Pedro Lupion, e não como presidente da FPA: eu sou do partido do Arthur Lira. Concordando ou discordando dos posicionamentos dele. Conosco, com os deputados do agro, ele cumpriu o que tinha combinado na eleição. Votar a pauta do licenciamento ambiental, do autocontrole, da regularização fundiária, dos defensivos agrícolas. Isso tudo ele cumpriu. Pautou e fez a parte dele. Infelizmente, está tudo parado no Senado, porque lá foi exatamente o contrário. Eu vou votar no Arthur Lira para presidente.
No Senado, existe uma divisão muito clara. Dentro da FPA não há uma decisão formada. Porque existem senadores novos, eleitos pela direita que tem a tendência de não ir com o Rodrigo Pacheco, e tem atuais senadores, inclusive o nosso vice-presidente Zequinha Marinho, que tem a tendência de ir com o Rodrigo. Então não posso dizer qual é a tendência do posicionamento da FPA em relação à eleição do Senado. Não houve declaração de apoio a nenhum candidato lá. Em relação ao Arthur Lira, sim. Houve um evento oficial de declaração de apoio de todos os membros da FPA.
O que se pode esperar do partido do senhor, o PP, nos próximos anos? É possível uma aproximação com o governo Lula?
Eu não espero nada do PP. Sou "pinto novo na granja", tenho que piar baixinho. Não me surpreenderia se, não só o PP, mas o Centrão como um todo, vier uma adesão de boa parte dos parlamentares ao novo governo. Dentro do PP já está muito clara essa posição.
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