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Disputa pelo Orçamento da União

Perspectiva de devassa jurídica de emendas deve gerar forte impacto no cenário político

Congresso pressionado por aliança entre STF e Executivo nas emendas
Oposição acredita que decisão do ministro do STF Flávio Dino de suspender emendas parlamentares beneficiou governo em detrimento dos parlamentares (Foto: EFE/André Borges)

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O avanço das investigações da Polícia Federal (PF) no inquérito para apurar desvios em emendas parlamentares deve produzir forte impacto nos cenários políticos, com a perspectiva de que investidas do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), produzam devassa jurídica para revelar esquemas de corrupção.

As primeiras apurações do rastreamento de parte dos R$ 4,2 bilhões em emendas de comissões temáticas bloqueadas por Dino indicam altos valores desviados por dezenas de deputados e senadores de perfis ideológicos variados. Enquanto Dino avisa que não recuará, o Congresso esboça reações contra Executivo e Judiciário.

Para políticos e analistas consultados pela Gazeta do Povo, é possível vislumbrar desdobramentos potenciais para os impactos das ações que exigem transparência das emendas e que têm Dino como relator. Elas vão desde a paralisia na votação do orçamento federal até o favorecimento de candidaturas presidenciais. Confira abaixo alguns desses possíveis cenários:

Empoderamento de Dino dentro e fora do STF, com alvo na eleição presidencial

Desde que tomou posse como ministro do STF, em fevereiro de 2024, Flávio Dino tem reforçado o ativismo judicial da Corte, com várias intervenções no Executivo e Legislativo, incluindo uma pauta anticorrupção. Com relação às emendas, ela envolve pedidos de investigações à PF e aos órgãos de controle do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Como o combate a desvios de recursos públicos é tema presente na agenda oficial dos poderes, com amplo apoio da sociedade, os atos de Dino por mais transparência de emendas sugere a busca pela popularidade que tornou os magistrados dos julgamentos do mensalão e petrolão potenciais candidatos ao Palácio do Planalto.

“Como político de longa e variada carreira, o ministro Dino sabe bem do valor desse inquérito e deverá conduzir as suas fases da investigação em um ritmo muito particular, de modo a não perder o protagonismo e nem cometer excessos que deslegitimem a ação”, avalia Marcus Deois, diretor da Ética Consultoria Política.

Novas mudanças para endurecer as regras para as emendas de comissões

Nos últimos despachos relativos ao bloqueio de emendas de comissões, Dino cobrou da Câmara e do Senado ajustes nas regras para alocação das verbas, além das já aprovadas no fim de 2024 - sob pressão do ministro por mais transparência. Ele deu prazo até 31 de março para que todos os “padrinhos” sejam identificados.

Congressistas, contudo, temem que a mudança engesse o fluxo direcionado de recursos para suas bases eleitorais e tire a autonomia conquistada pelo Congresso em relação ao governo. Mas há aqueles que enxergam nela uma barreira contra os abusos, além de um meio garantido para blindar a todos de futuras suspeitas.

Em paralelo, o governo federal vem buscando meios para resgatar ou barrar verbas de emendas suspeitas. O discurso de cumprimento das decisões judiciais não esconde a tensão do Palácio do Planalto com os crescentes déficits fiscais e o cada vez mais reduzido espaço de verbas não-obrigatórias.

Tendência de escalada das tensões entre Legislativo, Executivo e Judiciário

O clima de desconfiança entre governo e Congresso piorou no fim de 2024 em razão dos bloqueios das emendas por Dino, que muitos ligam à "parceria" entre Executivo e Judiciário. Com o avanço de diligências da PF, a tendência é de as tensões escalarem, alcançando o STF dentro de uma crítica à “criminalização da política”.

Integrantes do Centrão têm observado atentamente a postura de Hugo Motta (Republicanos-PB), que deverá assumir o comando da Câmara em fevereiro e ainda não se posicionou de forma clara como reagirá à crise. Ele já está sendo pressionado a criticar às ações de Dino e a prometer pautar projetos contra o ativismo judicial.

Também ganhou força a movimentação no Congresso para retardar a votação do Orçamento da União deste ano, que ficou pendente em 2024, como barganha para Dino conter “perseguições políticas” da PF mediante forte pressão sobre o governo. Além disso, a falta da votação de outras pautas importantes serviriam de retaliação por parte do Parlamento.

Volta do debate sobre o financiamento privado das campanhas eleitorais

O cientista político Márcio Coimbra vê a crise das emendas como uma disputa pelo controle do Orçamento após o Congresso ter se fortalecido com a definição de mais destinações de verbas. “Esse avanço veio, contudo, com emendas de relator (RP9) e artifícios semelhantes, que geraram suspeitas pela falta de transparência”, diz Coimbra, que é presidente do Instituto Monitor da Democracia.

Segundo ele, o Congresso deveria agir abertamente, dando mais transparência às emendas, até para evitar novas interferências do STF, que por sua vez aciona a PF para também mostrar força. Ele aposta que a postura negociadora de Hugo Motta, futuro presidente da Câmara, pode acabar com o impasse.

Diante do cerceamento de emendas voltadas a interesses eleitorais, parte dos parlamentares tenta reabrir o debate sobre o modelo de financiamento de campanhas eleitorais para não depender do fundo público e de pessoas físicas. A volta de contribuições privadas ganha força também com novos limites ao fundão.

Ainda existe grande resistência da sociedade e, sobretudo, de setores mais à esquerda, que receiam influência do poder econômico nas disputas. Porém, a ideia de um sistema híbrido, com parte de financiamento público e parte privado, sob regras rígidas e forte vigilância, voltou à pauta do Câmara nos últimos meses.

Incentivo a movimentos pela moralização da política com novos atores e ideologias

A possível eclosão de um noticiário marcado por denúncias e prisões de parlamentares envolvidos em corrupção com emendas poderia reforçar a desconfiança do público em partidos tradicionais, favorecer a articulação de grupos que defendem a “limpeza” no sistema político e o surgimento de novos postulantes à Presidência.

Embora muitos desses grupos se apresentem como “não ideológicos” ou de combate à corrupção, sua repercussão na sociedade esbarraria na divisão entre esquerda e direita, e ainda no avanço obtido pelo centro nas eleições municipais, indicando menos impulso pela renovação de personagens.

As investigações sobre desvios de recursos públicos nas emendas parlamentares pode dar visibilidade positiva à PF, que vem sendo criticada por ações que sugerem perseguição política a parlamentares conservadores, sobretudo aos próximos ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Em jogo está a noção de autonomia da corporação.

Aumento de risco político deve piorar mau humor do mercado com incertezas

A combinação de graves conflitos entre os poderes, inquéritos policiais de grande envergadura com forte repercussão midiática e possíveis mudanças de regras no Orçamento contribuem para percepção geral de crescente risco político. O mau humor dos investidores, já afetado pela instabilidade fiscal, tenderia a se agravar.

Nas últimas semanas, oscilações mais fortes na bolsa de valores e variações na cotação do dólar, com picos históricos acima de R$ 6, foram registradas. Para analistas, os rumores de crises institucionais e as dúvidas sobre como o Congresso vai atuar em favor de projetos para mitigar os rombos fiscais deterioram os cenários projetados.

Para Marcus Deois, da Ética Consultoria, Lula tem na mão a chance de melhorar a relação com o mercado, de quem sofre clara aversão. “Se ele não preservar a autonomia do novo presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, e achar que política monetária pertence ao governo, teremos um ano bem pior”, diz.

Para analista, Dino quer usar o STF para tentar controlar a política nacional

Segundo o cientista político Flávio Testa, o ministro Flávio Dino pretende controlar a política nacional, tal como que fez em nível estadual quando governou o Maranhão. “Ele quer ser presidente da República e se beneficia da falta de nomes fortes à esquerda além de Lula, recorrendo ao STF para se impor”, avalia.

Testa lembra que Dino venceu a disputa pela OAB em Brasília e quer Ricardo Cappeli (PSB), seu braço direito no Ministério da Justiça, candidato ao governo distrital. Por outro lado, a ligação com Lula e acertos com os novos presidentes da Câmara e do Senado sobre as emendas poderão favorecer o Executivo e fragilizar a oposição.

Com verbas liberadas e distribuição de cargos, o governo teria sustentação do STF e Congresso. "Ao lado de Alexandre de Moraes, o ministro assumiria, então, efetivo controle da Corte", opina.

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