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A delegada da Polícia Federal Denisse Ribeiro concluiu que a ausência do presidente Jair Bolsonaro no depoimento da última sexta-feira (28) sobre o inquérito que apura o vazamento de informações não prejudicou as investigações sobre o caso. A conclusão consta em relatório final encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF) no qual a Polícia Federal apontou a prática de dois crimes que foram cometidos pelo presidente da República. A delegada, porém, optou por não indiciar Bolsonaro pelo fato do presidente ter foro privilegiado. O presidente alega ter exercido o "direito de ausência" ao não prestar depoimento.
“Decorrido o prazo estabelecido, não houve atendimento à ordem judicial mencionada, inviabilizando-se a realização do ato e a consequente obtenção da perspectiva do Sr. JAIR MESSIAS BOLSONARO a respeito dos fatos. Essa situação, entretanto, não teve o condão de impedir a correta compreensão e o esclarecimento do evento”, aponta o relatório.
O documento com as conclusão faz parte do inquérito aberto pelo ministro Alexandre de Moraes para apurar o vazamento da investigação sobre o ataque hacker a sistemas internos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2018. Em agosto do ano passado, Bolsonaro revelou detalhes da investigação numa entrevista e depois divulgou os documentos em suas redes sociais.
Crimes de Bolsonaro e Barros
Em seu relatório final enviado ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), a delegada imputou ao presidente Jair Bolsonaro a prática de dois crimes: divulgação de segredo (“divulgar alguém, sem justa causa, conteúdo de documento […] quando resultar prejuízo para a Administração Pública”, com pena de 1 a 6 meses de detenção) e violação de sigilo funcional (“revelar fato de que tem ciência em razão do cargo e que deva permanecer em segredo, ou facilitar-lhe a revelação”, com pena de reclusão de 2 a 6 anos).
Ribeiro também imputou mesmos crimes ao deputado federal Filipe Barros (PSL-PR), que obteve cópia do inquérito junto à PF para subsidiar o relatório da proposta do voto impresso, que tramitava na Câmara dos Deputados. A delegada disse que o presidente e o parlamentar acessaram a investigação em razão de seus cargos. Ele também foi beneficiado foro. O único indiciado foi o ajudante de ordens Mauro Cid, que teria ajudado Bolsonaro a divulgar o inquérito.
No documento a delegada aponta que tanto Bolsonaro quanto Barros tiveram atuação direta, voluntária e consciente de Bolsonaro para revelar conteúdo de inquérito policial que deveria permanecer em segredo até o fim das diligências.
“MAURO CID, para justificar suas ações, informou ter tido acesso a um documento da Polícia Federal apresentado por FILIPE BARROS atestando a “inexistência de sigilo” do inquérito policial nº 1361/2018-SR/PF/DF, informação essa inexistente nos autos. De outro lado, confirma ter publicizado o teor do inquérito, por determinação do presidente da república, bem como expôs que a finalidade da live era a divulgação desse documento”, diz trecho do relatório.
“O cotejamento dos elementos de interesse obtidos durante a investigação possibilitou que se exarasse o despacho fundamentado que determinou o indiciamento de MAURO CESAR BARBOSA CID, bem como apontou autoria, materialidade e circunstâncias do fato, atribuindo a prática do crime também a FILIPE BARROS BAPTISTA DE TOLEDO RIBEIRO e a JAIR MESSIAS BOLSONARO.”
Desvio de finalidade
O inquérito indica ainda um desvio de finalidade do parlamentar ao entregar uma cópia das investigações ao presidente da República. Segundo o documento, todas as pessoas ouvidas que promoveram a divulgação confirmam que o fornecimento de cópia do inquérito policial em andamento ao deputado Filipe Barros foi feito originalmente com o fim específico de subsidiar as discussões relativas a PEC que discutia o voto impresso.
“FILIPE BARROS BAPTISTA DE TOLEDO RIBEIRO, com desvio de finalidade, entregou referida cópia (das investigações) a JAIR MESSIAS BOLSONARO, presidente da república, ciente de seu interesse no tema, muito embora não haja, conforme relatório correicional realizado e oitiva de testemunhas (vide declarações de MÁRIO ALEXANDRE GAZZIRO), qualquer indicação de que os fatos apurados naquele inquérito tenham relação com invasão a sistema de votação ou ocorrência de fraudes em eleições”, diz a delegada no documento.
A Advocacia-Geral da União (AGU), que faz a defesa de Bolsonaro no caso, alega que o inquérito não era sigiloso e que, portanto, não houve o cometimento de crime. Com o recebimento do relatório final que conclui a investigação, Moraes deve agora encaminhar o documento à Procuradoria-Geral da República (PGR), que deverá avaliar se denuncia, arquiva ou pedirá novas diligências sobre o caso.