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Suspensão dos despejos

O que está no projeto que flexibiliza contratos durante a crise do coronavírus

PL 1179, da renegociação contratual, será votado por sessão remota do Senado
PL 1179, da renegociação contratual, será votado por sessão remota do Senado (Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado)

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Para reagir à crise provocada pela pandemia da Covid-19, o poder Legislativo tem apresentado um grande volume de projetos de lei – só entre os senadores, as propostas já somam mais de 100. Uma bastante ambiciosa e ampla será analisada nesta sexta-feira (3). O PL 1179 de 2020, do senador Antonio Anastasia (PSD-MG), flexibiliza regras de contratos de aluguel e agrários, suspende liminares de ações de despejo, aumenta o poder de síndicos e estabelece prisão domiciliar para casos de atraso no pagamento de pensão alimentícia.

Alguns pontos controversos foram derrubados nesta manhã, às vésperas da votação, como a previsão de suspensão do pagamento de aluguéis.

Leia a íntegra do PL 1.179 de 2020

O texto amplo instaura, nas palavras da equipe do senador, um Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado (RJET) no período da pandemia. Mas essa não é a única proposta, que estão sendo agrupadas por temas, de forma a agilizar sua análise.

Na última terça-feira, por exemplo, entraram na pauta o projeto 1006/2020, que dispõe sobre a prestação de auxílio financeiro pela União às santas casas e hospitais sem fins lucrativos que participam de forma complementar do Sistema Único de Saúde (SUS), e o projeto 702/2020, já aprovado em plenário na Câmara dos Deputados e que dispensa o empregado de apresentar atestado médico no período em que ficar recolhido em casa.

Aluguel, usucapião e condomínios: o que diz o PL 1179

As principais mudanças sugeridas pelo projeto de lei:

  1. Atos associativos, como reuniões de colegiados e assembleias, poderão ser realizados de forma remota.
  2. Todos os prazos legais para a realização de assembleias e reuniões de quaisquer órgãos, presenciais ou não, ficam prorrogados até 30 de outubro.
  3. As liminares para ações de despejos de imóveis prediais ficam suspensos até 31 de dezembro, a não ser que o locador retome o local para uso próprio ou de familiares.
  4. As regras para contratos agrários ficam flexibilizadas. Mas a contagem do tempo de ocupação de terrenos, para efeito de usucapião, é suspensa.
  5. Os síndicos e responsáveis pela condomínios ficam autorizados a criar restrições temporárias para o acesso a áreas comuns e a realização de obra. E as assembleias podem ser realizadas de forma remota.
  6. Os dividendos fornecidos por sociedades comerciais a seus sócios poderão ser antecipados.
  7. Passa a ser liberada, até 30 de outubro, a celebração de contratos de arrendamento com empresas nacionais cujo capital social pertença majoritariamente a pessoas naturais ou jurídicas estrangeiras.
  8. A falta de pagamento de pensão alimentícia passa a ter a prisão domiciliar como pena.
  9. No caso de compras em delivery, fica suspenso o artigo 49 do Código de Defesa do Consumidor, que afirma: “O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio”.
  10. A data de vigência da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) fica adiada em 18 meses.

Proposta não é consenso

Desenvolvido por uma equipe de juristas ao longo de cinco dias de trabalho, o projeto de lei 1.179 é resultado de uma parceria do senador Anastasia com o presidente do Supremo Tribunal Federal, o ministro José Antonio Dias Toffoli. O trabalho recebeu a coordenação técnica do ministro Antonio Carlos Ferreira, do Superior Tribunal de Justiça, e do Conselheiro Nacional do Ministério Público.

Também participaram da elaboração do projeto os professores, juristas e advogados Otavio Luiz Rodrigues Jr., Rodrigo Xavier Leonardo, Fernando Campos Scaff, Paula Forgioni, Marcelo von Adamek, Francisco Satyro, José Manoel de Arruda Alvim Netto, Rafael Peteffi da Silva, Roberta Rangel e Gabriel Nogueira Dias. Parte das normas definidas pelo projeto serão levadas por Dias Toffoli diretamente ao Conselho Nacional de Justiça.

A iniciativa altera uma série de leis em caráter temporário, contando de 20 de março e seguindo até dia 30 de outubro, visando ajustar a legislação brasileira durante o auge da pandemia (veja a lista completa no quadro).

A inspiração dos autores está na Lei Faillot, apresentada em 21 de janeiro de 1918, que estabeleceu regras excepcionais para a França arrasada pela Primeira Guerra Mundial. Neste momento de pandemia, o Legislativo da Alemanha discute um projeto semelhante ao apresentado pelo senado Anastasia.

“Recebi diversas sugestões de juristas importantes para apresentar um projeto de lei no sentido de evitar uma grande judicialização decorrente dos problemas da pandemia na área econômica”, explica o senador. “Temos prazos, no direito civil, que estão correndo e infelizmente, em razão do novo quadro, se tornam inviáveis. O projeto tem o objetivo de evitar um número imenso de ações judiciais e dar uma trégua de seis meses, até o fim de outubro”. O senador lembra que o projeto altera prazos, “sem retirar nem modificar nenhum direito”.

Para o advogado Rodrigo Ferrari Iaquinta, sócio coordenador do Departamento de Direito Imobiliário do BNZ Advogados, é preciso ter cautela num momento de crise para não se criar uma proliferação de novas legislações e regramentos, porque é uma situação transitória e que pode causar confusão no ordenamento jurídico.

Questões específicas como prisão domiciliar para devedores de pensão alimentícia e o aumento do poder do síndico já estão previstas na atual legislação, diz o advogado. "O síndico já tem autonomia para zelar pelo bem comum. Tudo que fizer com bom senso e com vistas a diminuir os efeitos da pandemia já está abarcado, sem a necessidade de uma nova lei", avalia.

Para Márcio Casado, sócio do Márcio Casado & Advogados, a proposta é falha por restringir as possibilidades de revisão contratual. "O Senador Anastasia considera que eventos econômicos, causados pelo coronavírus, por meio de uma ficção jurídica, deixam de ser imprevisíveis. São eles: aumento da inflação, variação cambial, desvalorização ou substituição do padrão monetário. Se o COVID-19 é evento imprevisível, suas consequências, evidentemente, também o são. A construção do PL 1179 é deficiente e prejudicial a quem for atingido pela pandemia", argumenta.

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