O pacote de medidas anunciado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para conter atos que atentem contra autoridades ou resultem em manifestações, como as que ocorreram no 8 de janeiro, com a invasão de prédios públicos na Praça dos Três Poderes, em Brasília, não deve ser bem recebido pelo Congresso Nacional.
O objetivo do governo é criar penas altas para crimes cometidos contra o Estado Democrático de Direito e golpe de Estado. Na letra da lei, a iniciativa se justificaria. Mas o projeto causa apreensão porque não se sabe o que o Executivo e o Judiciário vão considerar crimes contra o Estado Democrático de Direito. Pelo histórico de condenações, na prática, qualquer episódio pode ser enquadrado na descrição - até bate-boca em aeroporto.
O Plano de Ação na Segurança anunciado por Lula inclui um projeto de lei que aumenta a pena para crimes cometidos contra o Estado Democrático de Direito e golpe de Estado. De acordo com o texto, quem organizar ou liderar movimentos "antidemocráticos" pode pegar de 6 a 12 anos de prisão. A mesma pena, que pode ser aumentada de acordo com a "violência" praticada nos atos, serve para os crimes que atentem contra a integridade física do presidente e vice-presidente da República. Quem atentar contra os presidentes da Câmara e Senado, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Procurador Geral da República (PGR) também estará sujeito a prisão por um período de 6 a 12 anos.
Já quem praticar atos contra a vida de autoridades poderá pegar de 20 a 40 anos de prisão. Se o crime for praticado por funcionário público, ele perderá a função ou mandato eletivo. Outro projeto que integra o plano de segurança permite a apreensão de bens e bloqueio de contas e ativos financeiros nos casos de crimes contra o Estado Democrático de Direito.
“O timing é péssimo”, afirma o diretor da consultoria Vector Research, Leonardo Barreto. “Acho que esse caso se parece mais com o PL das Fake News, isto é, com poder de mobilizar as redes sociais. A minha sensação é que o Congresso tenderia a não entrar nisso agora", diz o analista. E o governo também não deveria entrar nessa seara, considerando que tem uma pauta de aumento de impostos programada para o segundo semestre, segundo Barreto.
Ele acredita que o governo, ao lançar um pacote com diversos projetos que tratam de segurança, com aumento de penas para quem atentar contra autoridades, tenta aproveitar ‘essa janela’ criada no caso do Alexandre de Moraes”. O ministro do Supremo Tribunal Federal foi abordado por brasileiros no mês passado, no aeroporto de Roma, na Itália, aos gritos de "bandido, comunista e comprado", e o filho dele teria até levado um tapa na confusão.
“Esse pacote do Lula é algo que ele vinha anunciando desde que ganhou a eleição, faz parte da agenda que ele quer imprimir, mas não é algo que seja considerado prioritário, nem me pareça ter uma acolhida de uma boa parte do Congresso”, afirmou o analista político Adriano Cerqueira, do Ibmec de Belo Horizonte, à Gazeta do Povo.
Cerqueira acrescentou que considera difícil esse pacote passe no Congresso, "a menos que faça parte de um grande acordo, de acomodação de interesses”. Segundo ele, um dos problemas é que não se sabe qual a real a intenção do governo.
Ainda de acordo com o analista, durante o governo Lula será comum que o Executivo tente passar pelo crivo do Congresso medidas que eventualmente não tenham boa receptividade dos parlamentares. Diante disso, as que terão acordo para uma eventual aprovação serão em menor número.
Cristina Leal, do Movimento Olho no Congresso, diz que os movimentos vão trabalhar contra a aprovação dos projetos. A advogada Kátia Magalhães, do Instituto Liberal, também alerta para os perigos do pacote de segurança de Lula. “Onde estão os dispositivos que tragam maior celeridade para processos criminais nos casos de homicídio, narcotráfico, corrupção. Cadê o endurecimento de pena para esses crimes?”, questiona.
Os projetos foram enviados ao Congresso Nacional, e aguardam o início da tramitação, o que deve ocorrer agora, com a volta dos trabalhos do Legislativo.
Parlamentares criticam medidas de segurança de Lula
O vice-líder do PL na Câmara, deputado Alberto Fraga, disse à Gazeta do Povo que “o pacote anunciado por Lula pode ter vários nomes, menos "pacote da democracia". "Tem coisas absurdas, como por exemplo essa questão de você xingar o presidente ser considerado ato antidemocrático, com pena de até 40 anos”, disse o parlamentar. Para Fraga, essas são “mais medidas de vingança que de democracia”.
As críticas ao Plano de Ação na Segurança também vieram das redes sociais. O deputado Mendonça Filho (União-PE) afirmou que “a proposta fere o princípio de que todos são iguais perante a lei. Com viés autoritário, copia modelos admirados pelo PT mundo afora, como na Nicarágua e na Venezuela”.
Já Maurício Marcon (PL-RS) chamou o projeto de “PL da Ditadura”, e disse que que tem o objetivo de criminalizar as manifestações de rua contra o governo, ou seja, ‘implementar um Regime Ditatorial no Brasil através da lei”.
O senador Ciro Nogueira (PP-PI), ex-ministro de Bolsonaro, também questionou o plano de Lula nas redes. "A oposição fazer manifestação contra o governo, como sempre fez o PT a vida inteira, agora será crime”?
Além deles, senador Sergio Moro (União Brasil-PR) afirmou que “teremos que olhar com lupa esse PL do PT e evitar tipos abertos. Claro, repudiamos qualquer ataque violento ou moral a autoridades, mas o "diabo mora nos detalhes". Quem admira Maduro e Ortega não é guardião confiável da democracia”.
Também contrário ao pacote, o partido Novo protocolou dois requerimentos com o pedido para que o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), devolva os projetos ao governo, ou seja, que recuse iniciar a tramitação das medidas.
Plano de Segurança inclui decreto antiarmas e deputados reagem
A primeira reação ao pacote de segurança do governo veio num contra-ataque da oposição ainda durante o recesso parlamentar. Liderados pelo deputado Paulo Bilynkyj (PL-SP), 54 deputados assinaram um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) para derrubar o novo decreto antiarmas de Lula (11.615/23), que faz parte do Plano de Ação na Segurança.
O texto restringe a posse, o porte e a comercialização de armas, com novas regras para registro e mudanças nas normas para Caçadores, Atiradores e Colecionadores (CACs). Para Bilynskyj, que foi delegado da Polícia Civil, o decreto extrapola o poder regulamentar do Executivo e viola o Estatuto do Desarmamento.
Já o presidente da Comissão de Segurança Pública, deputado Ubiratan Sanderson (PL-RS), afirmou que é contra a determinação de que a responsabilidade pelo cadastramento e registro das armas seja feita pela Polícia Federal, e não mais pelo Exército, como determina a lei. Outro problema, na avaliação de Sanderson, é a questão dos calibres que voltaram a ser considerados de caráter restrito.
O presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), disse em entrevista ao Roda Viva, na última segunda-feira (31), que a questão dos calibres deverá ser discutida, devido à inclusão no decreto das armas de calibre 9 milímetros entre as de uso restrito.
Outros deputados de oposição ligados à Comissão de Segurança também apresentaram Projetos de Decreto Legislativo (PDLs) para anular o texto de Lula sobre armas, entre eles Ricardo Salles (PL-SP), Julia Zanatta (PL-SC) e Marcos Pollon (PL-MS).
No Senado, outros dois Projetos de Decreto Legislativo pretendem anular o decreto que restringe o registro, posse e porte de armas de fogo. Eles também se baseiam na tese de que o governo teria extrapolado a competência regulamentar do Poder Executivo.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) apresentou um dos projetos, que conta com apoio de outros dez parlamentares. Ele disse à Agência Senado que a Policia Federal pode sofrer um colapso no gerenciamento do sistema de registro de armas, e associou o texto a uma “agenda de desmonte do Brasil”.
O também senador Luiz Carlos Heinze (PP-RS) é autor de mais um PDL (190/2023), e afirmou que o texto do Executivo viola a Constituição Federal em vários pontos. Para ele, o decreto também afeta o treinamento de atletas que buscam classificação para os Jogos Olímpicos de Paris, e prejudica a indústria armamentista, que gera empregos e ajuda no crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.
Projeto transforma violência nas escolas em crime hediondo
Ainda como parte do Programa de Ação na Segurança, o governo apresentou a proposta que transforma em homicídio qualificado crimes praticados em escolas, com prisão de 12 a 30 anos. A medida foi sugerida pelas famílias vítimas do ataque à creche Cantinho Bom Pastor, em Blumenau (SC).
As medidas do governo na segurança também criam o Plano Amas - Amazônia: Segurança e Soberania, para desenvolver ações de segurança pública na Amazônia Legal, com medidas de enfrentamento aos crimes na região, especialmente crimes ambientais e conexos.
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