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O presidente Jair Bolsonaro estaria atualmente mais próximo do segundo turno das eleições de 2022 do que qualquer um de seus potenciais adversários, seja da centro-direita ou da esquerda. No que depender do monitoramento das redes sociais — que ajudaram na sua vitória no pleito de 2018 —, é esse cenário que se desenha para daqui a menos de dois anos, aponta a Quaest Consultoria & Pesquisa. Além de Bolsonaro, a empresa acompanhou o desempenho nas mídias de outros 12 atores de projeção nacional da política, incluindo o apresentador Luciano Huck.
O monitoramento feito pela Quaest, empresa especializada em análises e pesquisas de Big Data, atribui, desde março, uma pontuação diária que vai de 0 a 100 para 13 atores da política nacional, segundo o monitoramento em suas respectivas redes sociais que dá origem ao chamado Índice de Popularidade Digital (IPD). Durante todo o período analisado, Bolsonaro lidera com 79,1 pontos. Huck, cotado como pré-candidato, aparece na segunda posição, com 41,2 pontos.
O ex-presidente e condenado em segunda instância Luiz Inácio Lula da Silva, que tenta derrubar sua inelegibilidade na Justiça para concorrer pelo PT, figura em terceiro, com 35,6 pontos. A quarta posição é ocupada por Abraham Weintraub, diretor-executivo do Banco Mundial e ex-ministro da Educação, com 31,3 pontos. Tal como o ex-ministro, o monitoramento mapeia não apenas potenciais postulantes à Presidência da República.
Mas entre os eventuais adversários de Bolsonaro ainda despontam: o presidenciável do PDT, Ciro Gomes, com 23,9 pontos; Sérgio Moro, ex-ministro da Justiça e Segurança Pública, com 22,8 pontos; o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), com 20,8 pontos; e o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), com 16,8 pontos.
Confira o ranking completo abaixo:
O que o ranking sugere para 2022
O monitoramento de redes sociais é só uma ferramenta a mais para medir as potencialidades dos próximos presidenciáveis. Há muitas diferenças entre as performances de cada um dos possíveis candidatos. É o exemplo de Huck. “Hoje, o Luciano Huck, por exemplo, tem sua popularidade ancorada na televisão, e não no campo político. Vai ser desafio para todos os postulantes ao cargo chegar a níveis de embate com Bolsonaro nas redes sociais”, pondera Jonatas Varella, cientista político e analista de dados da Quaest.
O especialista, que é pesquisador do Centro de Estudos Legislativos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), avalia que, apesar de não ver Bolsonaro com uma vaga garantida desde já no segundo turno, é o favorito para ir no campo da direita. “Não cravaria que estaria lá neste momento, mas é favorito, como mostram as pesquisas, e as redes sociais trazem isso”, diz Varella. “Ele mantendo sua base engajada e ativa até 2022, chega forte para a disputa, uma vez que consegue propagar suas ideias e tem defensores de suas ações. E isso é muito forte”, acrescenta.
O IPD é formado por seis critérios distintos analisados pela Quaest: presença digital, fama, engajamento, mobilização, valência — que mensura a proporção de reações positivas por reações negativas — e interesse. À exceção de “fama”, que Bolsonaro aparece 0,2 ponto percentual atrás de Huck — por ser um apresentador de TV —, o presidente da República desponta em quase o dobro que seus adversários nos critérios de “engajamento”, “mobilização” e “interesse”.
Ou seja, apesar da desaceleração dos níveis de aprovação de Bolsonaro — a própria Quaest captou uma queda de 27% para 24% de pessoas que avaliam sua gestão como “ótimo” ou “bom” —, nas redes sociais, o presidente da República consegue se manter muito engajado por conta de seus apoiadores. E isso será um ativo em 2022. “Ele tem uma base populosa nas mídias muito alimentada por suas redes bolsonaristas, que mantêm o bolsonarismo sempre ativo”, explica Varella.
Inexperiência de adversários nas redes favorece Bolsonaro
Bolsonaro sabe tirar proveito das mídias, na avaliação de Varella. Ele parafraseia o diretor da Quaest, Felipe Nunes, e diz que o presidente usa uma estratégia de “stories de Instagram”. “A cada 24h, ele fala uma coisa para manter o engajamento ativo. Uma notícia dele vai durar um dia e, para continuar constantemente alimentando a sua base eleitoral, ele renova isso sempre”, explica.
Algo que Bolsonaro fala para sua militância no “cercadinho” do Palácio da Alvorada ou um comentário feito nas redes sociais gera mídia espontânea na imprensa, que, por sua vez, ajuda a reverberar e gerar engajamento nas redes. “Isso acaba inflando o Bolsonaro nas redes porque ele consegue sempre alguém para compartilhar ou retuitar uma notícia. Essas que o apoiam são as mesmas pessoas que o defendem e atacam seus adversários. Ele tem uma rede digital muito forte”, destaca Varella.
Enquanto Bolsonaro tem experiência e familiaridade com o uso das redes sociais para gerar engajamento político, o mesmo não pode ser dito de seus adversários, analisa Varella. “Hoje, eles não sabem como funciona. Bolsonaro sabe mais e melhor de como aproveitar as redes sociais”, pondera. A ineficácia no uso das redes, por sua vez, causa uma subutilização da base dos rivais. “Uma coisa leva a outra. A esquerda aprendeu a usar as redes sociais, mas também ainda está aquém de Bolsonaro”, avalia o analista da Quaest, citando como exemplo a campanha de Guilherme Boulos (PSOL) à prefeitura de São Paulo.
“Sem tempo de TV, com pouco recurso financeiro, conseguiu se destacar muito em uma campanha totalmente voltada para o público digital e chegou ao segundo turno, para a surpresa de alguns analistas”, explica Varella. Ele reconhece, contudo, que o exemplo de Boulos ainda é pouco para dizer que os rivais estão preparados para 2022. “É como se Bolsonaro estivesse em campanha todo dia, e isso o mantém ativo a todo momento. Os adversários estão começando a trabalhar suas redes, entender a importância das plataformas e como utilizá-las agora. Coisa que Bolsonaro sabe desde 2014, está nessa estratégia há cinco ou seis anos”, sustenta.
Redes sociais podem potencializar candidatos
As redes sociais são ferramentas que não devem ser menosprezadas para a construção de uma campanha a nível nacional. Para a disputa presidencial, isso é claramente fundamental. O cientista político Josué Medeiros, coordenador do Núcleo de Estudos Sobre a Democracia Brasileira (NUDEB) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), diz que as mídias podem, por exemplo, ajudar a “nacionalizar” a candidatura de Doria, que, para ele, é um presidenciável ainda muito associado a São Paulo.
O Índice de Popularidade Digital (IPD) de Doria, de 16,8 pontos, a segunda menor, é, por sinal, proporcional à sua intenção de votos segundo a mais recente pesquisa do Instituto Paraná Pesquisas, de 3,7%, também a segunda menor pelo cenário padrão, sem Lula na disputa. As redes podem contribuir a impulsionar alguém como o tucano ou uma candidatura de centro-esquerda como a de Ciro Gomes (PDT), que tem 10% das intenções de votos e 23,9 pontos no IPD. Bolsonaro lidera ambas, com 33,3% e 79,1 pontos, respectivamente.
A aposta nas redes sociais, reforça Medeiros, é a melhor estratégia para os candidatos viabilizarem uma candidatura em âmbito nacional para fazer frente a Bolsonaro. Para ele, elas foram o grande acerto da vitória do presidente da República em sua campanha, em 2018. “As mídias sociais não são só uma forma de comunicação. Hoje, é mais do que isso, é uma forma de relação social. Isso é algo que os partidos precisam dar atenção. Já deveriam ter aprendido isso com Bolsonaro”, analisa.
Para o professor da UFRJ, o presidente atingiu um apoio orgânico que vai além das fake news difundidas. “Esse dado de manipulação precisa ser levado em conta, mas é apenas um elemento”, diz. Mantidas as condições de temperatura e pressão atuais, ele aposta que Bolsonaro já está no segundo turno. “As redes sociais são um indicativo dessa condição que ele conquistou”, reconhece. Para Medeiros, somente uma chapa composta por nomes fortes da centro-direita e centro-esquerda nacionais poderiam fazer frente à do presidente. “Mas não acho viável, porque a visão de Estado e economia desses campos inviabilizam uma união”, justifica.
Eleito com 65.107 votos, em 2018, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) construiu sua campanha pelas redes sociais. Considerado um dos parlamentares mais influente nas mídias, ele alerta, contudo, que o sucesso está muito mais em como usá-las. “A internet vai ajudar a eleger de novo? Sim, mas vai eleger aqueles que as utilizarem para socializar e não apenas se comunicar com um grupo de pessoas, sejam elas de milhões ou milhares. Não se engane, impulsionamento, mídia comprada, espalhar informações na internet, polêmicas e brigas, isso não vai dar voto”, avalia.
O sucesso de Bolsonaro nas mídias, analisa Miranda, está justamente em utilizá-las como canais de socialização. “Os demais utilizam para comunicar suas ações, mas não estão conversando com o eleitor”, diz. A advertência vale, inclusive, para o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e para Doria. “O Doria, hoje, não faz da forma correta. Maia também usa como meio de comunicação. Vai lá e publica ‘tomei decisão tal’. Mas não fala: ‘e aí, galera, quero bater papo com vocês’. Ele comunica, mas isso não significa que conquistou aquelas pessoas. Sem se socializar com elas, estarão te assistindo assim como acompanham qualquer canal de TV e rádio”, sustenta.
Entenda a metodologia do IPD
O Índice de Popularidade Digital (PD) é uma ferramenta de inteligência artificial que avalia a popularidade de políticos na internet a partir de seis fontes de dados diferentes. Para cada personalidade analisada, a Quaest extrai 28 métricas diferentes de quatro redes sociais (Facebook, Instagram, Twitter e Youtube), dois buscadores (Google e sistema de buscas do Youtube) e de uma enciclopédia online (Wikipédia). A partir disso, essas métricas são posteriormente agregadas em seis “dimensões analíticas”:
- Presença digital: mensura o número de redes sociais ativas;
- Fama: mensura o público total nas redes sociais e sua capacidade de crescimento dela;
- Engajamento: mensura o volume de reações e comentários ponderados por número de postagem nas redes sociais;
- Mobilização: mensura o total de compartilhamentos de conteúdos nas redes sociais;
- Valência: mensura a proporção proporção de reações positivas por reações negativas no Facebook e Youtube;
- Interesse: mensura o volume de buscas por informação no Google, Youtube e Wikipedia.
A partir de um “modelo de aprendizado de máquina”, explica a Quaest, a empresa determina os pesos de cada métrica e de cada dimensão, de onde se calcula o IPD. Ao final, as personalidades são comparadas e posicionadas em uma escala de 0 a 100, onde 100 indica o máximo de popularidade no meio digital.