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De olho nas eleições de 2022, o PSD demonstra estar convicto de permanecer distante do governo federal. O presidente nacional do partido, Gilberto Kassab, mudou os rumos do alinhamento que a legenda tinha com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) desde que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) reconquistou sua elegibilidade política em vitórias no Supremo Tribunal Federal (STF).
Até abril deste ano, os sinais dados por Kassab indicavam que o partido permaneceria neutro e independente no processo eleitoral. Hoje, o PSD sugere que trilhará um caminho sem volta como a legenda que capitaneará a terceira via nas eleições do ano que vem. Há uma semana, Kassab afirmou a lideranças do diretório catarinense que vai filiar o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).
A intenção de Kassab de atrair Pacheco para o PSD não é recente, mas o timing político da afirmação a seus liderados é o que chama a atenção. A declaração foi dada a despeito dos esforços iniciados pelo ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira, em trazer o PSD de volta para a base do governo com vistas à disputa eleitoral de 2022.
O deputado Fábio Trad (PSD-MS), vice-líder do partido na Câmara, não aposta na possibilidade de o partido aderir à composição costurada por Nogueira para 2022. "Não creio que o PSD irá mudar a sua posição em relação ao governo Bolsonaro", avalia.
Por que o PSD se distanciou do governo
A recuperação dos direitos políticos de Lula em abril deste ano ligou o sinal amarelo para Kassab, mas esse não foi o único motivo do distanciamento com o governo. Coordenadores de campanha de pré-candidaturas a governos estaduais pelo PSD explicam que Kassab identificou a desidratação política de Bolsonaro e vislumbrou nisso uma oportunidade eleitoral.
"Se Bolsonaro tivesse mantido a popularidade em alta, estaria tudo bem. Mas o governo perdeu fôlego, Bolsonaro tensionou as relações e perdeu o rumo nessa pandemia. E o Kassab viu nesse cenário a chance perfeita para se posicionar", aponta um interlocutor.
Mesmo distante e disposto a lançar Rodrigo Pacheco à Presidência da República, Kassab não fecha totalmente as portas para um retorno formal à base política e eleitoral de Bolsonaro. Ele, Ciro Nogueira e outros dirigentes partidários mantêm conversas reservadas sobre os rumos de 2022.
Um dos principais motivos pelo qual um retorno do PSD não é impossível é o próprio alinhamento do partido com o governo no Congresso. Na prática, a legenda se descolou de Bolsonaro apenas eleitoralmente, não politicamente.
"Nós, o PSD, estamos na base. Votamos em 95%, 98% das vezes com o governo. Estamos alinhados com a agenda liberal", sustenta o deputado federal Darci de Matos (PSD-SC), vice-líder do partido e da maioria na Câmara. "Sempre tem alguém que fala [que a legenda não está mais na base], mas nós estamos alinhados com a agenda governista, vamos continuar e ponto", complementa.
Quais as chances de o PSD ingressar na base eleitoral do governo
O cenário mais provável hoje, até por indicações do próprio Gilberto Kassab, é de que o partido seguirá os rumos da terceira via em 2022. O presidente do PSD sabe que elevou o capital político de sua legenda e tem "munição" para disputar as eleições como o principal partido da terceira via, com Rodrigo Pacheco e pré-candidatos em 15 governos estaduais.
Entretanto, Kassab é um político experiente. Com o ministro Ciro Nogueira na Casa Civil articulando a base política e eleitoral de Bolsonaro, a possibilidade de o presidente da República estar no segundo turno e polarizar a eleição com Lula é maior, hoje, do que quando o PSD iniciou o processo de distanciamento.
Esse é um cálculo político feito por interlocutores do Palácio do Planalto, que acreditam nas chances de trazer Kassab integralmente para a base governista. A própria divisão interna no PSD é um indicativo disso. Alguns membros da legenda são favoráveis ao partido seguir o caminho da terceira via e outros defendem a composição com o governo, o PP, PL e Republicanos.
O deputado Fabio Trad confirma a divisão do partido, mas mantém a convicção e leitura política de que o PSD permanecerá nos trilhos atuais. "Até aqui, pelo que vejo, uma parte é governista e outra independente, a qual me filio. Eu entendo que caminhamos para um certo distanciamento do governo e não há motivos para mudar, afinal de contas, já foi anunciado pelo próprio presidente Gilberto Kassab a intenção de lançar uma candidatura própria", destaca o vice-líder.
Já o deputado Darci de Matos entende que muita coisa ainda pode acontecer e não descarta a possibilidade de o PSD compor com Bolsonaro em 2022. "A decisão de lançamento de uma candidatura de terceira via vai acontecer em junho ou julho do ano que vem. Parece que o Pacheco vem, mas será que vem? O projeto do Kassab é esse, mas agora, se uma semana na política é muito tempo, imagina um ano? O cenário político muda muito", analisa o vice-líder.
Matos lembra que Jair Bolsonaro vinha negociando uma filiação ao Patriota e, hoje, admite a possibilidade de se filiar ao PP. "Na eleição da Câmara também, por exemplo. Nós votamos o presidente [Arthur Lira] num dia e deixamos para votar a mesa [diretora] em outro, quando mudaram quatro cargos na Mesa", pondera.
O que o Planalto fará para trazer o PSD à base eleitoral de Bolsonaro
Quando se fala em trazer o PSD à base do governo e, consequentemente, eliminar um potencial candidato de Bolsonaro às eleições de 2022, o custo político não é "barato". Não à toa a oferta de recriar o antigo Ministério do Orçamento, Planejamento e Gestão (MPOG) para cedê-lo a Gilberto Kassab virou uma possibilidade real, discutida atualmente nos bastidores.
Só isso, entretanto, ainda não é o suficiente para convencer Kassab. O presidente do PSD tem deixado claro que aguarda o comprometimento de Bolsonaro com o pragmatismo político e que só entrega de cargos e emendas não o farão aderir completamente à base. A live do presidente da República nas redes sociais no último dia 29, por exemplo, em que ele apresentou suspeitas de fraude eleitoral já rejeitadas anteriormente, irritou Kassab.
"O que vimos hoje [dia 29] é extremamente grave. Não vou me calar. É um absurdo um presidente da República vir a público dizendo que tem uma denúncia e apresentá-la sem provas. Ele não tem provas. Fica claro para qualquer observador que ele quer confusão em 2022", criticou o presidente do PSD, em entrevista ao site O Antagonista.
O ministro Ciro Nogueira, da Casa Civil, é quem acaba atuando como "bombeiro" no debate do voto impresso auditável, em que Kassab é contra. Presidente nacional do PP, ele vai continuar buscando um entendimento com o PSD.
O deputado Fábio Trad admite que, com a entrada de Nogueira no governo, haverá mais espaço para articulações políticas. Mas ele reforça seu entendimento. "Penso que a postura correta do partido é manter-se independente, criticando quando necessário e reconhecendo acertos para ajudar o Brasil. Defendo a tese de que o PSD deve manter uma distância bem segura em relação ao atual governo", destaca.