Passado o primeiro semestre do governo Bolsonaro, as projeções de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do país, que estavam na casa dos 2,5% no início do ano, agora estão abaixo de 1%. Uma das principais condicionantes apontada pelo mercado financeiro para um crescimento superior a 2% em 2019 era a aprovação da reforma da Previdência. Mas, na semana seguinte à primeira vitória da proposta, aprovada em 1º turno na Câmara, o mercado financeiro estima um crescimento de apenas 0,81%, segundo o Boletim Focus, do Banco Central.
Otimismo exagerado, erro de diagnóstico, demora para aprovação da reforma, desidratação da proposta original, ausência de uma agenda efetiva pós-reforma e, até, a limitação dos gastos públicos estão entre os fatores apontados por economistas de diferentes correntes de pensamento para a redução nas projeções.
“Não foram nos últimos seis meses que o Brasil deixou de crescer o esperado. Foram nos últimos 35 anos”, afirma Marcos Mendes, economista e consultor legislativo do Senado, autor do livro “Por que o Brasil cresce pouco?”. Para ele, o país está passando por uma revisão de modelo econômico, que trará soluções no longo prazo.
“Existia um viés de otimismo muito grande, natural da mudança de governo, com a chegada de um novo presidente com popularidade e agenda definida. Mas veio um governo novo, com popularidade e força das urnas, numa situação muito grave. Não se muda um modelo de 40 anos em seis meses ou um ano. Ou vamos adiante fazendo a reforma e aguentando o custo no curto prazo para termos uma economia com capacidade de crescer 3% ou 4% lá na frente, ou voltamos para o modelo anterior que não gera crescimento, mas, no curto prazo, ao invés de crescer 0,5%, crescermos 1%, crescendo pendurado no Estado, com gasto público e regulação estatal”, afirma.
O economista e professor da Universidade Federal do Paraná Marcelo Curado acredita que houve um erro de avaliação do mercado no início do ano impulsionado pelo otimismo em relação ao novo governo. “Essa previsão de 2,5%, 3% foi excessivamente otimista. Foi um erro de previsão inicial, porque você vai percebendo que não adianta trocar apenas o governo ou começar a avançar em uma reforma da Previdência, só isso não basta para reativar a economia. O mercado fez uma leitura, na minha opinião, excessivamente otimista e agora está fazendo uma revisão. Uma revisão mais realista."
Impacto dos gastos públicos no PIB
Relatório do Bradesco, assinado pelo economista-chefe do banco, Fernando Honorato Barbosa, em junho, diz que parcela importante da frustração com o crescimento deve-se à redução dos gastos públicos, imposta pela Emenda Constitucional 95/2016, que estabeleceu teto para os gastos por 20 anos.
“Acreditávamos que quando a política fiscal revertesse sua trajetória de expansão, as quedas dos juros e do risco país mais do que compensariam a saída de cena do gasto público. Mas não é o que temos observado até o momento”, diz o relatório.
Mesmo assim, o relatório afirma que, com o déficit e dívida pública crescentes nos últimos anos, não faz sentido que a resposta seja mais gasto público. “O excesso de gastos nos últimos anos gerou má alocação de capital, dívida crescente e está por trás da recessão que vivemos, com a piora de risco e confiança”, acrescenta, indicando, apenas, que a resposta do PIB deverá ser mais lenta que o esperado por conta desse contingenciamento de gastos.
Já a doutora em economia desenvolvimentista Rosa Chieza, professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e diretora do Instituto Justiça Fiscal, coloca o teto dos gastos como principal causa do baixo crescimento. “Pesquisa do Ipea já mostrou que o efeito multiplicador do gasto público é muito maior em cenários de crise do que na ascensão econômica. É na crise que o Estado tem que aumentar o gasto e não reduzir como foi feito com a Emenda Constitucional 95. É por isso que a estimativa do PIB está cada vez menor. Ela vai perseguir e a crise vai aumentar”, diz.
Os outros dois economistas consultados pela reportagem discordam: “O teto de gastos é um avanço institucional, no ponto de vista de economia Brasileira. Já temos um nível de endividamento alto. A gente imaginar que a saída é puramente de gasto público é um equívoco que me parece muito grave. O governo anterior tentou isso também. Em 2013, 2014 tentou manter a economia mais ativa, especialmente em 14, através da expansão de gastos. Isso não deu certo”, lembra Marcelo Curado.
“Quem faz a economia crescer, é o setor privado. Mas demora até que esse modelo de crescimento pífio e oscilante baseado no crescimento do Estado seja substituído pelo crescimento a partir da expansão do setor privado. Porque precisa segurança jurídica para investir, da reforma da Previdência para sabermos o que será das finanças públicas nos próximos 10 anos, diminuindo expectativas pessimistas. Precisa abrir espaço para aumento de produtividade. Agenda de abertura econômica”, acrescenta Marcos Mendes.
A reforma passou, e como fica o PIB agora?
Aprovada a reforma da Previdência, os economistas apontam quais as próximas agendas para viabilizar o crescimento do PIB. “A reforma da Previdência é essencial. Sem ela é calote da dívida pública ou inflação acelerada. Mas ela vai fazer as coisas pararem de piorar", diz Mendes.
Para melhorar, ele diz que são necessárias várias outras agendas: "privatizar, reduzir a quantidade estatais, mudar o modelo de interferência de Estado na economia”. Ele defende também a criação de uma agenda que facilite o ambientes de negócios. “Facilitar importação e exportação, abertura e fechamento de empresas, muitas questões que estão sendo contempladas pela MP da liberdade econômica. Precisamos passar de um modelo de baixo crescimento promovido por um estado inchado para um modelo em que o protagonismo do crescimento seja do setor privado, num estado com as finanças sob controle. E num ambiente de competição."
Para Rosa Chieza, a reforma tributária, que já está em discussão no Congresso, terá mais impacto na economia que a reforma da Previdência. “Mas uma reforma que possa, efetivamente, aumentar a arrecadação, simplificando o sistema para aumentar a progressividade e priorize um aumento dos impostos diretos e redução dos indiretos, reduzindo o custo e aumentando a produtividade e competitividade das empresas."
Rosa diz, ainda, que a reforma tributária precisa mexer na demanda efetiva. "Se não geramos emprego, precisamos liberar a renda dos trabalhadores para que eles troquem o pagamento de tributos por consumo. Por isso precisa de uma reforma tributária que desonere os contribuintes de menor renda”, conclui.