Braga Netto e Jair Bolsonaro, durante o governo passado| Foto: Marcos Brandão/Agência Senado Federal
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A decisão do ministro Alexandre de Moraes de prender o general Walter Braga Netto indica que a Polícia Federal mantém ativa a investigação sobre a suposta tentativa de golpe, apesar ter apresentado em novembro o relatório final do inquérito. Ao mesmo tempo, acende um sinal de alerta para o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros investigados, ante a possibilidade de decretação mais prisões preventivas, ou medidas alternativas mais leves, caso a PF e Moraes enxerguem qualquer tentativa de prejudicar as investigações, ainda que no passado.

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Oficialmente, a investigação sobre o caso foi encerrada em 21 de novembro, quando a PF entregou a Moraes o relatório final do inquérito com o indiciamento de 37 pessoas, incluindo Bolsonaro, Braga Netto, militares e integrantes do governo passado.

Ainda assim, na ordem de prisão deste sábado, Moraes permitiu que a PF colhesse mais provas relacionadas ao caso, não só em poder de Braga Netto, mas também do coronel Flávio Botelho Peregrino, seu assessor no Partido Liberal.

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Na operação, os policiais puderam vasculhar residências, veículos, celulares, computadores, inclusive dados armazenados em “nuvem” (servidores na internet, onde possam estar e-mails, arquivos digitais, conversas de WhatsApp). Nos endereços físicos, os federais também foram autorizados a coletar documentos físicos, discos rígidos, dinheiro em espécie e armas.

Tudo será periciado e analisado e poderá acarretar novas operações. Remanesce com isso a possibilidade de complementações ao inquérito, cujo relatório final já está em poder da Procuradoria-Geral da República (PGR), a quem cabe formular denúncia sobre o caso. A prisão deste sábado demonstra também a disposição de Moraes de pegar supostas tentativas de atrapalhar as investigações – o que também configura crime, de obstrução de Justiça.

O alerta para Bolsonaro e outros investigados é a possibilidade de Moraes ver em seus atos recentes ou mais antigos qualquer pretensão de interferir na investigação, sobretudo sobre a delação de Mauro Cid. Até o momento, contudo, nada indica isso e o pedido da PF para prender Braga Netto não traz qualquer novidade sobre a conduta e as suspeitas contra Bolsonaro. Orientado por seus advogados, o ex-presidente tem seguido à risca restrições impostas por Moraes, como a proibição de manter contato com outros investigados.

Recentemente, a defesa pediu ao ministro que abrisse uma exceção, para que Bolsonaro pudesse comparecer ao velório e à missa de sétimo dia da mãe do presidente do PL, Valdemar da Costa Neto. O ministro autorizou, excepcionalmente, que eles tivessem contato nessas ocasiões, desde que não falassem sobre as investigações.

“Ressalte-se o caráter provisório da presente decisão, que não dispensa o requerente do cumprimento das demais medidas cautelares a ele impostas”, despachou Moraes – além de não ter contato com outros investigados, Bolsonaro e Valdemar estão proibidos, desde fevereiro, de viajar ao exterior, com passaportes apreendidos.

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A possibilidade de medidas adicionais serem decretadas é reforçada pelo fato de que várias das provas que levaram à prisão e busca e apreensão contra Braga Netto e Peregrino foram coletadas há mais tempo, muito antes do fim do inquérito.

O papel impresso encontrado sobre a mesa do assessor, com perguntas e respostas sobre a delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, por exemplo, foi apreendido em fevereiro deste ano. As conversas por WhatsApp de Braga Netto com o pai de Cid, que demonstrariam também que ele tentou saber detalhes da delação, foram descobertas pela PF em agosto de 2023.

Foram esses os principais elementos usados pela PF para pedir a prisão preventiva, baseada na suspeita de que Braga Netto teria tentado influenciar Mauro Cid a não delatá-lo – embora não haja, nos documentos apresentados, qualquer mensagem ou depoimento que ateste isso, apenas o interesse em saber mais sobre o teor da colaboração, que tramita em sigilo.

Também contribuiu para a prisão revelações mais recentes, colhidas em interrogatórios próximos ou posteriores ao encerramento da investigação, concluída oficialmente em 21 de novembro. Nesse mesmo dia, Mauro Cid contou que Braga Netto entregou dinheiro, numa sacola de vinho, para a operação de militares de Forças Especiais que, em 15 de dezembro de 2022, teriam seguido Moraes em Brasília com o suposto plano de prendê-lo ou matá-lo.

Em 6 de dezembro deste ano, o pai de Mauro Cid prestou novo depoimento à PF para responder sobre os contatos que teve com Braga Netto no ano passado. Ele disse que não se recordava de ter tratado da delação do filho, o que levou a PF a concluir que houve “interferência” de Braga Netto sobre a família, pela “hesitação” do pai em confirmar o contato.

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No pedido de prisão, os delegados Rafael Caldeira e Itawan Pereira registraram que o relatório final do inquérito do golpe já foi apresentado. Mas depois comunicaram a instauração de “novo procedimento apuratório”. “Nada obstante, considerando que ainda não foram identificados todos os integrantes do Núcleo Operacional para cumprimento de medidas coercitivas e diante do surgimento de evidências de atos para interferir/obstruir as investigações que tramitaram nos autos da Pet 12.100/DF, instaurou-se novo procedimento apuratório, conforme numeração epigrafada, para a realização de atos de polícia judiciária”.

Ao final, escreveram que a prisão e busca e apreensão sobre Braga Netto e Peregrino seria necessária para “aprofundamento e obtenção de novos dados, imprescindíveis para o avanço da apuração”. Foi aberta no STF uma nova “petição” – classe processual genérica, que comporta de pedidos comuns a investigações – que tramita em sigilo no gabinete de Moraes.

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, concordou. “O pedido da autoridade policial convence da imprescindibilidade da providência, em prol do avanço das investigações, que podem se beneficiar do achado de documentos, anotações, registros, mídias, aparelhos eletrônicos e demais dispositivos de armazenamento de dados reveladores de circunstâncias delituosas, da eventual participação de outros agentes, propiciando uma mais completa compreensão de condutas relevantes”, escreveu em parecer.

No comando de toda a investigação, Moraes assentiu. “A autoridade policial em face de novos elementos verificou a existência de provas de atos realizados para obstruir as investigações”, escreveu o ministro no início da decisão. “Os desdobramentos da investigação, notadamente a realização da denominada operação ‘Contragolpe’ e os novos depoimentos do colaborador MAURO CÉSAR BARBOSA CID, revelaram a gravíssima participação de WALTER SOUZA BRAGA NETTO nos fatos investigados, em verdadeiro papel de liderança, organização e financiamento, além de demonstrar relevantes indícios de que o representado atuou, reiteradamente, para embaraçar as investigações”, assinalou no final.