A quarta-feira (20) foi um dia de boas notícias para quem espera mudanças na legislação que garantam a prisão em segunda instância. A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou uma proposta de emenda à Constituição (PEC) sobre o assunto. E no Senado, mesmo com a CCJ local adiando a votação para a semana que vem, os parlamentares construíram um acordo para o avanço de um projeto sobre o mesmo tema que tem angariado a simpatia de mais congressistas.
A chave para o avanço na Câmara e no Senado é o fato de as propostas em deliberação não mais definirem alterações no artigo 5º da Constituição. O artigo é o que fala dos direitos fundamentais dos cidadãos e, para juristas, não pode ser modificado – ou seja, ainda que o Congresso aprovasse uma alteração, a decisão do Parlamento tenderia a ser derrubada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
A proposta da Câmara, então, enfocou os artigos 102 e 105 da Constituição, que falam das atribuições do STF e do Superior Tribunal de Justiça (STJ). A PEC cria a figura das ações revisionais; com isso, a interpretação jurídica passa a ser a de que o trânsito em julgado já seria alcançado após a segunda instância.
No Senado, a proposição que pode ser votada na semana que vem não aborda a Constituição – a modificação sugerida é no Código de Processo Penal (CPP), que passaria a prever a possibilidade de prisão dos condenados após a segunda instância. A autoria é do senador Lasier Martins (Podemos-RS).
No início da tarde desta quarta, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse esperar que o Parlamento encontre a decisão com a maior “segurança jurídica”. “Qualquer solução vai judicializar, vão ser mais um ou dois anos com a mesma polêmica, então, é melhor uma solução definitiva. O que tiver mais segurança jurídica vai prevalecer”, declarou.
Senado muda acordos e convida Moro para semana que vem
Entre menos de 24 horas, os senadores fizeram e derrubaram acordos acerca dos projetos sobre a prisão em segunda instância. Um dos acertos havia sido firmado com o ministro da Justiça e Segurança, Sergio Moro, para garantir a votação ainda na quarta. No fim, prevaleceu outra combinação – a de que um pedido de vista coletiva interromperia a sessão e deixaria as definições para a próxima semana.
A CCJ do Senado, presidida por Simone Tebet (MDB-MS), agendou uma audiência pública sobre o assunto para terça-feira (26) – que terá Moro entre os participantes – e a expectativa é de que a proposta seja votada pelos parlamentares no dia seguinte, tanto na CCJ quanto no próprio plenário da casa.
“Precisamos de um processo que, em um prazo razoável, absolva os inocentes e faça com que os culpados sejam punidos”, disse Moro, em entrevista coletiva nesta quarta. Ele relembrou que a prisão em segunda instância fazia parte de seu pacote anticrime, apresentado por ele ao Congresso ainda no início do ano, e que permanece em tramitação.
O acordo definitivo fechado pelos senadores fez com que uma PEC que modificava o artigo 5º, elaborada por Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), fosse retirada da pauta da CCJ. O foco é mesmo o de centrar esforços na proposição que muda o CPP.
Câmara tem votação mais tranquila do que o esperado e otimismo para continuidade
A Câmara também registrou modificações ao longo da noite da terça. Foi nesse período que o autor da PEC original, Alex Manente (Cidadania-SP), redigiu seu novo texto – sem abordar o artigo 5º – e a relatora Caroline de Toni (PSL-SC) finalizou seu parecer sobre a proposta.
A nova PEC de Manente foi pautada pelo presidente da CCJ, Felipe Francischini (PSL-PR), e a votação transcorreu de forma mais tranquila do que o esperado. Não apenas pelo placar da votação, com 50 manifestações a favor e apenas 12 contrárias, mas também pelo andamento dos trabalhos. O processo foi concluído por volta de 16h45, o que surpreendeu Manente: “esperávamos concluir a votação no fim da noite, e no meio da tarde já votamos”.
A proposição acabou elogiada até mesmo por integrantes da oposição ao governo de Jair Bolsonaro. O deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS) foi um dos que celebrou a redação de Manente. E Aliel Machado (PSB-PR), vice-líder da oposição, disse que liberaria a bancada para votar de acordo com as convicções particulares. Ao final, apenas quatro partidos formalizaram contrariedade à proposta: PT, Psol, Pros e PCdoB.
O discurso que acabou prevalecendo entre os deputados foi o da vitória do diálogo. “Havia resistência dos partidos em aprovar a admissibilidade da proposta que modificava o artigo 5º. Então cedi em minha posição, favorável à alteração, para compor. Conseguimos então vencer essa nova discussão e obtivemos um resultado estrondoso na CCJ”, afirmou Caroline de Toni.
A deputada ressaltou que a proposta pode contribuir para a redução da impunidade e negou as acusações de que a iniciativa tenha cunho casuísta, por causa da recente libertação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). “Casuística foi a mudança recente do STF para modificar o seu entendimento anterior”, afirmou ela.
Próximos passos da prisão em segunda instância
Enquanto no Senado a proposta já pode ter sua tramitação encerrada na próxima semana, na Câmara o processo será mais longo.
Após a aprovação pela CCJ, o projeto será apreciado por uma comissão especial, que será constituída pelo presidente Rodrigo Maia. Lá, terá que cumprir um rito que prevê um número elevado de sessões, se não houver acordo dos parlamentares em sentido contrário. “Estamos contando com a boa vontade do presidente Rodrigo Maia”, declarou Alex Manente.
O presidente da CCJ, Felipe Francischini, reiterou que o próximo passo depende de um ato unilateral de Maia, mas destacou otimismo em torno do projeto. Ele relembrou que a proposta aprovada na quarta teve mais votos na CCJ do que a reforma da Previdência, que acabou sendo aprovada com tranquilidade no plenário. “O clima é favorável demais para a aprovação da PEC”, celebrou.
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