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O presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes. Foto: Alan Santos/PR
Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes: privatização de estatais ineficientes é uma promessa de campanha. Foto: Alan Santos/PR| Foto:

Passados 100 dias de gestão Bolsonaro, a agenda de privatizações – uma promessa de campanha – ainda não deslanchou e só deve ser colocada em prática após a reforma da Previdência. Isso se forem superadas as divergências internas.

O governo acumula até aqui alguns recuos, como a desistência de privatizar a EBC (conglomerado de mídia) e a EPL (estatal do trem-bala), pois enfrenta a resistência de ministros militares em vender suas estatais. A privatização da Eletrobras, uma das mais aguardadas pelo mercado, deve ficar para 2020 e somente algumas empresas dependentes do Tesouro devem ser fechadas neste ano, como a Valec, a estatal de ferrovias.

A meta inicial do governo era levantar US$ 20 bilhões com privatizações neste primeiro ano de gestão. Esse valor, segundo o secretário especial de Desestatizações e Investimentos do governo, Salim Mattar, deve ser superado em ao menos 50%.

Mas a conta inclui a receita obtida com venda das subsidiárias das estatais – este, sim, um processo mais avançado, principalmente por causa da Petrobras, que já comanda um programa de venda de ativos desde 2016 (leia mais no fim da matéria). O valor arrecadado com a venda das subsidiárias, porém, fica com as estatais-mães e não vai diretamente para o caixa do Tesouro para abater a dívida pública.

Governo não divulgou lista de privatizações

Se forem consideradas somente as estatais sob comando direto do Poder Executivo, o processo está emperrado. O Conselho do Programa de Parcerias e Investimentos (PPI), que define os ativos que serão privatizados e concedidos à iniciativa privada, ainda não se reuniu neste ano. Inicialmente, a reunião estava prevista para acontecer no fim de fevereiro, mas vem sucessivamente sendo adiada, sem explicações.

Sem o aval do PPI, que inclui os ativos no Plano Nacional de Desestatização, nenhuma estatal pode ser vendida ou fechada.

Ministério da Economia promete privatizar suas três estatais

Enquanto a lista de privatizações não sai, alguns ministérios já vão divulgando o que pretendem fazer com suas estatais. O Ministério da Economia, comandado por Paulo Guedes, é o mais favorável à agenda. A pasta é responsável por três estatais – Casa da Moeda, Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) e Dataprev – e todas elas serão privatizadas.

A Serpro, de processamento de dados, e a Dataprev, base de dados do INSS, estão passando por um processo de reestruturação para serem vendidas a um melhor preço ao longo do governo Bolsonaro. Já a Casa da Moeda, que fabrica papel-moeda, deve ser privatizada neste ano. O governo Michel Temer já havia tentado vender a estatal, mas não conseguiu levar a agenda adiante.

Estatal das ferrovias será fechada

Uma estatal que será fechada (liquidada, no termo técnico) é a Valec. Criada para construir e administrar ferrovias, a companhia pertence ao Ministério da Infraestrutura e os estudos para liquidação da estatal já estão em andamento.

Ela teve prejuízo de R$ 1,044 bilhão em 2017 e desde a sua criação depende de aportes do Tesouro (dinheiro público) para funcionar, já que é incapaz de gerar receita para manter sua operação e fazer investimentos.

A companhia também esteve envolvida em escândalos de corrupção. Suas atividades, após a liquidação, serão transferidas para o Dnit, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes.

Recuos: EPL e EBC não serão privatizados

O governo acumula recuos importantes na agenda de privatizações. Durante a campanha, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que cerca de 50 estatais criadas durante os governos petistas seriam extintas ou vendidas. Isso incluía a EBC, o conglomerado de mídia, e a EPL, criada inicialmente para tirar do papel o projeto do trem bala.

As duas estatais não serão mais privatizadas. A EBC, que pertence à Secretaria de Governo, comandada pelo general Santos Cruz, está passando por um processo de reestruturação e será mantida no governo Bolsonaro. A reestruturação inclui um novo plano de demissão voluntária, junção de algumas atividades (como as emissoras NBR e TV Brasil, que serão uma só) e transferência de funcionários para outros órgãos do Executivo.

Já a EPL pertence ao Ministério de Infraestrutura, do engenheiro e capitão reformado do Exército Tarcísio Gomes de Freitas. A ideia da pasta foi manter a estatal para que ela ajude na modelagem e nos estudos dos projetos de concessão de infraestrutura do ministério.

Das joias da coroa, somente Eletrobras deve ser privatizada – e em 2020

Entre as estatais consideradas “joias da coroa”, ou seja, as principais e com maior probabilidade de render bastante dinheiro com a venda, somente a Eletrobras deve ser privatizada. Mas o Ministério de Minas e Energia (MME), do almirante Bento Albuquerque, ainda está discutindo a melhor modelagem para a venda de ações da companhia e para o projeto de lei que vai permitir à empresa operar suas hidrelétricas a preço de mercado.

Como o projeto ainda deve ser encaminhado ao Congresso até o meio do ano, o MME diz que o processo de venda de ações da companhia só deve ser concluído em 2020, já que não haverá tempo hábil para fazer ainda este ano.

O governo Temer esperava arrecadar R$ 12 bilhões com a venda da Eletrobras, mas não conseguiu nem sequer ter o projeto que previa a privatização da companhia aprovado no Congresso diante da crise política.

Correios, Petrobras e bancos públicos ficam de fora

Já as demais joias da coroa – Correios, Petrobras, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil – não serão privatizadas. O ministro da Economia, Paulo Guedes, e o secretário especial de Desestatizações, Salim Mattar, afirmam que, por eles, se vendia tudo. Mas o presidente Bolsonaro não deu aval para isso.

Havia expectativa de que pelo menos os Correios fossem privatizados, já que a estatal teve prejuízo em três (2014, 2015 e 2016) dos últimos quatro anos com dados disponíveis e corre o risco de entrar para o time das estatais dependentes de recursos da União. Mas a companhia está sob o guarda-chuva do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), do astronauta e tenente-coronel da Força Aérea Marcos Pontes, e não será privatizada no governo Bolsonaro.

MCTIC tem seis estatais e não quer privatizar nenhuma

O MCTIC, inclusive, é responsável por seis estatais, mas não quer privatizar nenhuma, segundo Salim Mattar. São elas: Correios; Ceitec, que produz chips, conhecida como a estatal do chip do boi; Telebras, de telecomunicações; INB, indústria de fornecimento do combustível nuclear para geração de energia elétrica; Nuclebrás Equipamentos Pesados, que produz equipamentos para usinas nucleares; e Finep, de fomento à ciência e tecnologia.

A Ceitec, a INB e o Nuclep são estatais dependentes do Tesouro. Em 2017, a União aportou R$ 1,379 bilhão nessas empresas para que elas pudessem funcionar.

Por que a agenda de privatizações não deslancha?

A agenda de privatizações não deslanchou até aqui por dois principais motivos: reforma da Previdência e resistências internas. A equipe econômica está focada em aprovar a reforma neste primeiro semestre e não quer impor uma outra agenda impopular neste momento.

Mattar disse em entrevista à revista Veja publicada no primeiro fim de semana de abril que a agenda de privatizações será tratada com mais intensidade depois da reforma da Previdência. Até lá, a equipe econômica vai esperar para “contrariar qualquer grupo de interesse” dentro do governo contrário à agenda.

As resistências internas, porém, são muitas. Os principais recuos até agora são justamente sobre estatais comandadas por ministérios que têm ministros militares, historicamente favoráveis à estatização.

Em evento em Brasília em fevereiro, Mattar já falava da dificuldade de convencer parte do governo da necessidade de diminuir o tamanho do estado. “Aquelas (estatais) que estão em outros ministérios, por exemplo, Correios, EPL, a decisão de privatizar essas empresas é do ministro”, afirmou na época. “Sei que eu tenho uma grande batalha pela frente”, completou.

Mattar foi escolhido por Paulo Guedes para comandar a agenda de privatizações. Só que a decisão de vender ou fechar uma estatal não depende somente da vontade do Ministério da Economia e de sua Secretaria de Desestatizações. É preciso necessariamente o aval do ministério responsável pela estatal, o que está travando o processo.

O secretário não desanima. À Veja, apesar de ter confessado estar “frustado”, afirmou que ainda tem três anos e meio de governo e que a privatização vai começar lenta e gradual, mas depois vai pegar velocidade. “Vamos privatizar mais no terceiro ano do que segundo e mais no segundo do que no primeiro ano de governo”, afirmou Mattar.

Enquanto isso, resta vender as subsidiárias

Enquanto não deslancha a venda das estatais ligadas diretamente ao Executivo, o governo segue incentivando a venda de subsidiárias, até para alcançar a meta de US$ 20 bilhões em 2019. A venda mais recente foi feita pela Petrobras, que vendeu sua transportadora de gás (TAG) por US$ 8,5 bilhões ao grupo francês Engie e ao fundo de investimento canadense Caisse.

A Petrobras tem um plano de desinvestimento desde 2016, quando Pedro Parente assumiu a companhia. Só que o processo de venda de subsidiárias ficou travado devido a uma liminar do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski, revertida neste ano pela Advocacia-Geral da União (AGU). Agora, com Roberto Castello Branco no comando da estatal, o programa deve ser intensificado, inclusive com a venda de refinarias.

Já o Banco do Brasil e a Caixa devem dar início neste ano ao plano de abrir capital de algumas das suas subsidiárias.

A decisão de vender uma subsidiária é da estatal mãe. E o ministro Paulo Guedes conseguiu colocar no comando das estatais com mais subsidiárias economistas liberais, favoráveis à privatização. São eles: Roberto Castello Branco (Petrobras), Pedro Guimarães (Caixa) e Rubem Novaes (BB).

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