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Os projetos em tramitação no Senado Federal considerados pautas-bomba para os bancos tiveram a votação adiada por tempo indeterminado. Os autores e relatores tentam pautar os textos para votação desde o início do mês, mas enfrentam a oposição liderada pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban), que vê as propostas como uma ameaça à estabilidade do sistema financeiro.
Os três principais projetos em tramitação Senado envolvendo instituições financeiras tentam suspender o pagamento dos créditos consignados, limitar os juros que podem ser cobrados no cheque especial e no cartão de crédito e elevar do imposto que é cobrado sobre o lucro dos bancos.
Segundo a Febraban, os projetos podem reduzir a oferta de crédito e acabar, no fim, prejudicando o consumidor. Já os autores dos textos alegam que os bancos têm de dar sua contribuição em meio à pandemia.
Até aqui, a federação vem tendo sucesso nas suas argumentações e os textos não foram pautados para votação neste mês de maio, apesar das diversas tentativas de senadores. Um exemplo é o projeto que limita a taxa de juros que pode ser cobrada do cheque especial e do cartão de crédito durante a pandemia.
A sessão para votar o projeto foi marcada para o dia 14 de maio, mas cancelada em cima da hora. O presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), informou aos senadores que precisava visitar a sua mãe no hospital e, por isso, não teria sessão. Depois, a presidência do Senado disse aos jornalistas que o adiamento da votação se deu porque “os senadores entenderam que havia necessidade de mais tempo para discussão dos projetos na pauta.”
Tanto o projeto que limita a taxa de juros quanto os textos sobre o consignado e o imposto sobre o lucro voltaram a ser tratados na reunião de líderes do Senado da semana passada e no encontro realizado nesta segunda-feira (25). Em ambas, não houve acordo para pautar as propostas para votação.
Os senadores Alvaro Dias (Podemos-PR) e Lasier Martins (Podemos-RS) relataram à Gazeta do Povo que há uma pressão dos bancos sobre alguns senadores para que os projetos sejam arquivados.
Confira quais são os três projetos do Senado considerados “pautas-bomba” pelos bancos e os argumentos a favor e contra cada um:
PL 1.166/2020 - Limita juros no cartão de crédito e cheque especial
O projeto de lei (PL) 1.166/2020 limita a 30% ao ano a taxa de juros do cartão de crédito e do cheque especial, com exceção das linhas das chamadas fintechs, com limite de 35% ao ano. Outra exceção seria para pessoas cuja renda seja inferior a dois salários mínimos. Elas teriam direito a pagar no cheque especial juros iguais aos do consignado, que está em 21% ao ano. O teto valeria somente durante o estado de calamidade pública.
O texto estabelece, ainda, que os limites de crédito disponíveis em 19 de março de 2020 não poderão ser reduzidos até o fim do estado de calamidade pública e que os créditos do cheque especial e do cartão de crédito estarão isentos do pagamento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
Os bancos veem o projeto como uma “pauta-bomba”, pois entendem que se trata de um tabelamento de preços que pode levar à redução do crédito e à falência de fintechs. Eles também alegam que o teto vai afetar a competição e o consumo, diminuir a oferta de crédito, prejudicar os varejistas e afetar a própria recuperação da economia.
“A experiência econômica e a história nos ensinam que, cedo ou tarde, a imposição de limites de preços para determinados produtos tem como consequência a redução ou interrupção de sua oferta, o desabastecimento e o estímulo aos mercados informais ou paralelos”, diz a nota técnica da Febraban.
O senador Alvaro Dias (Podemos-PR), autor do projeto, afirma que não há argumentos consistentes contra a ideia. “Quando todos são obrigados ao sacrifício, os bancos não querem reduzir a margem de lucro. Não se trata se submeter os bancos ao prejuízo, trata-se de reduzir a taxa do cheque especial e do cartão de crédito”, disse, lembrando que a redução só será válida durante a pandemia.
Hoje, a taxa média de juros do cheque especial está em 130% ao ano, segundo dados do Banco Central. Para quem cai no rotativo do cartão de crédito, o custo médio é de 326,4% ao ano, enquanto os juros do parcelamento das compras no cartão chegam a 186,5% ao ano.
O texto recebeu parecer favorável do relator, senador Lasier Martins (Podemos-RS).
PL 1328/2020 - Suspende pagamento dos consignados
O projeto de lei (PL) 1.328/2020 altera a lei dos empréstimos consignados (feitos com desconto direto na folha de pagamento). Ele suspende os pagamentos de dívidas descontadas de benefícios previdenciários, ou seja, de quem recebe aposentadoria ou outro benefício do INSS.
Essas pessoas ficariam isentas de pagar até quatro parcelas de seus empréstimos, enquanto vigorar o estado de calamidade pública decretado em virtude do coronavírus. Também não seriam cobradas multas, taxas, juros ou demais encargos, e as pessoas não poderiam ser consideradas inadimplentes.
Só não teriam direito à suspensão aposentados e outros beneficiários do INSS que estejam inadimplentes há mais de 180 dias.
O senador Otto Alencar (PSB-BA) é o autor do projeto. Ele diz que “trata-se de medida emergencial e de caráter limitado, de modo a amenizar o peso das parcelas desse empréstimo nos orçamentos das famílias, válido unicamente durante o período da crise”.
Ele lembra que a Caixa Econômica Federal possibilitou recentemente a suspensão dos pagamentos de dívidas de empréstimos pessoais e ampliou a carência na tomada de empréstimos por empresas. “Portanto, é razoável entender que, se estamos possibilitando pausas para outras modalidades de financiamento, também é emergencial suspensão equivalente para os aposentados, nos créditos consignados”, diz o senador.
A Febraban é contra o texto. A federação afirma que suspender o pagamento das parcelas pode gerar redução na oferta de crédito barato e massificado para pessoas físicas, afetando milhares de famílias. “São 30 milhões de beneficiários do INSS e afeta o fluxo financeiro de bancos especializados, reduzindo a concorrência e elevando os custos para o consumidor”, disse a entidade em nota enviada à Gazeta do Povo.
A federação lembra, ainda, que a taxa média de juros do consignado é de 21% ao ano, uma das mais baixas entre todas as modalidades de crédito à pessoa física, e que os aposentados e servidores públicos não tiveram redução salarial em meio à pandemia. “Aposentados e servidores públicos foram os setores menos afetados pela crise econômica até o momento, pois não tiveram redução de salário.”
PL 911/2020 - Eleva a alíquota da CSLL dos bancos
O projeto de lei (PL) 911/2020 aumenta um imposto que é cobrado dos bancos. O projeto eleva para 50% a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) que é cobrada das instituições financeiras, seguradoras e empresas de capitalização.
Atualmente, a alíquota é de 20%. Essa taxa está em vigor desde 1º de março. Antes, era de 15%. Ela foi elevada durante a tramitação da reforma da Previdência, como forma de os parlamentares compensarem as desidratações no texto que mudou as regras da aposentadoria.
O senador Weverton (PDT-MA) diz que os bancos têm tido lucros bilionários nos últimos anos, mas mesmo assim vão pagar somente 20% de alíquota de CSLL, enquanto a pessoa física que ganha até R$ 55.976,16 mensais paga uma alíquota máxima de 27,5% de Imposto de Renda.
“Não podemos aprofundar as desigualdades sociais diminuindo salários dos trabalhadores da iniciativa privada, domésticas, servidores públicos federais e estaduais e não aumentarmos a contribuição dos banqueiros que ganham e ganharam ao longo dos anos lucros exorbitantes”, escreve.
“Nesse momento em que todos devem contribuir para o enfrentamento dessa crise devido sobretudo à pandemia causada pelo coronavírus, o setor bancário precisa dar a sua contribuição diminuindo seus lucros, por isso, aumentar a contribuição sobre o lucro líquido das pessoas jurídicas jurídicas de seguros privados e de capitalização, é a saída mais justa e equitativa nesse momento”, conclui nas justificativas do seu projeto.
Os bancos, por sua vez, entendem que aumentar a CSLL para 50% configura uma espécie de “confisco” do lucro, o que tende a reduzir a oferta de crédito, aumentar a concentração do setor e elevar os custos para o consumidor.
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