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Após o ato pró-Bolsonaro na Avenida Paulista, no domingo (25), diversos projetos de lei que preveem anistia aos presos nas manifestações de 8 de janeiro de 2023 podem conseguir apoio para avançar tanto na Câmara quanto no Senado. Isso porque a defesa da anistia foi um dos pontos mais importantes do discurso de pacificação do ex-presidente, que mostrou força política ao levar centenas de milhares de pessoas para a manifestação.
Parlamentares ouvidos pela Gazeta do Povo disseram acreditar que a anistia será possível principalmente se deputados e senadores que hoje votam com o governo, mas são de partidos mais à direita e de centro, o denominado Centrão, aderirem a essas pautas. Muitos deles podem abraçar o projeto para tirar proveito posterior do capital político de Bolsonaro.
Vice-líder da oposição na Câmara dos Deputados, Maurício Marcon (Pode-RS) é taxativo ao afirmar que o apoio das centenas de milhares de pessoas que lotaram a Paulista para ouvir o ex-presidente pode convencer os parlamentares do centrão a defender pautas de interesse da direita, como a anistia, que foi citada por Bolsonaro.
"O centro, que gosta de ficar nas sombras e [ontem] ficou exposto, pode começar a criar vergonha e ajudar a libertar os inocentes que estão presos", afirmou Marcon. Na opinião do deputado, o Centrão pode se ver obrigado a voltar o olhar para o eleitor mais conservador, que está de olho na cena política, e vai cobrar isso dos parlamentares que ajudou a eleger.
Pelo menos 6 projetos de lei sobre anistia tramitam no Congresso
Na Câmara dos Deputados, pelo menos 5 projetos que tratam de anistia aos presos durante os atos de 8 de janeiro do ano passado foram apensados a um outro já existente, de autoria do ex-líder do governo Bolsonaro, Major Vitor Hugo (PL-GO), que prevê anistia a quem tenha participado de manifestações em qualquer local do país, de 30 de outubro de 2022 até o dia da entrada em vigor da lei. Mas os projetos foram agrupados e agora têm como relatora a deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP), que já se manifestou e defendeu a inconstitucionalidade das propostas na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). A votação ainda não ocorreu.
Logo após a fala de Jair Bolsonaro, que afirmou no domingo buscar a pacificação e "passar uma borracha no passado", a deputada fez postagens nas redes sociais criticando o perdão.
"Sou relatora na CCJ da Câmara do projeto apresentado pela extrema direita que pretendia perdoar Bolsonaro e seus comparsas pela tentativa de golpe. O relatório que apresentei rejeita essa tentativa ridícula de impedir que os terroristas do 8 de janeiro, seus mentores e financiadores paguem por seus crimes. Especialmente Bolsonaro, os generais e parlamentares envolvidos", afirmou a deputada no X (antigo Twitter).
Segundo afirmou Samia na publicação, "não há borracha que apague a tentativa de golpe de Estado e outros crimes". Para a deputada, o que se deseja é que os participantes "respondam pelos seus atos de acordo com a lei".
Para o deputado Cabo Gilberto Silva (PL-PB), autor de uma das propostas que busca anistiar os presos que não tiveram participação comprovada nos atos, aprovar a anistia é fazer justiça, já que muitos não tiveram sequer um mandado de prisão, além de muitos julgamentos não terem respeitado o devido processo legal. "Pessoas foram presas e estão pegando 17 anos de cadeia, estão pagando sem dever", pontuou o deputado, que disse que não defende quem depredou o patrimônio público.
Mas o deputado nega a alegação do PT de que a proposta beneficiaria o próprio ex-presidente Jair Bolsonaro. Integrantes de partidos de esquerda afirmam que o ex-presidente está defendendo a anistia "legislando em causa própria".
Mesmo com um relatório desfavorável da deputada petista, a anistia ainda pode ser aprovada se obtiver maioria na Câmara.
Mourão vem defendendo no Senado a anistia a presos do 8 de janeiro
No Senado Federal, o ex-vice presidente, general Hamilton Mourão (Republicanos - RS), também apresentou um projeto propondo o perdão aos manifestantes presos no 8 de janeiro pelos crimes de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. O texto está hoje na Comissão de Defesa da Democracia, e é relatado pelo senador petista Humberto Costa (PE), que ainda não se manifestou sobre o tema.
Parlamentares próximos ao senador, no entanto, avaliam que a tendência, assim como na Câmara, é de que o relatório não seja favorável à proposta, e também neste caso a alternativa seria aprovar o projeto por maioria de votos dos parlamentares. Ao jornal Valor, o senador disse que está "batalhando" para a proposta avançar. Caso não seja possível, a alternativa seria apostar numa proposta de emenda à Constituição apresentada pelo senador Márcio Bittar (União-AC), e que tramita na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.
A PEC busca anistiar os acusados e condenados pelas manifestações de 8 de janeiro, em Brasília, e o ex-presidente Jair Bolsonaro, que foi declarado inelegível por abuso de poder político, uso indevido dos meios de comunicação e conduta vedada a autoridades nas eleições.
Para advogados, propostas de anistia podem até prosperar, mas vão esbarrar no STF
Na opinião do advogado Fernando Neisser, da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), crimes graves contra o Estado Democrático de Direito não devem conseguir a anistia do Congresso, mas se aprovada lei neste sentido, ela certamente deverá ser vetada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Mesmo que o veto seja derrubado, como tem ocorrido em outras matérias aprovadas, "é de antever que o STF reconheceria a sua inconstitucionalidade. O regime jurídico atual não é aquele que existia à época da Lei da Anistia que sucedeu a ditadura militar. Desse modo, apenas pessoas condenadas por crimes mais leves, como dano ao patrimônio público, poderiam em tese ser beneficiadas", explicou o advogado.
Para o advogado criminalista Henrique Attuch, do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), em alguns casos de projetos de lei que preveem a anistia a qualquer pessoa que seja alvo de condenação ou processo em razão do que ocorreu na Praça dos Três Poderes, mesmo sem ter pisado em Brasília, o ex-presidente pode ser ajudado. "Bolsonaro poderia ser beneficiado sim pelos projetos em questão, mesmo que ele seja investigado na qualidade de mandante ou instigador dos atentados", pontuou.
Mas apesar disso, o advogado não acredita que hoje esses projetos tenham força suficiente. "Ocorre que o obstáculo político é gigantesco, dado o grau de indisposição que a aprovação dos projetos poderia gerar com o Supremo Tribunal Federal (STF), sem contar com o fato de que, de acordo com a Constituição, a anistia, mesmo que aprovada, dependeria de sanção presidencial", lembrou.