O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) julga nesta terça-feira (9), a partir das 19h, a prestação de contas da campanha do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Trata-se de um requisito para a diplomação do petista, marcada para o próximo dia 12 – solenidade que permite sua posse na Presidência da República, no dia 1.º de janeiro de 2023. As contas devem ser aprovadas, ainda que com algumas ressalvas, referentes a irregularidades não esclarecidas pela campanha.
A Assessoria de Exame de Contas Eleitorais e Partidárias (Asepa), área técnica do TSE responsável pela análise das contas de campanha de Lula, apontou que, dos R$ 131,3 milhões gastos entre agosto e outubro, R$ 187 mil foram despesas irregulares. Isso representa 0,142% do total gasto em propaganda, viagens e eventos da candidatura.
Em razão do baixo porcentual de irregularidades, a própria Asepa recomendou a aprovação com ressalvas das contas de Lula. “Foram verificadas irregularidades que, no conjunto, não comprometeram a regularidade das contas, constituindo motivo para a proposta técnica de aprovação com ressalvas”, diz o parecer final do órgão, inserido no processo no último dia 1.º.
Quais são as irregularidades nas contas de campanha de Lula
Ao final da análise das despesas e receitas, os técnicos do TSE verificaram três problemas não esclarecidas pela campanha de Lula nas contas eleitorais. Em razão delas, a recomendação é de que o PT devolva aos cofres públicos o montante de R$ 41 mil.
O primeiro problema é a omissão de uma despesa de R$ 146 mil com uma gráfica chamada Mavmix Adesivos Decorativos Ltda, localizada no Rio de Janeiro. A Secretaria de Fazenda do estado confirmou que foi emitida nota fiscal para Lula, mas a campanha não reconheceu gastos no empresa. Alegou que a contratação partiu do diretório estadual do PT, mas a gráfica registrou a campanha de Lula como contratante. A empresa confirmou a versão, mas não corrigiu a nota fiscal. A Asepa do TSE considerou que o PT não precisa devolver esse valor.
A segunda irregularidade é relativa a despesas de passagens aéreas pagas em duplicidade, no valor total de R$ 5,5 mil, valor que deverá ser recolhido ao Tesouro. Foram verificados pagamentos de passagens na mesma data, para o mesmo passageiro, em trechos incompatíveis – isso ocorreu com viagens compradas para três militantes da campanha. “São irregulares despesas relativas a bilhetes aéreos para os quais ocorreram no-show [não comparecimento do passageiro], além de ser defeso o uso de recursos públicos para pagamento de multa e juros decorrentes do inadimplemento de obrigações, tal como a decorrente de no-show”, diz o parecer.
Por fim, não foram comprovadas despesas de R$ 35,4 mil com material impresso. Inicialmente, a Asepa havia dado falta de comprovação de gastos bem maiores, num montante de R$ 1,4 milhão com impressos, serviços de publicidade, contabilidade e marketing digital. Mas, em resposta a questionamentos do órgão, o PT conseguiu comprovar as despesas.
Durante o mês de novembro, a área técnica do TSE havia levantado irregularidades num valor total muito maior em toda a campanha, de R$ 2 milhões. Havia suspeitas em relação à real doação de serviços ou bens por parte de pessoas físicas, possíveis irregularidades no impulsionamento de conteúdos em redes sociais, recursos de origem não identificada, bem como diárias em hotéis pagas em duplicidade – de modo semelhante ao que ocorreu com bilhetes aéreos. A campanha então enviou centenas de comprovantes para atestar a regularidade dos gastos. A maioria foi aceita pela Asepa.
No parecer final dos técnicos da Justiça Eleitoral, não há nada que implique numa sanção dura para a campanha de Lula e, por isso, houve a recomendação de aprovação das contas com ressalvas.
Ao analisar as receitas e despesas, a Asepa do TSE verifica a origem dos recursos empregados na campanha (na maior parte, oriunda dos fundos eleitoral e partidário); existência e regularidade da documentação fiscal e comprobatória; efetiva prestação do serviço e entrega dos bens; vinculação das despesas com a campanha eleitoral; legitimidade da candidatura; e adequação dos valores aos praticados no mercado.
No sábado (3), seguindo o parecer da área técnica do TSE, o Ministério Público Eleitoral também recomendou a aprovação das contas, e sem qualquer ressalva. Levou em conta novos esclarecimentos feitos pelo PT comprovando a regularidade dos gastos questionados pela Asepa em seu parecer final.
A análise final e o julgamento das contas de campanha de Lula cabe aos sete ministros do TSE. O relator do caso é Ricardo Lewandowski, ministro próximo de Lula.
Irregularidades podem, em tese, levar à abertura de ação de cassação
Ainda que houvesse recomendação ou mesmo decisão pela desaprovação das contas, isso, por si só, não impediria a diplomação e a posse de Lula. Quando há irregularidades graves na contabilidade eleitoral, o máximo que pode ocorrer é o ajuizamento, por parte do Ministério Público ou de algum adversário, de uma ação para cassação de mandato e inelegibilidade por abuso de poder econômico. Por ora, trata-se de uma possibilidade remota, levando-se em conta a análise das contas até o momento.
Exame semelhante é feito nas contas do diretório nacional do partido vencedor da eleição. No caso do PT, a Asepa encontrou irregularidades em montante bem maior. Dos R$ 502,8 milhões gastos pelo partido – inclusive com a campanha de Lula – há problemas na comprovação com despesas no valor de ao menos R$ 156,4 milhões, ou 31% do total.
Essas suspeitas não recaem sobre a campanha de Lula, mas sobre repasses para candidatos a outros cargos e também faltas na transparência. O partido, por exemplo, descumpriu prazos para entregar relatórios financeiros, a fim de informar em tempo hábil despesas de mais de R$ 1 milhão. Também deixou de repassar R$ 45,3 milhões dos fundos eleitoral e partidário para candidaturas de mulheres (algo obrigatório), além de repassar R$ 876,5 mil com atraso, após a prestação parcial de contas. Ainda falhou ao deixar de repassar R$ 107,6 milhões para candidaturas de pessoas negras, conforme determinado pelo STF. Nos dois casos, o valor deve ser proporcional ao número de candidatas mulheres (não menor que 30% do total) e de negros.
Essas irregularidades relativas ao PT nacional não têm potencial de causar problemas para a diplomação e posse de Lula. Mas, como foram maiores e mais graves, podem implicar perdas financeiras para o PT, na forma de descontos nos repasses mensais do fundo partidário, a título de devolução ou multa.
O relator das contas do PT no TSE é o ministro Benedito Gonçalves, corregedor-nacional da Justiça Eleitoral e também próximo de Lula. Ainda não há data marcada para esse julgamento.
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