No depoimento mais longo desde o início da CPI da Covid do Senado, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, afirmou ter recebido do presidente Jair Bolsonaro autonomia para exercer a função. Ele, que assumiu o posto em 23 de março, falou à CPI entre 10h30 e 20h30 desta quinta-feira (6). A falta de autonomia foi a tônica dos dois depoimentos que antecederam os de Queiroga, concedidos pelos ex-ministros Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich, na quarta (4) e na quinta-feira (5), respectivamente.
Queiroga disse também que defende ações como a vacinação, o uso de máscaras e medidas de controle de circulação. Segundo ele, o Ministério da Saúde empreendeu campanhas publicitárias, que serão continuadas, para incentivar a adoção dessas práticas por parte da população. Em relação às vacinas contra Covid-19, o ministro admitiu que o governo não adquiriu a quantidade de imunizantes que foi divulgada à população. Em campanhas, o governo informou a compra de 560 milhões de doses, mas o número real foi de 430 milhões.
O ministro foi questionado pelos senadores por declarações e posturas do presidente Bolsonaro que vão na contramão dessas ações, como o estímulo ao chamado tratamento precoce. Queiroga evitou dar respostas diretas sobre o uso de hidroxicloroquina ou cloroquina — a própria menção ao nome do medicamento foi poupada pelo ministro —, o que motivou críticas de diferentes senadores.
Queiroga disse que a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec) do Sistema Único de Saúde (SUS) elaborará um parecer definitivo sobre o uso desses e de outros medicamentos no combate à Covid-19, e que isso norteará a conduta do Ministério de Saúde para o tema. O posicionamento foi também questionado por senadores, que afirmaram que a postura estimula o consumo dos medicamentos até que exista uma nova orientação.
O assunto sobre o tratamento precoce ainda não está pacificado: existem dois grupos de pesquisas científicas, ainda não conclusivas, que desaconselham ou aprovam o uso de medicamentos como hidroxicloroquina, azitromicina, zinco e outros em pacientes com Covid-19.
A insistência no tema foi ironizada pela senadora Simone Tebet (MDB-MS), que questionou se a comissão deveria mudar seu nome: "Temos que mudar o nome para CPI da cloroquina?".
O medicamento foi tema da intervenção do senador governista Luis Carlos Heinze (PP-RS). Ele, como já havia feito durante o depoimento de Teich, defendeu a cloroquina e citou casos em que o uso do remédio teria trazido resultados positivos. O parlamentar requisitou também que a CPI ouça médicos que sejam favoráveis ao uso da substância.
Em resposta, o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), citou que a médica Nise Yamaguchi tinha ido ao seu gabinete na manhã desta quinta para pedir para falar à comissão. Ela é uma das principais entusiastas da cloroquina e foi cotada para ser ministra da Saúde.
Senadores perguntaram também a Queiroga se ele havia recebido orientações diretas de Bolsonaro sobre o tema, ou mesmo se havia presenciado o presidente fazendo a defesa do uso do medicamento. O ministro respondeu que testemunhou uma fala em uma única ocasião, quando ambos visitaram a cidade de Chapecó (SC). O município é governado pelo prefeito João Rodrigues (PSD), que é apoiador de Bolsonaro e alega ter reduzido o número de internações por Covid-19 devido à adoção do tratamento precoce. Queiroga disse ainda que não cabia a ele fazer "juízo de valor" sobre falas de Bolsonaro.
Queiroga falou também sobre quebra de patente e lockdown nacional
Queiroga disse ser contrário à quebra de patente de vacinas. O tema entrou em debate após o governo dos EUA anunciar o apoio à medida. O tópico deverá ser tratado em reuniões futuras da Organização Mundial do Comércio (OMC).
Questionado pela senadora Leila Barros (PSB-DF) sobre a retomada de aulas presenciais, Queiroga disse que ainda não tinha uma opinião formada sobre o tema. Ele declarou que se reunirá com o ministro da Educação, Milton Ribeiro, para debater o assunto.
Queiroga também disse ser contrário à ideia de implantação de um lockdown que abranja todo o território nacional, mas considera que situações específicas podem ser aplicadas de acordo com as demandas locais. As medidas de restrição e fechamento do comércio figuram entre as ações mais contestadas pelo Bolsonaro — entre quarta (5) e quinta-feira (6), o presidente falou que considera a edição de um decreto que determinaria a manutenção das atividades e que não poderia ser contestado pelo Supremo Tribunal Federal.
Senadores falam em obrigar Pazuello a depor
O ex-ministro Eduardo Pazuello foi também um dos temas mais abordados durante a reunião da CPI. Os senadores de oposição citaram que o ex-ministro pediu para não depor nesta quarta, sob a alegação de ter estado próximo de pessoas que contraíram o coronavírus, mas recebeu na quinta a visita do ministro Onyx Lorenzoni, da Secretaria-Geral da Presidência.
Parlamentares afirmaram que Pazuello poderia estar mentindo à comissão, para evitar o depoimento, e o senador Fabiano Contarato (Rede-ES) chegou a falar que o ex-ministro poderia ser alvo de uma "condução coercitiva". Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente do colegiado, disse que pedirá que a CPI solicite um teste de Covid-19 de Pazuello. Mas o presidente da CPI, Omar Aziz, descartou medidas contra Onyx e Pazuello.
A extensão do depoimento de Queiroga fez com que a CPI adiasse a fala do diretor-presidente a Anvisa, Antonio Barra Torres, que também estava prevista para esta quarta. A oitiva foi reagendada para a terça-feira (11).
Com isso, foi feito um rearranjo nos depoimentos marcados para a próxima semana. A fala de Fábio Wajngarten, ex-secretário de Comunicação do governo federal, foi transferida para a quarta-feira (12). No dia seguinte, comparecerão à CPI o ex-ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo e representantes do laboratório Pfizer. A participação de representantes do Instituto Butantan e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que estava prevista para a semana que vem, não tem mais data confirmada.
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