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O novo ministro do Meio Ambiente (MMA), Joaquim Leite, já despacha com as responsabilidades e atribuições que o cargo lhe traz. Tão logo o agora ex-ministro Ricardo Salles pediu demissão, Leite passou a conduzir a pasta com a promessa de manter os rumos da política ambiental até então vigente, da qual, inclusive, faz parte desde 2019.
Até quarta-feira (23), Leite era o titular da Secretaria da Amazônia e Serviços Ambientais, cargo que ocupava desde abril de 2020, antes sob o nome de Florestas e Desenvolvimento Sustentável. O novo ministro chegou ao governo em julho de 2019, quando assumiu a direção do Departamento de Florestas.
A escolha do presidente Jair Bolsonaro por Leite diz muito sobre o que o governo espera dele: a continuidade das políticas liberais de preservação ambiental com a participação do setor privado. O novo chefe do MMA é um defensor de que ações de preservação de florestas nativas sejam remuneradas.
Foi com essa linha de política ambiental que Joaquim Leite chegou ao governo. A defesa pela agenda de desenvolvimento sustentável e de trazer indivíduos ou organizações públicas ou privadas para ajudar na preservação do meio ambiente conquistou Salles.
Leite e Salles têm perfis diferentes, mas isso não significa ruptura na gestão
O novo ministro do Meio Ambiente tem um perfil diferente de Salles, mas isso não significa que a gestão vai mudar. "Os dois têm a mesma linha no campo da gestão ambiental, só que o Joaquim consegue conversar melhor com as pessoas", aponta um interlocutor do Palácio do Planalto.
Um deputado da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara reforça a leitura. "Ele é muito inteligente, entende muito de florestas, mas é uma pessoa mais light, despojada, anda de calça jeans, sabe conversar com as ONGs [Organizações Não-Governamentais], não é tão incisivo quanto o Salles, o Bolsonaro", sustenta o parlamentar.
Outro deputado do colegiado pondera que esse perfil mais conciliador de Joaquim Leite pode ser um trunfo. "O ministro se dá melhor com os mais diferentes espectros políticos, até com a esquerda. É uma pessoa de mais fino trato, digamos. Por isso, todos conseguem conviver com ele melhor, e isso pode ajudar o governo", avalia.
Os mais próximos de Leite confirmam as observações feitas pelas três fontes ouvidas e afirmam que, de fato, o novo ministro tem um perfil de maior conciliação e poder de articulação com os diferentes espectros políticos. "É mais uma diferença de estilo, ele é de escutar mais pessoas [que o Salles]", reconhece um interlocutor do ministro. "Mas a política ambiental não vai mudar de rumo", complementa.
Joaquim Leite é ainda, ao contrário do antecessor, "avesso aos holofotes e preza muito pela discrição", segundo um interlocutor.
O que o perfil e a capacidade de articulação de Joaquim Leite agregam ao MMA
Um exemplo prático do que o perfil de Joaquim Leite agregou ao governo é a formulação do Programa Floresta+. A iniciativa foi capitaneada pelo novo ministro e sua equipe técnica quando ainda era secretário de Florestas e Desenvolvimento Sustentável.
O programa foi apresentado em julho de 2020 com a promessa de valorizar as ações de preservação de florestas nativas. O projeto inicial vai ser realizado na Amazônia Legal, onde serão destinados mais de R$ 500 milhões para atividades que melhorem, conservem e recuperem a natureza.
Do Floresta+ Amazônia, Leite criou enquanto secretário o Floresta+ Carbono e o Floresta+ Empreendedor. A primeira ação tem o intuito de complementar e reforçar os investimentos e esforços para a redução de emissões de gases poluentes por desmatamento. O segundo foi proposto para capacitar líderes empreendedores a fim de conectar pequenos empresários e pagadores de serviços ambientais.
Os três programas foram construídos por Leite após ouvir parlamentares dos mais diferentes partidos e espectros políticos. "Ele foi ao Congresso ouvir a todos", afirma um assessor. Além de políticos, também escutou 80 entidades, das quais 60 são ONGs. "Mas ele só ouviu as que tinham subsídios técnicos para contribuir", acrescenta.
Dessas conversas e a construção dos programas fomentando o debate de premiar quem ajudar a preservar a Amazônia, Leite articulou a aprovação do projeto de lei (PL) 5.028/2020. O texto foi aprovado pelo Congresso e sancionado em janeiro por Bolsonaro, originando a Lei nº 14.119/21, que institui a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais (PNPSA).
Quais as prioridades e o que esperar da gestão de Leite como ministro
O PNPSA, na prática, regulamenta o artigo 41 do novo Código Florestal, a Lei nº 12.651/12. Com ele em vigor dando segurança jurídica para os programas Floresta+ Amazônia e os outros "braços", Joaquim Leite vinha pavimentando os mecanismos para colocá-los em prática.
Agora como ministro, a missão dele é assegurar a execução dos programas, com a seleção de beneficiários e demais definições. Segundo afirmam interlocutores do ministro, a expectativa é de que isso ocorra no segundo semestre. "Mas está tudo dentro do cronograma", assegura um assessor.
Basicamente, dar continuidade e aperfeiçoar as políticas ambientais que construiu enquanto secretário é o que estará prioritariamente na mira de Leite neste início de gestão como ministro. Instrumentos que viabilizem todas as ações do Floresta+ serão apresentados nos próximos meses, bem como outros "braços" do programa. Até o ano que vem, o ministro espera lançar o Floresta+ Água.
Outra prioridade de Leite para este ano — essa na área internacional — é conquistar a almejada regulamentação dos créditos de carbono na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (Cop-26), em novembro, em Glasgow, Escócia. Essa é uma pauta trabalhada pelo MMA desde 2019.
Como explicou Salles em abril deste ano, é com esses créditos de carbono — uma espécie de "moeda" que um país ganha ao reduzir suas emissões de dióxido de carbono (CO2) — que o governo espera receber recursos para a agenda ambiental. Na Cúpula do Clima, Bolsonaro disse que duplicaria recursos para a fiscalização ambiental, mas o governo cortou R$ 240 milhões do Orçamento do MMA.
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Os desafios que Leite terá pela frente
Todas as ações e prioridades que Joaquim Leite terá pela frente como ministro têm como objetivo conter o desmatamento na Amazônia Legal com o provimento do desenvolvimento sustentável, a pauta central da política ambiental do governo Bolsonaro.
Em março, a Floresta Amazônia perdeu 810 quilômetros quadrados de floresta, o que significa um aumento de 216% em relação ao mesmo mês de 2020, informa o site G1. Em todo o ano passado na comparação com 2019, o desmatamento subiu 9,5%.
A queda do desmatamento, por sinal, se transformou em uma condicionante imposta pela Noruega para reativar o Fundo Amazônia. Até paralisar os investimentos no Brasil, em 2019, o país europeu era o maior financiador do fundo, tendo repassado R$ 3,1 bilhões entre 2008 e 2018, informou o site DW.
Tanto Salles quanto Bolsonaro sinalizaram nos últimos meses o desejo por recursos estrangeiros. "É preciso haver justa remuneração pelos serviços ambientais prestados pelo nossos biomas ao planeta, como forma de reconhecer o caráter econômico das atividades de conservação. Estamos, reitero, abertos à cooperação internacional", disse o presidente da República na Cúpula do Clima.
Outro desafio que Leite terá pela frente é a articulação de uma regularização fundiária, reconhecida por deputados federais e senadores como uma importante pauta para combater desmatamentos e queimadas na Amazônia.
Uma outra missão será garantir segurança jurídica ao setor madeireiro na Amazônia. No Pará, por exemplo, empresas entraram na mira de operações da Polícia Federal (PF) sob suspeita de exportação ilegal. A corporação, inclusive, incluiu Salles no âmbito dessas investigações. A Gazeta do Povo explicou o imbróglio e como a insegurança jurídica afeta empresas e favorece o mercado negro de madeira.
Conheça o currículo de Joaquim Leite
O novo ministro do Meio Ambiente é formado em Administração de Empresas pela Universidade de Marília e tem mestrado em MBA Executivo pelo Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper-SP). Oriundo do agronegócio, foi produtor de café entre 1991 e 2002, segundo seu próprio currículo.
A experiência como produtor de café o levou a ser conselheiro da Sociedade Rural Brasileira (SRB) de 1996 a 2019, quando se desincompatibilizou para assumir o cargo no governo. Também foi diretor da LOT Incorporações e consultor administrativo da Suplicy Café Especiais.
O ministro adquiriu experiência na área de desenvolvimento sustentável na MRPL Consultoria, onde atuou por 16 anos. Nessa empresa, foi diretor operacional e trabalhou com manejo sustentável de baixo impacto e no Projeto de Carbono REDD+ da consultoria.
Ou seja, nessa consultoria, Joaquim Leite trabalhou em um projeto de redução de emissões por desmatamento e degradação florestal (REDD+). Dessa experiência e do manejo sustentável florestal que o ministro tirou boa parte de suas ideias nas diferentes propostas do Programa Floresta+.
Como secretário, Leite se tornou membro da Comissão de Preservação do Conselho Nacional da Amazônia Legal, colegiado chefiado pelo vice-presidente Hamilton Mourão. O ministro também assumiu a presidência da Comissão Executiva para Controle do Desmatamento Ilegal e Recuperação da Vegetação Nativa (CONAVEG) e da Comissão Nacional para Redução das Emissões de Gases de Efeito Estufa Provenientes do Desmatamento e da Degradação Florestal (CONAREDD+).