"Sem ele, essa reforma não passaria". A frase, repetida por deputados de três partidos diferentes (Cidadania, PSDB e PCdoB), deixa claro a quem deve ser atribuída a vitória pela aprovação da reforma da Previdência, na quarta-feira (10). O "ele", no caso, é o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que desempenhou um trabalho de articulação nos bastidores considerado crucial para a construção do placar de 379 votos favoráveis à PEC no plenário da Casa.
Imediatamente após a aprovação da reforma, as redes sociais foram invadidas por menções positivas ao "novo feito" do governo Jair Bolsonaro (PSL), apontando o presidente da República como o grande vencedor da batalha da aprovação. Entretanto, contra fatos, não há argumentos.
Para os deputados, as movimentações de Maia superaram dificuldades criadas pelo próprio Planalto nos debates da reforma da Previdência, como os acenos por regras mais brandas para policiais e outros profissionais de carreira militar. "O governo bateu muita cabeça. É algo que atrapalha a articulação política e o andamento dos projetos. Sem alguém que lidere, como Maia fez, não teríamos os resultados", afirmou o deputado Rubens Bueno (Cidadania-PR).
Na opinião dos parlamentares, o resultado da votação de quarta também abre caminho para que a Câmara tenha uma agenda própria, menos vinculada às demandas do Planalto. "A pauta que vai preponderar agora é a capitaneada pelo Maia", avaliou o deputado Rodrigo de Castro (PSDB-MG).
Reforma "com a cara da Câmara"
Na disputa informal entre Maia e Bolsonaro pelos louros da vitória na votação, há outro argumento que reforça o papel do presidente da Câmara, segundo o deputado do PSDB: o texto-base aprovado passou por significativas mudanças no Legislativo.
"A Câmara mudou a proposta de maneira bastante substantiva. Principalmente no que diz respeito à filosofia da proposta. O projeto do governo era essencialmente liberalizante. O da Câmara, embora tenha mantido o rigor, passou a ter um cunho social, por carregar também uma preocupação com os menos favorecidos", declarou Castro. O deputado menciona, entre as alterações feitas pelo Legislativo, a rejeição em mudanças no pagamento do Benefício de Prestação Continuada (BPC).
Para Castro, o presidente da República "não foi um entusiasta e nem um grande incentivador" da reforma. "Isso tudo, para ele [Bolsonaro], causa um incômodo muito grande", afirmou.
Papel de Maia foi reconhecido pelo PSL
Ao longo da sessão da quarta-feira, deputados do PSL, o partido de Bolsonaro, fizeram uma série de elogios a Maia e à maneira como o presidente da Câmara conduziu a reforma. As palavras positivas ofuscaram o fato de que o relacionamento entre Maia e a base governista nem sempre foi das melhores. No primeiro semestre, atritos entre as partes ocorreram, como na ocasião em que Maia criticou o ministro da Justiça, Sergio Moro, que pediu à Câmara a avaliação do projeto anticrime.
Em maio, Maia chegou a bater boca com o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), afirmando ser alvo de ataques constantes deles e do governo. "Exclui ele das minhas relações pessoais", disse o presidente da Câmara na ocasião.
Agora, com a votação da Previdência, o clima realmente é de pacificação. "Ele não foi o único, mas sem dúvida foi um ator importantíssimo para a aprovação da reforma", afirmou o deputado Márcio Labre (PSL-RJ).
Segundo o deputado, "toda a bancada do PSL está reconhecendo a importância" de Maia no processo. Labre descarta a existência de uma espécie de ciúmes ou outro tipo de mal-estar entre o partido de Bolsonaro e Maia, por conta de um eventual "protagonismo excessivo" do presidente da Câmara com a votação.
Elogios até mesmo da esquerda
Em uma de suas intervenções na votação da quarta-feira, Maia brincou com os deputados do PCdoB e disse que o partido é seu "maior aliado" dentro da Câmara. Os comunistas fazem parte da principal frente de oposição ao governo Bolsonaro, ao lado de PT, PDT e PSOL, e, nos tempos do governo Lula e Dilma, tinham o DEM entre os rivais.
Para a deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC), o ambiente positivo entre seu partido e Rodrigo Maia se deve ao fato de o presidente da Câmara ser "um democrata". "O Rodrigo é um homem de mercado, e eu discordo dessa posição. Mas acredito que ele é um garantidor do processo democrático. É alguém que possibilita o debate com a esquerda", declarou a parlamentar.
Perpétua é também da opinião de que a reforma – em que votou contra – passou pela articulação decisiva de Maia. "Ele construiu uma relação boa com todos os lados. E, por ser alguém de mercado, acredita na ideia da reforma. Houve um esforço do governo para garantir mais votos, com a liberação de emendas, mas o Rodrigo foi também imprescindível", destacou.
Protagonismo da Câmara
A vitória expressiva da reforma da Previdência na Câmara abre caminho para que outras pautas de difícil tramitação que rondam o Legislativo, como a reforma tributária, passem a ser consideradas como mais viáveis. E também aumentam o otimismo dos deputados em torno de um objetivo comum entre os parlamentares: o de fazer com que a Câmara dite seu próprio ritmo.
"Agora temos condições de fazer com que o protagonismo da Câmara continue, e que possamos fazer as reformas necessárias para tirar o país do atraso", declarou Rubens Bueno. Márcio Labre endossa: "podemos começar a respirar para logo após o recesso discutirmos de vez a reforma tributária". O deputado disse que o PSL entende a alteração na sistemática de impostos como "a mãe de todas as reformas".
Mesmo a oposicionista Perpétua Almeida acredita que o ambiente de protagonismo da Câmara é positivo – ainda que capitaneado por um integrante do DEM, adversário de seu PCdoB. "O fortalecimento da instituição é algo muito positivo, e que possibilitará a discussão de outros projetos", apontou.
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