A eleição à Presidência de Jair Bolsonaro, que já comprou polêmica no Congresso por ser contrário às cotas para negros em universidades, levantou a suspeita de que as políticas para igualdade racial sofreriam mudanças drásticas no Brasil. Mas, até agora, projetos de gestões anteriores foram mantidos, novos programas estão sendo criados e nenhuma grande transformação aconteceu.
O governo tem tentado levar o Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Sinapir), criado em 2010, a mais estados e municípios. Além disso, está elaborando um material educativo contra a discriminação racial para agentes penitenciários e promoverá, em breve, uma ação contra o racismo no futebol.
Secretaria que combate racismo é chefiada por indígena
A Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SNPIR) – do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) – é chefiada pela primeira vez por uma indígena, Sandra Terena. Ela considera positivos alguns dos programas de governos passados, mas reclama da falta de planejamento e estrutura das informações deixadas por outras gestões.
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“O que mais me chocou é o fato de não haver uma memória institucional do que vinha sendo feito. A impressão que dá é que não se teve um zelo pela informação. Tem coisas que a gente continua tocando mas, quando precisa de dados, não tem”, afirma.
Um tipo de informação que falta, segundo a secretária, são números sobre as políticas de cotas raciais. “Em 2020, teremos que prestar um relatório a respeito das cotas, para saber se estão sendo efetivas. As informações que a gente tem são muito superficiais.”
Outra dificuldade tem sido o baixo orçamento com que trabalha a SNPIR neste ano. O valor aprovado pelo Congresso no fim de 2018 foi de R$ 7 milhões, cerca de R$ 15 milhões a menos do que a verba do ano anterior. Uma das soluções, segundo Sandra Terena, tem sido estabelecer parcerias com outras secretarias e ministérios.
Mudança de ênfase não excluiu negros, garante secretária
Neste primeiro ano do governo Bolsonaro, tem sido óbvia uma mudança de ênfase da SNPIR, que antes privilegiava políticas públicas voltadas à afirmação de negros na sociedade. Povos indígenas e comunidades tradicionais, como ciganos e quilombolas, têm recebido atenção muito maior do que no passado.
Sandra Terena ressalta que, apesar disso, a secretaria não está deixando de lado a questão da discriminação racial contra negros. “A gente entende que, infelizmente, o racismo ainMinistério a existe e tem se acentuado”, diz.
Nesse aspecto, a secretaria tem dado continuidade a projetos de gestões anteriores, como o Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Sinapir), criado em 2010, que garante preferência aos municípios e estados participantes no repasse de recursos financeiros federais destinados à promoção da igualdade racial.
Além disso, a secretaria promoveu ações para valorizar povos tradicionais de matriz africana. Em julho, foi realizado um evento sobre mulheres negras empreendedoras. O governo também planeja uma ação contra a discriminação racial no futebol.
“A gente vai fazer uma grande mobilização para enfrentar o racismo no futebol”, afirma Sandra Terena. Por ainda estar em fase de elaboração, o projeto ainda não pode ser divulgado. Mas, segundo a secretária, não se tratará somente de uma campanha. “É uma ação mais robusta e concreta. Campanha é algo passageiro, acaba caindo no esquecimento. A gente precisa fazer algo muito mais consistente nesse sentido.”
Agentes penitenciários receberão formação contra o racismo
Outro foco do governo Bolsonaro tem sido o combate ao racismo nas penitenciárias. Segundo dados de 2017 do Ministério da Justiça, pretos e pardos compõem 63,6% da população carcerária do Brasil.
Em setembro, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos assinou um acordo de cooperação técnica com o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) para incluir o tema do racismo na formação dos agentes penitenciários. O acordo prevê a criação de um material formativo elaborado em parceria com a Universidade de Brasília (UnB).
A previsão é de que o material fique pronto até o começo de 2020. O Depen vai disponibilizar o conteúdo em sua plataforma de ensino a distância. Pelo menos 500 agentes penitenciários deverão fazer o curso, que terá duração de 20 horas. Segundo o ministério, o material terá como foco “as melhores formas de abordagem, condução e tratamento das populações negra, indígena e cigana”.
Outra proposta do ministério é a inclusão de quesitos como raça, cor ou origem étnica nos formulários do sistema penitenciário nacional. O objetivo é “o conhecimento e monitoramento da população carcerária e, consequentemente, elaboração de futuras políticas públicas que atendam a esses grupos”.