Bolsonaro e Valdemar Costa Neto, presidente do PL.| Foto: Reprodução/TV PL
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Os ruídos internos no PL e a rápida resposta que o partido deu ao manter vivas as chances de filiação de Jair Bolsonaro diz muito sobre a legenda que pode dar sustentação para a campanha de reeleição do presidente. Trata-se de uma sigla do Centrão, que não dispõe de um perfil ideológico claro, o que permite "vida própria" a seus filiados. No fim das contas, entretanto, é um partido que tem um "dono" com plenos poderes e palavra final, o presidente nacional do PL, o ex-deputado Valdemar Costa Neto.

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"O PL tem essa permissividade para baixa coesão. Permite que tenha nomes não apenas da direita, mas também da esquerda, que não vão topar dividir palanque com Bolsonaro, seja por diferenças ideológicas ou programáticas. Mas tem o Valdemar, que é o cara que bate o martelo", resume o analista político Lucas Fernandes, coordenador de análise política da BMJ Consultores Associados.

A construção da carreira política de Costa Neto deu a ele plenos poderes no PL e credibilidade para unir lideranças políticas de diferentes ideologias sem que ele perca o comando ou a mão sobre as principais tomadas de decisão. Com esse perfil flexível de seu comando, o PL elegeu 33 deputados federais nas eleições de 2018 e elevou sua bancada na Câmara para 43 na atual legislatura com deputados que vieram de outros partidos. Atualmente, essa é a terceira maior bancada da Casa.

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A prática do PL de atrair políticos de outros partidos também ocorre com mais cargos de destaque na política nacional. O partido filiou o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, ex-PSC; e os senadores Romário, ex-Podemos, e Carlos Portinho, ex-PSD. No caso do Senado, essas duas filiações elevou a bancada do partido de dois para quatro parlamentares.

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Como Bolsonaro pode mudar o perfil do PL nos estados

A possível filiação de Bolsonaro não levará o PL a adotar uma linha ideológica clara associada à direita conservadora e abandonar seu perfil mais pragmático e flexível. Lideranças do partido dizem que alguns integrantes mais simpáticos à esquerda poderão se desfiliar. Mas eles ponderam que, apesar da disposição em receber o presidente da República, Bolsonaro pode ter que fazer "vista grossa" a algumas alianças em alguns estados.

"Pode ter casos em que o Bolsonaro possa relevar alguma aliança. Vai ser caso a caso, até porque não adianta ir a um lugar que ele não tem um projeto ou alguém para lançar, porque o partido poderia ficar inoperante por conta disso. Podem haver questões pontuais, que podem ser relevadas", afirma uma liderança do PL na Câmara.

Apesar da avaliação de que Bolsonaro terá que "relevar" algumas alianças, existe um acordo costurado entre ele e Costa Neto para que o partido não apoie chapas de desafetos do governo nos estados, a exemplo de candidaturas do PT, do MDB em Alagoas (governado por Renan Filho) e o PSDB em São Paulo, onde já há acordo para a sigla não apoiar a chapa do tucano Rodrigo Garcia, aliado do governador e presidenciável João Doria.

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"Não podemos, em Alagoas, deixar o PL acompanhar a candidatura de alguém apoiado pelos Calheiros. Vamos ter que construir uma candidatura de alguém lá. Pode ser do governo, do partido ou de outra legenda, mas que seja bolsonarista", diz o deputado Giacobo (PL-PR), presidente do diretório paranaense da sigla. "O Valdemar sempre foi um democrata, sempre deu carta branca aos estados. Agora, os estados estão devolvendo a ele [a carta branca para decidir sobre a filiação de Bolsonaro]."

O mapeamento da situação do PL estado a estado se deve a algumas divisões internas do partido em relação à filiação de Bolsonaro. Em Alagoas, por exemplo, o presidente do diretório estadual, o ex-deputado Maurício Quintella, atual secretário de Infraestrutura de Renan Filho, é opositor do presidente. No Amazonas, o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), é outro contrário. "Todos sabem que não é uma situação cômoda para mim [ter Bolsonaro como correligionário]", afirmou Ramos em seu perfil no Twitter.

No Piauí, o único deputado federal do partido, Capitão Fábio Abreu, disse ao jornal O Estado de S. Paulo que "com certeza" deixará o PL se ele não tiver autonomia para apoiar o grupo do governador Wellington Dias (PT-PI), que pretende lançar a candidatura do seu secretário de Fazenda, Rafael Fonteles (PT), para a sucessão.

Diante dessas situações, a avaliação feita no PL é que uma possível filiação de Bolsonaro pode provocar um saída natural dos opositores ao presidente no partido. Mas lideranças e dirigentes do partido dizem que Costa Neto não agirá com arbitrariedade a ponto de destituir Quintella do comando do diretório alagoano, por exemplo.

A pacificação das divisões internas atualmente existentes ocorrerá à medida em que opositores a Bolsonaro deixem naturalmente as presidências e postos de comando nos diretórios estaduais, que poderão ser ocupados por nomes próximos ou indicados ao presidente.

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Como é a fidelidade do partido ao governo no Congresso

Um levantamento feito pela BMJ Consultores aponta que, entre fevereiro e setembro, o PL acompanhou as orientações do governo na Câmara em 87,9% das votações em plenário. No Senado, esse índice é de 83,5% no mesmo período.

Entre os deputados, o "índice de governismo" do PL nas votações da Câmara, nesse período, é alto, com algumas exceções. Veja abaixo os deputados do PL mais "fiéis" ao governo na Câmara nesse período:

Deputado% de governismo
Pr. Marco Feliciano (SP)93,80%
Paulo Freire Costa (SP)93,40%
Dr. Jaziel (CE)92,90%
José Rocha (BA)92,00%
Magda Mofatto (GO)91,70%
Giovani Cherini (RS)91,60%
Capitão Augusto (SP)91,60%
Marcio Alvino (SP)91,60%
Policial Katia Sastre (SP)91,50%
Edio Lopes (RR)91,40%
Luiz Nishimori (PR)91,30%
João Maia (RN)91,20%
Júnior Mano (CE)91,00%
Pastor Gil (MA)90,80%
Gelson Azevedo (RJ)90,70%
Giacobo (PR)90,70%
Vicentinho Júnior (TO)90,70%
Abílio Santana (BA)90,60%
Cristiano Vale (PA)90,40%
Junior Lourenço (MA)90,30%
João Carlos Bacelar (BA)90,10%
Sergio Toledo (AL)90,10%
Luiz Antônio Corrêa (RJ)89,60%
Bosco Costa (SE)89,50%
Christiane de Souza Yared (PR)89,20%
Lincoln Portela (MG)89,20%
Altineu Côrtes (RJ)89,10%
Vinicius Gurgel (AP)89,10%
Luiz Carlos Motta (SP)88,60%
Miguel Lombardi (SP)88,10%
Raimundo Costa (BA)87,70%
Zé Vitor (MG)87,50%
Josimar Maranhãozinho (MA)87,10%
Wellington Roberto (PB)86,90%
Capitão Fábio Abreu (PI)86,60%
Soraya Santos (RJ)83,20%
Aelton Freitas (MG)82,80%
Laerte Bessa (DF)80,90%
Marcelo Ramos (AM)78,80%
Fernando Rodolfo (PE)77,90%
Valdevan Noventa (SE)74,60%
Tiririca (SP)55,20%

Esse apoio do PL costuma ajudar o governo em projetos importantes para o Planalto. No segundo turno da votação da PEC dos Precatórios, por exemplo, 95,4% dos deputados do partido foram a favor da proposta.

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Mas a flexibilidade que o partido dá a sua bancada no Congresso para tomar posições pode ser observada em outras votações na Câmara. Na votação da PEC do Voto Impresso, um projeto importante para Bolsonaro, a bancada do PL na Câmara entregou apenas 26,8% dos votos a favor.

Isso indica que o PL estará com Bolsonaro, mas não pretende referendar tudo o que o presidente quiser. Ou seja, a tendência é que o PL mantenha um perfil bem pragmático e próximo ao que já existe nas orientações e votações acompanhando o governo no Congresso.

"Por ser um partido com coesão baixa, como muitos outros do Centrão, não vamos ver fechando questão sobre algum tema e punindo quem votou contra [o governo]", diz o analista Lucas Fernandes, da BMJ Consultores. "É uma sigla mais flexível, mas que continuará entregando uma boa margem de votos para o governo."

A tendência, porém, é que a filiação de Bolsonaro aumente ainda mais a "taxa de governismo" do PL. Isso porque boa parte dos deputados aliados a Bolsonaro mais ideológicos devem também se filiar ao partido na abertura da janela partidária, em março de 2022. Isso tende a ocorrer principalmente com deputados do PSL.

Mas o consultor Lucas Fernandes não acredita que o governismo do PL seria muito mais alta com esses novos deputados. "Não mudaria o perfil. O PL não é um dos partidos mais indisciplinados. No Senado, por exemplo, mesmo o Romário, que seria um dos senadores mais afastados do governo, acompanhou os votos do [líder do] governo [Fernando Bezerra] em 82,2% das votações. O Portinho tem um 'índice de governismo' menor, de 67,5%, mas aí tem o Wellington Fagundes [MT], com 89,6%, e o Jorginho [Mello (SC)], com 94,8%. Na média, é um partido fiel nas duas Casas", diz Fernandes.

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Qual é o tamanho do PL e o que isso pode representar para Bolsonaro

Dos 43 deputados do PL, número que inclui suplentes em exercício da atividade parlamentar, alguns podem sair na janela partidária e outros podem entrar no partido. Nas eleições de 2022, a meta de Valdemar Costa Neto é eleger pelo menos 60 deputados federais para a próxima legislatura.

No Senado, o objetivo é ampliar a bancada atual, de quatro senadores, com candidaturas em todos os estados de nomes indicados por Bolsonaro ou com o aval do presidente. Boa parte dos nomes apoiados podem ser lançados pelo PL no acordo costurado entre o presidente da República e Costa Neto, embora não esteja descartado o apoio a quadros políticos do PP.

O PL também quer aumentar sua expressividade nos estados, a começar pela manutenção de seu único governador, Cláudio Castro (RJ), que tentará a reeleição. De vice-governador, o partido conta com Lúcio Vale, no Pará. O mesmo se aplica para a ambição em elevar sua bancada nas assembleias legislativas: a legenda conta com 55 deputados estaduais e distritais.

As conversas do PL para a montagem de chapas majoritárias e proporcionais federais e estaduais ainda aguardam a confirmação ou não da filiação de Bolsonaro, uma vez que pré-acordos podem ser revistos, como em São Paulo, e outros podem ser construídos.

A musculatura e a capilaridade política atual da legenda, contudo, já são elementos atrativos para a campanha à reeleição presidencial.

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O tamanho do PL, principalmente na Câmara, proporcionará a Bolsonaro um dos principais ativos políticos almejados pelo presidente: recursos públicos para a sua campanha e a de aliados. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ainda vai calcular quanto cada partido receberá em 2022 de verbas públicas. Mas, nas eleições municipais de 2020, a legenda recebeu R$ 45,67 milhões do fundo partidário e R$ 117,62 milhões do fundo eleitoral.

A meta do PL em filiar Bolsonaro e tê-lo como cabo eleitoral para ampliar o tamanho do partido nos estados e no Congresso também teria como efeito, caso seja atingida, o aumento de recursos de fundo eleitoral para também crescer nas eleições municipais em 2024. Em 2020, a sigla elegeu 347 prefeitos, 372 vice-prefeitos e 3.472 vereadores em todo o país.