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A esquerda errou ao subestimar duas questões centrais para a camada mais pobre da população no Brasil: o combate à corrupção e a segurança pública. Essa é a avaliação do líder da oposição no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que conversou com exclusividade com a Gazeta do Povo em seu gabinete, em Brasília.

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O presidente Jair Bolsonaro foi eleito justamente com essas duas bandeiras como principal plataforma de campanha em 2018 e conseguiu apoio em uma fatia importante do eleitorado que votou durante muitos anos em candidatos do PT.

Segundo Randolfe, a esquerda no Brasil deixou de dialogar sobre o tema da segurança pública com os mais pobres, que sentem mais os efeitos da criminalidade. Segundo dados do Atlas da Violência, o país registrou em 2016 mais de 60 mil assassinatos – a maior fatia dos homicídios ocorreu dentre as pessoas com menor renda.

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“A pauta da segurança pública não pode ser tratada somente a partir da perspectiva de questões identitárias”, disse o senador. “A pauta segurança pública tem que ser tratada com uma proposta para segurança pública. Significa valorização dos policiais, reconhecimento da atuação da Polícia Militar e da Polícia Civil, investimento nas polícias investigativas, modernização das polícias e atuação de repressão ao crime. A esquerda deixou de falar isso. Quando a esquerda deixa de falar da pauta da segurança pública para os mais pobres que sofrem com o aumento da criminalidade, a esquerda se dissociou de camadas da classe média – e não falo de classe média alta ou da classe média média, falo da classe média baixa, dos mais pobres”, afirmou o líder da oposição no Senado.

Assista à entrevista de Randolfe Rodrigues em vídeo

Setores progressistas se converteram ao toma lá, dá cá, diz Randolfe

A segunda questão central para entender a ascensão de Bolsonaro em camadas do eleitorado que votavam na esquerda é o combate a corrupção, segundo Randolfe. “Vários setores da esquerda subestimaram o conceito, a necessidade de combater a corrupção no país”, disse o senador.

“Eu fui formado em um ambiente progressista no final dos anos 1990 e início dos anos 2000 com uma consigna de que deveríamos combater a corrupção e melhorar a vida do povo. Isso foi perdido”, afirmou o líder da oposição. “Ao invés de terem na sua agenda o combate à corrupção como princípio também, como princípio de enfrentamento como elite, acabaram se convertendo aos favores, ao toma lá, dá cá das coisas do poder”, completou.

Para o senador, que foi um dos principais defensores das 10 Medidas Contra a Corrupção apresentadas pela força-tarefa da Lava Jato no Congresso, o divórcio ocorreu durante a tramitação das propostas. “Eu considero que as 10 Medidas foram uma mobilização necessária. E esse foi um dos pontos em que se divorciou o diálogo dos setores democráticos progressistas com a sociedade, ao criminalizar as 10 Medidas”, afirmou.

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Críticas a Moro e a Paulo Guedes

Randolfe também não poupou críticas ao governo Bolsonaro, em especial aos ministros da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, e da Economia, Paulo Guedes. O líder da oposição afirmou que continua defendendo a Lava Jato, mas disse que Moro manchou a credibilidade da operação ao entrar para o governo Bolsonaro. Ele também criticou a atuação do ministro em relação ao caso do miliciano Adriano Nóbrega, morto em uma operação policial na Bahia recentemente, e supostas omissões de Moro em relação a casos de corrupção no governo.

O senador também criticou Guedes e afirmou que o ministro sabotou a reforma administrativa ao chamar os servidores públicos de parasitas. Randolfe também disse que o ministro tem “aversão de classe aos mais pobres” por causa da declaração recente do ministro, que disse que com o dólar baixo, empregadas domésticas estavam viajando à Disney.

O líder da oposição também criticou retrocessos nas áreas ambiental, social, de educação e geração de emprego.

Leia a entrevista de Randolfe Rodrigues na íntegra: 

Como o senhor avalia o desempenho da oposição ao governo no Senado até aqui?

Randolfe: Nós iniciamos ano passado com a consigna, como líder da oposição, que eu tenho procurado mantê-la. Não somos nem oposição sistemática, nem situação automática. Tanto que ainda nesta última semana teve uma agenda que nós nos posicionamos para defender os interesses, que eu não diria do governo, do Brasil.

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Veja, existe um veto que o presidente da República aportou na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) sobre a disponibilização de R$ 30 bilhões que passariam a ficar à disposição da execução orçamentária do Parlamento, através do relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias. Hoje a parte das emendas individuais e das emendas de bancada já têm 51% que estão sob o controle do Legislativo. O Executivo tem 49%. Mais esses R$ 30 bilhões é basicamente um golpe parlamentarista. É como se nós tivéssemos aprovado uma emenda do parlamentarismo. O presidente da República vetou.

O presidente da República, no meu sentir, equivocadamente, fez um acordo com os presidentes das Casas [Câmara e Senado] para ser derrubado seu próprio veto. Eu acho que o presidente está errado em fazer um acordo para o veto dele ser derrubado. Nós, aqui, iremos sustentar a manutenção do veto. Por uma razão: por mais que eu divirja do presidente Jair Bolsonaro, por mais que eu tenha votado contra ele no primeiro e no segundo turno [das eleições de 2018], e com muito orgulho seja líder da oposição ao governo dele, mas eu não sou oposição ao Brasil.

Ele legitimamente foi eleito presidente da República e tem que ser reconhecido como tal. A não ser que nós aprovemos a emenda do parlamentarismo. E o presidente está errado quando faz um acordo desse tipo com os presidentes das Casas porque ele abre mão de R$ 30 bilhões do controle dele e entrega para o Legislativo controlá-lo. É basicamente uma emenda parlamentarista esse dispositivo. Esse é um dos temas concretos em que nós procuramos aqui não fazer oposição ao Brasil. Se fosse diferente, se estivéssemos apostando no quanto pior, melhor para o país,, esse seria um dos temas em que nós entraríamos em um acordo que o próprio presidente fez.

Nós pautamos aqui a nossa atuação baseada em alguns princípios. Não ser oposição sistemática. Em segundo lugar, defender a democracia. E nesse sentido os arroubos do presidente da República não ajudam em nada. Os conflitos, via de regra, que ele cria desnecessariamente com diferentes personagens da sociedade brasileira – artistas, governadores – não está à altura da magistratura de um presidente da República. Em terceiro lugar, nós consideramos que as ações do governo estão prejudicando em larga medida os mais pobres. As reformas aqui apresentadas, medidas provisórias como essa medida provisória verde e amarela, que não tem nada de verde e amarela, só aumentam as desigualdades no nosso país. Esses têm sido nossos desafios e o centro da nossa atuação.

Como o senhor encara as últimas declarações do ministro Paulo Guedes, que chamou servidores de parasitas e disse que dólar alto é bom porque domésticas estavam indo à Disney?

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Randolfe: Você soma essas duas a mais uma, que ele tinha dito anteriormente, que a responsabilidade dos incêndios da Amazônia é dos mais pobres. São declarações que, na prática, demonstram o senhor Paulo Guedes. Eu não crio nenhuma expectativa sobre o senhor Paulo Guedes. As pessoas diferenciam muito o senhor Paulo Guedes do presidente Jair Bolsonaro. O senhor Paulo Guedes é a mesma coisa que o presidente Jair Bolsonaro – só que com o refino de aversão de classe aos mais pobres. O senhor Paulo Guedes é de uma perspectiva de atuação daquele que não compreende o que é um país de 8,511 milhões de quilômetros quadrados.

Um país que até pouco mais de cem anos ainda tinha escravidão e que foi o último das Américas a abolir a escravidão. Veja, é só você perceber que 130 e poucos anos de abolição da escravatura significam que bisavós ou tataravós de gerações de negros atualmente eram escravos. A mentalidade escravocrata está presente. A fala do senhor Paulo Guedes em relação às empregadas domésticas, em relação aos mais pobres nada mais é do que a reprodução dos escravocratas do século 19. Os escravocratas do século 19, pouco antes da abolição, nos debates que tinham aqui no Senado diziam o seguinte: "Não vamos abolir a escravidão porque os negros vão ficar mais pobres, o melhor que pode acontecer para os negros é eles serem escravos". Era assim que diziam os escravocratas do século 19 um pouco antes da abolição. É essa mentalidade que está clara nas falas do senhor Paulo Guedes.

Bolsonaro chegou a uma camada do eleitorado, nas eleições de 2018, que historicamente votava em candidatos da esquerda. Quais os principais fatores, na opinião do senhor, que levaram a esse resultado? Onde a esquerda errou?

Randolfe: Foi ao subestimar duas questões centrais. Primeiro a pauta da segurança pública como uma necessidade do povo. A pauta da segurança pública não pode ser tratada somente a partir da perspectiva de questões identitárias. A pauta da segurança pública tem que ser tratada com uma proposta para segurança pública. Significa valorização dos policiais, reconhecimento da atuação da Polícia Militar e da Polícia Civil, investimento nas polícias investigativas, modernização das polícias e atuação de repressão ao crime. A esquerda deixou de falar isso. Quando a esquerda deixa de falar da pauta da segurança pública para os mais pobres que sofrem com o aumento da criminalidade, a esquerda se dissociou de camadas da classe média, e não fala de classe média alta ou da classe média média, falo da classe média baixa, dos mais pobres.

O segundo [fator]: vários setores da esquerda subestimaram o conceito, a necessidade de combater a corrupção no país. A corrupção em si é uma agenda da elite nesse país. A elite desse país é escravocrata, patrimonialista, no passado dona de escravos, tendo as coisas como se privadas fossem. Os setores populares surgiram questionando isso. Eu fui formado em um ambiente progressista no final dos anos 1990 e início dos anos 2000 com uma consigna de que deveríamos combater a corrupção e melhorar a vida do povo. Isso foi perdido. Isso foi um signo que os setores de esquerda, os setores progressistas em geral perderam. Ao invés de terem na sua agenda o combate à corrupção como princípio também, como princípio de enfrentamento como elite, acabaram se convertendo aos favores, ao toma lá, dá cá das coisas do poder.

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Na época das 10 Medidas o senhor foi um dos ferrenhos defensores da proposta e o senhor defende o combate à corrupção…

Randolfe: Me permita só completar. Eu considero que as 10 Medidas foram uma mobilização necessária. E esse foi um dos pontos em que se divorciou o diálogo dos setores democráticos progressistas [de esquerda] com a sociedade, ao criminalizar as 10 Medidas.

O senhor naquela época também era um ferrenho defensor da Lava Jato. A opinião do senhor sobre a operação e sobre a força-tarefa mudou?

Randolfe: Em absoluto. Continuo defendendo a Operação Lava Jato. Só lamento ela ter se esvaziado no governo Bolsonaro; de ter, durante o governo Bolsonaro, diminuído o número de operações da Polícia Federal. E eu só lamento mais ainda o hoje ministro da Justiça, Sergio Moro, que eu outrora inclusive defendi aqui como juiz da Lava Jato, ter se convertido ao governo, ter demonstrado que… um magistrado tem que honrar a toga. Quando um magistrado rasga a toga e passa a atuar partidariamente, ele deixa de ser magistrado e compromete inclusive a credibilidade de operações como foi o caso da operação Lava Jato.

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Em que momento o senhor acha que ele passou a atuar partidariamente?

Randolfe: Em especial quando aceitou o convite para ser ministro da Justiça de Jair Bolsonaro. E, a partir daí, as posições que ele assume passam a ser posições políticas, claramente. Os casos que envolvem o governo Bolsonaro, ele fala muito pouco. Os milicianos, o Queiroz, as denúncias de corrupção que existem no próprio governo. Tem um colega de ministério dele que deve sentar ao lado dele nas reuniões de ministério, que é o ministro Turismo [Marcelo Álvaro Antônio], que está enrolado até o pescoço com esquemas de laranjas. Um outro foi denunciado pelo Ministério Público, o senhor Ricardo Salles [ministro do Meio Ambiente]. E ele convive bem, sem problema com isso. Não acho que isso faça jus ao que outrora ele foi. Essa é a crítica que eu faço.

Essa semana eu vi, ao invés de dar uma resposta concreta ao que cada vez mais me parece que foi um episódio de queima de arquivo, o atentado contra o miliciano lá na Bahia, ele [Moro] essa semana dá uma entrevista dizendo que o miliciano foi morto pela polícia do PT. Ora, não é comportamento de ministro da Justiça dizer que a Polícia Militar de um estado é polícia de um partido político. Não é o tipo de comportamento adequado. Ele fica muito parecido, cada vez mais ele tenta se aproximar do senhor Jair Bolsonaro, mais ele passa a se assemelhar e mais isso denota contra a biografia dele.

Na opinião do senhor, quais são os principais pontos que marcam a atuação do governo até aqui? O que o senhor considera que seja a marca do governo?

Randolfe: Como eu sou da Amazônia, eu acho que poderia apontar como primeira [marca] os retrocessos na área ambiental. O aumento do desmatamento da Amazônia, o aumento da vulnerabilização das populações originárias, dos povos indígenas, dos riscos que esses povos estão correndo. Mas eu também tenho que incluir aí os retrocessos na área social. Aumentou o número de fila de programas sociais como o Bolsa Família, foram destruídos programas sociais como o Minha Casa, Minha Vida neste último ano que passou. Eu poderia também ficar só nesses dois exemplos, mas não posso deixar de lembrar os retrocessos que teve na área da educação. Veja, mais de 60% dos contratos feitos no Ministério da Educação por parte desse cidadão que está lá no ministério [Abraham Weintraub] foram sem licitações. Ele deixou de executar no ano passado R$ 1 bilhão que foram resgatados da operação Lava Jato. Com esse dinheiro dava para construir quase 17 milhões creches por todo o Brasil – em um país em que 65% das crianças não têm creche.

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Poderia parar somente aí, mas este último ano, embora fazendo um rápido balanço, a gente tenha visto uma tímida recuperação do emprego, mas temos visto o aumento do subemprego, do trabalho precarizado. E isso cria uma legião... alguns tentam colocar nome pomposo para isso: "Esses são empreendedores". Não são empreendedores. Quem está na condição de desempregado crônico, para não ir para o caminho da criminalidade e para não ver a família passar fome, vai caminhar para o subemprego. Vai para a esquina vender alguma coisa, vai montar algum tipo de atividade que não é propriamente empreendedorismo. É a última ratio para não ficar subjugado pelo fantasma do desemprego. Então, lamentavelmente esses dados não têm sido bons. E temos visto nesse período também o aumento da desigualdade no país.

O senhor acredita que há espaço para avançar na pauta econômica e de reformas em 2020, apesar do ano eleitoral?

Randolfe: A reforma administrativa foi sabotada pelo próprio ministro da Economia [Paulo Guedes] quando ele chama todos os servidores públicos de parasitas. Quando ele chama [de parasita] o enfermeiro e os médicos que atendem os hospitais, os professores que atendem nas escolas, os policiais militares que garantem a segurança. Quando ele rotula esses [servidores], ele cria uma reação para discutir qualquer tipo de reforma. Então eu vejo que a reforma foi sabotada pelo próprio Executivo e pelas declarações do ministro da Economia.

A reforma tributária, um bom ponto de partida seria o próprio governo dizer qual reforma quer. Porque o próprio governo não sabe e não propõe reforma. Temos dois modelos de reforma: uma proposta pela Câmara dos Deputados e outra proposta aqui pelo Senado. E do governo nós não temos uma proposta concreta. E não sabemos qual é a ideia e qual a proposta que o governo quer apresentar.

Outro tema popular no Congresso ultimamente é a prisão em segunda instância. Qual a opinião do senhor sobre o tema e qual das duas propostas o senhor acha melhor?

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Randolfe: Sou favorável. Se responder qual é a mais eficaz, poderia ser modificando a Constituição [proposta que está na Câmara]. Mas o que eu acho que é mais breve e perfeitamente cabível e tem, inclusive, jurisprudências que proclamam nesse sentido, é a proposta que tramita de alteração do Código de Processo Penal que está aqui na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Acho que essa deveria avançar.

Qual a avaliação do senhor sobre a cassação da senadora Juíza Selma? Alcolumbre chegou a dizer que a Mesa poderia adotar um entendimento que contrariasse a decisão do TSE... depois mudou de ideia. O senhor defende que se aguarde o julgamento de todos os recursos, inclusive no STF? 

Randolfe: Tem que somente ser cumprido o rito. Esse caso não é inédito na Casa. Se fosse inédito, até diria que teria que ser feito um tipo de interpretação ou teria que dar cabo ao encaminhamento da decisão da última instância. Mas já teve uma situação igual a essa anteriormente, que foi no caso da cassação do mandato do senador João Capiberibe, inclusive do meu estado. Naquele caso, foi seguido um rito para o processo, ou seja, o rito que está previsto na própria Constituição – que estabelece quantas sessões tem que ter, a designação de defensor, se não ocorrer a designação de defensor, defensor dativo, e após tantas sessões a apresentação da defesa. Ou seja, tem um rito a ser seguido. O que a Constituição reza é sobre isso. Tem um rito a ser seguido e eu acho que a Mesa fez corretamente o estabelecimento do rito.

O que o senhor acha dessa ideia, que volta e meia reaparece na Câmara ou no Senado, de mudar a Constituição ou o Regimento Interno para permitir reeleição para o cargo de presidente das duas Casas? 

Randolfe: Primeiro, não vejo como seja possível. O artigo 57, parágrafo quarto da Constituição, para mim a letra é clara: não abre margem a interpretações. E fala isso para você um já maduro professor de Direito Constitucional. Não vou dizer velho professor de Direito Constitucional porque eu não tenho tanto tempo assim, não. Mas, ao lecionar Direito Constitucional aos meus alunos e ao explicitar o disposto na Constituição nesse dispositivo, eu não vejo como a Constituição abre possibilidade para isso. É lógico que isso não é cláusula pétrea. Não sendo cláusula pétrea, pode ser objeto de uma proposta de emenda à Constituição. Então, tendo uma proposta de emenda à Constituição, ela deve ser analisada. Mas não vejo outra forma de modificação que não seja alterando o artigo 57, parágrafo quarto da Constituição. Para mim, essa é a única forma de alteração desse dispositivo.

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Qual a avaliação do senhor em relação ao ritmo de trabalho da CPMI das Fake News e ao episódio da semana passada, em que um depoente [Hans River do Rio Nascimento] insultou uma jornalista? 

Randolfe: Naquele momento da CPMI que ocorreu a ofensa machista, misógina contra a Patrícia [Campos Mello, jornalista da Folha de S.Paulo], lamentavelmente eu não estava na CPMI porque eu estava relatando em outra comissão, no mesmo momento, a MP do 13.º do Bolsa Família. Isso me impediu de estar na CPMI. Mas alguém deveria ter dado voz de prisão àquele indivíduo. Aquele indivíduo é um criminoso. Estou propondo que ele seja reconvocado à CPMI para ele reafirmar o que disse, e reafirmando o que disse, eu acho que tem que ser tomada uma medida mais drástica. A CPMI não pode ser desrespeitada como foi naquele momento.

Eu estou com esperança na CPMI. Alguma coisa tem que ser feito em relação ao esquema criminoso que opera, no meu sentir, nos porões da Presidência da República e com endereço certo, aqui do lado, no Palácio do Planalto. Opera um esquema criminoso, de destruição de reputações. Não é só destruição de reputações; é um esquema criminoso de distorção de fatos, de distorção de fatos que pode levar a crimes mais graves ainda. Esse esquema criminoso que se instituiu no Brasil tem que ter uma reação por parte do Estado brasileiro. Minha esperança é que essa CPMI possa concluir algo a respeito.

O partido do senhor tem enfrentado dificuldades para crescer e corre risco por causa da cláusula de barreira [mecanismo que pune partidos que têm desempenho fraco nas eleições]. Como o senhor avalia essa dificuldade e como o partido pode superar isso?

Randolfe: Na verdade, já esbarramos [na cláusula de barreira] em 2018. Nós funcionamos e conseguimos passar o ano de 2019 funcionando no Brasil todo sem receber [dinheiro do] Fundo Partidário [uma das punições prevista pela cláusula]. E vamos participar dessas eleições [de 2020] concorrendo em milhares de cidades pelo Brasil em todos os 27 estados da federação. A Rede surgiu como partido político para hackear o sistema político e criar uma alternativa solidária, sustentável e democrática. Não pode ser, ao primeiro revés, que o partido tenha que sucumbir. Vamos passar por essa eleição de 2020.

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Tem os diálogos com outros partidos para a possibilidade inclusive de fusão. Esse diálogo travamos em especial com o Partido Verde. Pelo menos, apesar das dificuldades que estamos tendo por já estarmos sob a égide das restrições da cláusula de barreira, é fato que somos o único partido político de 2018 que não alcançou a cláusula de barreira, mas que tem conseguido resistir.

O partido pode abrigar a ex-prefeita de São Paulo Marta Suplicy, para que ela concorra às eleições de 2020? Uma coligação com PT é cogitada?

Randolfe: Por mim, ela se filiava ontem – de preferência antes do meio-dia. Sou um dos entusiastas de filiação de Marta à Rede. Tenho ótimas referências com a Marta. Convivi com ela aqui no Senado. Ela tem uma longa e belíssima trajetória política; fez um belo governo na cidade de São Paulo, com ótimas referências, com obras para o povo, principalmente para o povo mais pobre. Então, por mim filiava [a Marta] ontem. Mas esse é um debate que os companheiros da Rede no estado de São Paulo estão travando com ela.

Nós não temos restrições a qualquer tipo de coligação com o Partido dos Trabalhadores. Aliás, queremos fazer, temos uma prioridade de campo de oposição. Nós construímos um bloco parlamentar aqui no Senado e esse é o foco de nosso campo de oposição de atuação em todo o Brasil: PDT, PSB e PV. A prioridade são coligações com essas [legendas], mas não vetamos coligações com partidos que se oponham à onda, às ameaças à democracia que estão em curso hoje no Brasil. Não temos nenhum tipo de restrição.

Esse bloco permanece unido para 2022?

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Randolfe: É esse meu desejo. É para isso que estou trabalhando; é para isto que estou me dedicando. E eu tenho certeza que caminhará assim.

E já tem um nome para encabeçar a disputa [presidencial]?

Randolfe: Tem vários. Ciro [Gomes, do PDT] é um dos nomes. Acho que é o nome mais forte desta aliança. Mas sem veto ao surgimento de outras alternativas dentro do mesmo bloco. O próprio nome de Marina [Silva] sempre é colocado, sempre vem à tona. O PSB tem belíssimos quadros. Tem muita coisa para acontecer até 2022. Mas o importante é este bloco desses quatro partidos estarem juntos. Estamos juntos desde o ano passado. Estamos juntos até 2022.

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