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Finanças

Reforma da Previdência é importante, mas cobre só 25% do rombo das contas públicas

Agência do INSS, Previdência Social
Aprovação da reforma da Previdência, embora não gere efeitos fiscais tão grandes nos primeiros anos, colabora para a redução do custo da dívida pública. (Foto: André Rodrigues/Gazeta do Povo)

Reformar a Previdência abre o caminho para colocar as contas públicas em ordem, mas não é suficiente para o governo sair do vermelho porque essa mudança não gera efeitos fiscais tão relevantes nos primeiros anos. Projeção da Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão ligado ao Senado Federal, mostra que acabar com o rombo das finanças e alcançar o superávit primário é um desafio que vai exigir cerca de R$ 450 bilhões nos próximos cinco a seis anos. A Previdência só cobre um quarto desse valor, e reverter essa trajetória exige discutir a qualidade do ajuste fiscal que será feito.

O atual quadro fiscal da União é muito restrito: a arrecadação cresce pouco, os sinais de recuperação da economia são incipientes e a União já cortou muito das próprias despesas – basta ver o contingenciamento de verbas do governo neste ano e a projeção de gastos discricionários para 2020. A solução para esse cenário intrincado é mudar o gasto obrigatório, observa o diretor-executivo da IFI, o economista Felipe Salto. “A Previdência é o principal, seguido do gasto de pessoal”, lembra.

A aprovação da reforma da Previdência, embora não gere efeitos fiscais tão grandes nos primeiros anos porque é uma mudança exponencial, colabora indiretamente para um ajuste, como a redução do custo da dívida pública. As projeções da IFI mostram que entre cinco e seis anos, a dívida pública deve chegar a 85% do PIB do país – hoje, ela está em 79% e vai crescer mesmo com a aprovação das novas regras de aposentadoria.

Salto explica que aí virá um esforço para estabilizar essa dívida, que dependerá também do crescimento do PIB e dos juros reais. No cenário base – com a dívida travada em 85% do PIB, o crescimento do país na faixa de 2% ao ano e os juros reais em torno de 4% –, o superávit necessário seria de 1,6% do PIB. “Hoje, temos um déficit de 1,5% do PIB. Teríamos de zerá-lo e fazer mais isso. São R$ 450 bilhões, no período de cinco a seis anos, e a Previdência só vai colaborar com um quarto disso”, explica.

E o resto, vem de onde?

Para equilibrar as contas, o governo optou por reduzir as despesas discricionárias, aquelas de livre escolha para o gasto público, e que envolvem também os investimentos. “A partir de 2014, fica clara a estratégia de restringir as despesas discricionárias para impedir uma piora mais acentuada do resultado primário da União”, observa o Relatório de Acompanhamento Fiscal (RAF) de setembro da IFI.

A consequência dessa escolha aparece já na proposta de lei orçamentária (PLOA) para 2020: as despesas discricionárias do governo para o próximo ano somam R$ 89,1 bilhões. Desse montante, só R$ 19 bilhões serão usados para investimentos, o menor patamar dos últimos 15 anos. “A estratégia de promover o ajuste sobre os gastos discricionários tem como limite o comprometimento do funcionamento da máquina pública”, pondera o RAF. O problema aqui é que, se o corte for maior, o governo pode parar.

Para Salto e a IFI, essa concentração de despesas reduzidas no gasto discricionário revela a qualidade ruim do ajuste. A medida mais acertada seria empreender soluções estruturantes, como uma ampla reforma administrativa que permitisse disciplinar a evolução das despesas obrigatórias do país.

“É preciso ter em mente que as despesas públicas são orientadas por alguns vetores, como a política de contratações e reajustes salariais no serviço público; a evolução do salário mínimo, instrumento indexador de alguns programas federais; as regras de vinculação, que determinam percentuais mínimo do orçamento a serem aplicados em determinadas áreas; indexadores definidos em lei, os quais determinam a correção de algumas rubricas da despesa; entre outros”, observa o RAF.

Qualidade do ajuste

Mexer nos gastos obrigatórios implica em uma ampla discussão que envolve temas sensíveis, como funcionalismo público e gasto social, além de ajuste da carga tributária. “Quando a reforma da Previdência, que era quase um tabu, está conseguindo avançar é algo positivo. Um quadro fiscal muito grave faz com que surja essa oportunidade de olhar para o orçamento público”, avalia Salto.

Para ele, as discussões mais urgentes envolvem uma reforma administrativa do estado, que rediscuta carreiras, salários e tipos de cargos e funções, e também os gastos sociais. “Abono-salarial, BPC [Benefício de Prestação Continuada, um tipo de aposentadoria paga a idosos muito pobres] e seguro-desemprego são gastos meritórios, mas precisamos discutir a indexação [com o salário mínimo]”, aponta.

Quando tudo isso está relacionado às contas públicas, ainda se adicionam mais componentes complexos, como a Emenda Constitucional 95, que fixou o teto de gastos, e dispõem de gatilhos para fazer um ajuste forçado em caso de rompimento. A projeção da IFI é de que o rompimento do teto de gastos deve ocorrer em 2022, podendo ser antecipado em um ano, a depender dos avanços da economia.

Evitar o rompimento seria melhor, mas ele está previsto na Constituição – e estabelece medidas a serem tomadas para colocar as contas em ordem. Esses gatilhos basicamente reduzem gastos com pessoal: se descumprido o teto, não há mais reajuste para o funcionalismo e não poderão ser realizados concursos públicos. Essas medidas são tomadas para evitar a paralisação da máquina pública, que já terá seu funcionamento afetado.

Para Salto, o governo precisa trabalhar para ter um baseline, com projeções mais afinadas para relacionar o gasto de cada despesa com base em cenários macroeconômicos. Isso ajudaria a União a ter mais clareza dos cenários reais, possibilitando escolhas econômicas mais seguras. “Para quem não sabe onde quer chegar, qualquer vento é desfavorável”, lembra o economista.

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