O ambiente no Senado, que passa a avaliar a reforma da Previdência após a aprovação em dois turnos na Câmara, está favorável à inclusão de estados e municípios no novo sistema de aposentadorias e pensões do país. Entre os parlamentares há um certo otimismo em torno do tema. A oposição ainda avalia a estratégia para enfrentar a reforma no Senado, mas a parte que envolve estados e municípios encontra apoio até mesmo dentro do PT – no mês passado, o governador do Piauí, Wellington Dias (PT), se manifestou a favor da inclusão.
"Vejo hoje um clima bastante favorável", declarou o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE). Senadores avaliam que a atmosfera entre os colegas, hoje, é similar à do início do recesso parlamentar: "naquela época, estávamos em um clima de acordo total quanto a esse tema, e não acho que isso foi modificado", disse Márcio Bittar (MDB-AC).
A sensação foi causada principalmente pelo expressivo resultado do primeiro turno da votação da reforma da Previdência na Câmara. Na ocasião, em 10 de julho, o "sim" para a reforma recebeu 379 votos – número bem superior aos 308 necessários para a aprovação. Além do resultado em si, houve uma grande celebração em torno da unidade da Câmara e da capacidade de articulação do presidente da casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Agora, no segundo turno, a aprovação também foi por ampla maioria, com 370 votos favoráveis. O ambiente de "Legislativo forte" foi também ao Senado, o que reforça o otimismo.
Na última segunda-feira (5), o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), recebeu em sua residência oficial Maia e o ministro da Fazenda, Paulo Guedes. Ao final do encontro, Alcolumbre elogiou a atuação de Maia ao longo do primeiro semestre. "A Câmara apresentou ao Brasil uma proposta que vai equilibrar as contas públicas, que vai fazer justiça com o Estado brasileiro", ressaltou.
Assim como na Câmara, o PSDB terá a relatoria da reforma da Previdência no Senado. Os trabalhos ficarão a cargo de Tasso Jereissati (CE), que também é a favor da inclusão dos servidores estaduais e municipais. Em entrevista ao jornal O Globo, em julho, o tucano disse acreditar que o Senado faça o procedimento. "A chance aqui é grande. Não posso garantir que vai ser aprovada porque vamos discutir e temos opiniões diversas, mas a possibilidade, pelo que senti conversando com senadores, é muito grande", falou à época.
Do "se" ao "como"
A confiança de que o Senado incluirá servidores de estados e municípios na reforma da Previdência abre caminho para que o debate passe à maneira como isso deve ocorrer.
Um receio comum entre os senadores é o de fazer uma simples modificação no texto, adicionando estados e municípios nas regras aprovadas pela Câmara. Isso porque se o procedimento for feito dessa forma, o texto terá que retornar à avaliação dos deputados – o que retardará ainda mais a efetivação da reforma e poderá trazer riscos para o texto.
Por isso tem ganhado força a ideia da "PEC paralela", isto é, da elaboração, pelos senadores, de uma nova Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que fale especificamente sobre os funcionários estaduais e municipais. Por não ter ligação com a reforma principal, o texto correria de maneira independente e não impediria que parte da reforma entrasse em vigor com maior celeridade. "A PEC paralela é a solução mais simples. E às vezes as soluções mais simples são as mais eficientes", disse Bittar.
A senadora Simone Tebet (MDB-MS) diz ainda que existe a alternativa de leis complementares regulamentarem a Previdência de estados e municípios. "Há a possibilidade também de colocarmos os estados e municípios por meio de uma lei complementar. Assim, cada um faria a sua própria reforma, ou escolheria a reforma nacional. É algo que não exigiria quórum qualificado, e portanto tornaria mais fácil a tramitação nas assembleias e câmaras de vereadores", disse Simone, que é presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), por onde a análise da reforma da Previdência no Senado começará.
No último dia 2, Alcolumbre disse acreditar que a temática dos estados e municípios deve ficar para o plenário do Senado, não sendo votada nas comissões.
O que pensa a oposição?
Os oposicionistas ainda discutem a estratégia a ser adotada para o embate em torno da reforma da Previdência. Tanto na Câmara quanto no Senado, parlamentares da oposição têm feito reuniões constantes.
Os adversários do governo de Jair Bolsonaro (PSL) sentiram o baque com a aprovação massiva da reforma na Câmara. Como pontos mais controversos do projeto apresentado por Paulo Guedes, como as modificações no Benefício de Prestação Continuada (BPC) e na aposentadoria rural, foram excluídos pela Câmara, o entendimento de muitos parlamentares de centro foi o de que a reforma já havia adquirido um texto mais "palatável" à população.
A deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que é líder da Minoria na Câmara, disse que parte do foco da oposição estará nos destaques supressivos da reforma – segmento em que o grupo conseguiu algumas vitórias no primeiro turno da votação, em alguns casos com o apoio de deputados que costumam votar com o governo Bolsonaro.
A opinião da senadora Simone Tebet é a de que o quadro levará a uma tramitação de certo modo ágil da reforma no Senado. "Não acredito em unanimidade, e sei que a oposição apresentará destaques, emendas, fará o seu papel. Mas vejo ser possível aprovar tudo num prazo de 45 a 60 dias", disse.
Parte da "reforma desidratada"
A retirada dos servidores estaduais foi parte de um cenário de modificações no projeto da reforma da Previdência que levou a alteração a ser considerada, por aliados e apoiadores do governo Bolsonaro, como uma "reforma desidratada".
Além dos temas controversos – e em torno dos quais havia certo grau de consenso, como o BPC e as aposentadorias rurais, – a Câmara contrariou Paulo Guedes ao descartar o sistema de capitalização e concedeu aposentadorias especiais a diversas categorias profissionais, como professores e policiais federais. Neste último ponto, a Casa viu um inusitado embate entre a equipe econômica do governo e alguns deputados bolsonaristas, que não abriam mão de privilegiar segmentos do funcionalismo.
A exclusão dos estados e municípios foi interpretada como uma jogada política. Os deputados entendiam que a reforma era impopular para a sociedade e temiam carregar sozinhos o ônus da aprovação da medida. Muitos se queixaram da postura de alguns governadores, que contestavam a reforma em público, mas a defendiam nos bastidores, por entenderem que a proposta traria ganhos econômicos.