A ideia de a CPI da Covid no Senado investigar também a atuação de prefeitos e governadores, defendida abertamente pelo presidente Jair Bolsonaro, pode esbarrar em um impeditivo legal. O Regimento Interno do Senado determina que assuntos relativos aos estados não podem ser apurados por Comissão Parlamentar de Inquérito. O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), deve acionar a Secretaria-Geral da Mesa do Senado nesta terça-feira (13) para obter um parecer definitivo sobre o assunto.
O texto do Regimento diz em seu artigo 146: "Não se admitirá comissão parlamentar de inquérito sobre matérias pertinentes: I - à Câmara dos Deputados; II - às atribuições do Poder Judiciário; III - aos Estados". Para juristas, entretanto, o fato de o tema em questão ter relação com verbas que o governo federal repassou aos estados permite a realização da investigação.
A proposta inicial da CPI da Covid, sugerida pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), era de promover uma investigação sobre supostas omissões do governo federal no combate à pandemia de coronavírus. Defensores do governo e mesmo parlamentares de centro sugerem a expansão do foco da comissão para analisar os atos de prefeitos e governadores no enfrentamento ao vírus. A mobilização para o aumento do escopo cresceu desde que o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou na semana passada a instalação da CPI, que vinha sendo adiada por Pacheco.
Desde então, os senadores que defendem a investigação sobre os outros entes têm atuado em dois focos: ampliar a margem de apuração da CPI proposta por Randolfe ou sugerir a criação de outra CPI, focada desde o início na análise de União, estados e municípios. Esta última iniciativa é encabeçada pelo senador Eduardo Girão (Podemos-CE), que coletou, até a noite da segunda-feira (12), 37 assinaturas em defesa da proposta. O número supera em 10 o mínimo exigido para a criação de uma CPI. O pedido de Randolfe tem 34 assinaturas.
Fiscalização federal é precedente para CPI, diz assessoria de senador
"A CPI deve investigar estados, municípios e União. Esse é o desejo do povo brasileiro. Que não quer parte da verdade apenas, quer toda a verdade", declarou o senador Girão. O parlamentar produziu seu pedido de CPI ainda no início de março. Mas, segundo ele, a adesão à proposta ocorreu em resposta à medida de Barroso, que ele considerou uma "invasão" do STF sobre o Congresso.
Para Girão, a liminar de Barroso criou um cenário de indignação que levou outros senadores a apoiarem o seu pedido de CPI. A maior parte das assinaturas foi coletada no último fim de semana, poucos dias após Barroso obrigar a abertura da CPI proposta por Randolfe.
Em relação à vedação da investigação sobre estados, a assessoria de Girão disse que aguardará um posicionamento do corpo jurídico. Mas destacou que seu entendimento é de que os atos dos gestores municipais e estaduais, quando envolverem a administração de recursos de origem federal, podem ser analisados por uma CPI do Senado.
Como precedente, a assessoria cita a fiscalização feita pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que é o responsável por observar os gastos de prefeitos e outros entes que lidam com verbas transferidas pelo governo federal. "Nesses casos, a jurisdição dos tribunais de contas estaduais e municipais cede lugar à jurisdição federal", disse a nota enviada pela assessoria do parlamentar.
Regimento quer combater perseguição; mas é preciso fato determinado
O advogado Camilo Onoda Caldas, sócio do escritório Gomes, Almeida e Caldas Advocacia, vê como possível a realização de uma investigação, por meio de uma CPI do Senado, de uma conduta dos governadores estaduais, apesar da limitação do Regimento Interno da Casa. O argumento que ele cita é similar aos apresentado pela assessoria do senador Girão: o de que o envolvimento de verbas federais torna o assunto de interesse de um órgão nacional, como o Senado.
Mas, na sua avaliação, é necessário que uma eventual apuração do desempenho de prefeitos e governadores parta de um fato determinado, e não de citações genéricas. "São 27 governadores e mais de 5 mil prefeitos. Quais serão investigados? De modo genérico é algo que não pode ser feito. Uma CPI tem prazo determinado e precisa ter também um objeto", explicou.
Caldas disse que a preocupação do Regimento do Senado ao colocar o veto a investigações sobre estados é o de evitar que a Casa promova perseguições sobre desafetos locais de parlamentares, ou a inimigos do governo federal. E também de impedir que o Senado puxe para si funções que devem ser executadas por outros órgãos. "Quando há uma denúncia contra um governador, via de regra cabe ao estado, à Assembleia Legislativa, fazer a investigação", disse.
Segundo o advogado, o dispositivo do Regimento poderá ser utilizado por governadores para questionar a instalação ou a continuidade da CPI. "É possível que um governador vá ao STF buscar a derrubada da CPI. É uma questão controversa. Então é possível que o STF se manifeste; e assim como se manifestou para abrir, pode se manifestar para derrubar", declarou.
Nesse caso, existe um precedente: em abril de 2014, a ministra Rosa Weber, do STF, impediu que a CPI da Petrobras no Senado fosse ampliada com um "jabuti" para apurar contratos relativos aos trens e metrôs de São Paulo e do Distrito Federal.
- Como a pressão por inclusão de estados e municípios influencia os rumos da CPI da Covid
- Planalto vê “oportunidades” na CPI da Covid: o que Bolsonaro pode ganhar
- Kassio será relator de pedido para obrigar Senado a analisar impeachment de Alexandre de Moraes
- Flávio Arns assina e CPI da Covid passa a contar com apoio dos três senadores paranaenses
Triângulo Mineiro investe na prospecção de talentos para impulsionar polo de inovação
Investimentos no Vale do Lítio estimulam economia da região mais pobre de Minas Gerais
Conheça o município paranaense que impulsiona a produção de mel no Brasil
Decisões de Toffoli sobre Odebrecht duram meses sem previsão de julgamento no STF