Jair Bolsonaro (PSL) já começou seu mandato na Presidência da República nas mãos do Congresso. Para que parte dos gastos correntes do governo não ficasse descoberto, a gestão dependia da aprovação de um crédito suplementar pelos parlamentares. Os R$ 248,9 bilhões que estavam condicionados à anuência do Parlamento incluíam gastos com benefícios previdenciários e com o Bolsa Família, por exemplo. Felizmente para o governo, isso acabou aprovado.
Para 2020, o montante "extra" do qual depende o governo será ainda maior: de acordo com o projeto de Lei Orçamentária, encaminhado pelo governo ao Congresso no final de agosto, são R$ 367 bilhões. Essa fatia do orçamento, rotulada como "despesa condicionada", tem maior peso, em números absolutos, no pagamento de benefícios previdenciários e de pessoal e encargos. Seguro desemprego, Bolsa Família e financiamento da campanha eleitoral do ano que vem também podem ser afetados.
Exigência é constitucional
O motivo pelo qual o governo precisa fazer essa manobra contábil está no inciso III do artigo 167 da Constituição. O texto impede "a realização de operações de crédito que excedam o montante das despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta".
Na prática, trata-se da norma conhecida como "regra de ouro", que impede que o governo se endivide para pagar as chamadas despesas correntes. Pela regra, novos empréstimos podem ser feitos somente para custear despesas de capital, que incluem os investimentos – a não ser que haja autorização pelo Congresso, por meio da aprovação de crédito suplementar.
A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) prevê que a apuração do cumprimento da regra deve ser feita anualmente. Se o texto for desrespeitado, o governante incorre em crime de responsabilidade.
Cenário vem piorando
Historicamente, desde que a regra foi estabelecida, o governo brasileiro vinha conseguindo cumprir a meta com alguma folga, sem precisar recorrer aos créditos suplementares. Em 2018, o Tesouro Nacional já previa que haveria dificuldades, mas o governo contava com devoluções do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Neste ano, porém, as contas não fecharam – e a situação deve se agravar no futuro. "Originalmente, a ideia é salutar, porque cria dificuldades para o endividamento. O problema é que a arrecadação está caindo, enquanto as despesas consideradas correntes têm crescimento vegetativo. É um poço sem fundo", opina Adriano Biava, professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP).
Segundo relatório produzido pela Instituição Fiscal Independente (IFI), mais de um quarto do orçamento de 2020 está condicionado à aprovação do Congresso. Em média, 25,8% dos gastos estão nessa situação. As projeções da Instituição apontam que o governo deve ter algum tempo para destravar essa fatia do orçamento.
"A parcela dessas despesas que não estiver condicionada deve ser suficiente para os primeiros meses do ano, sendo necessária a aprovação do crédito adicional para a execução das despesas no restante do exercício", diz o documento.
As exceções são o pagamento de subsídios e subvenções (essas últimas destinadas para empresas públicas), além da compensação da Previdência pela desoneração da folha de pagamento. Nesses dois casos, de acordo com o relatório, "a parcela autorizada pode não ser suficiente para os primeiros meses do ano, em que geralmente mais da metade da execução dessas rubricas costuma ocorrer".
Alternativas para o futuro
Na opinião do professor da USP, um dos problemas para o cumprimento da regra de ouro diz respeito à classificação dos gastos em despesas correntes e de capital. "O que nós deveríamos ter é uma regra para todas as despesas correntes do governo, incluindo a dívida. Hoje há um tratamento privilegiado para os gastos relativos ao endividamento, que ficam obscurecidos, enquanto outros setores, sociais, são prejudicados", diz Biava.
Ele se refere ao fato de que, entre as despesas de capital, são somados investimentos e também o custo para amortização da dívida e concessões de empréstimos. Esse tipo de gasto, portanto, não fica condicionado à aprovação do Congresso, mesmo em cenários de dificuldade fiscal.
Outra alternativa já está em discussão no Congresso Nacional, por meio de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que propõe mudar esse dispositivo legal. De autoria do deputado Pedro Paulo (DEM-RJ), a PEC 438, de 2018, prevê o fim da autorização para créditos suplementares no Congresso. Pelo texto, se o governo descumprir a regra de ouro, precisará cumprir providências de acordo com os limites estabelecidos em lei.
Entre as medidas previstas estão a suspensão de repasses ao BNDES e a permissão para a redução temporária da jornada de trabalho dos servidores públicos.
Triângulo Mineiro investe na prospecção de talentos para impulsionar polo de inovação
Investimentos no Vale do Lítio estimulam economia da região mais pobre de Minas Gerais
Conheça o município paranaense que impulsiona a produção de mel no Brasil
Decisões de Toffoli sobre Odebrecht duram meses sem previsão de julgamento no STF