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O ministro Benedito Gonçalves, do Tribunal Superior Eleitoral, votou por condenar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por suposto uso eleitoral do 7 de setembro de 2022 durante a comemoração do Bicentenário da Independência. O julgamento começou na terça (24) com a leitura do relatório inicial das ações e seguiu nesta quinta (26).
O voto de Gonçalves foi seguido pelo ministro Floriano de Azevedo Marques e contestado por Raul Araújo. A sessão foi suspensa em virtude do horário e será retomada na próxima terça (31) para os demais ministros apresentarem votos e concluírem o julgamento.
Os magistrados analisam uma ação apresentada pelo PDT, que trata somente sobre os eventos em Brasília, e duas ações protocoladas pela senadora Soraya Thronicke (União-MS) sobre os eventos de Brasília e do Rio de Janeiro.
Gonçalves afirmou, no relatório, que a “exploração eleitoral de símbolos do poder público afeta bens impassíveis de serem estimados financeiramente, e transmite sentidos perceptíveis pelo eleitorado que podem redundar em quebra de isonomia”, disse.
“Essas pessoas, ao se habilitarem para concorrer às eleições, sujeitam-se a ter suas condutas rigorosamente avaliadas com base em padrões democráticos calcados na isonomia, na normalidade eleitoral, no respeito à legitimidade dos resultados e na liberdade do voto”, disse.
Benedito Gonçalves fez, ainda, um relato das ações de Bolsonaro naquele dia, como uma entrevista trajando a faixa presidencial, cumprimentou as pessoas presentes nas comemorações na Esplanada e o empresário Luciano Hang, realizou um suposto comício eleitoral em cima de um carro elétrico e, depois, viajou ao Rio de Janeiro, onde seguiu a celebração.
O ministro ressaltou que as ações e declarações dadas por Bolsonaro durante os atos foram semelhantes às usadas por ele durante a própria campanha eleitoral, o que comprovaria o desvio de finalidade das comemorações do 7 de setembro.
A divergência foi aberta pelo ministro Raul Araújo, que questionou algumas das alegações das ações, afirmando que Bolsonaro não participou de comícios eleitorais em Brasília e no Rio de Janeiro trajando a faixa presidencial, o que afastaria a figura simultânea de presidente e de candidato.
“Apenas se se considera esses dois atos muito distintos, o desfile oficial e um ocasional comício após a realização desses atos, não vejo como se caracterizar qualquer conduta vedada”, disse o magistrado ressaltando que Bolsonaro participou de comícios apenas após os eventos cívicos oficiais, e que manifestações a favor e contra ele durante as comemorações do Bicentenário ocorreram em todo o país.
Estas constatações, segundo ele, não configurariam desvio de finalidade e abuso de poder político do ex-presidente.
Já Marques votou a favor da condenação afirmando que Bolsonaro convocou a população para participar dos eventos cívicos em peças de campanha, mas utilizando o “mesmo slogan do candidato” e “prenunciando a confusão entre a mensagem cívica patriótica e a mensagem eleitoral”.
O magistrado citou, ainda, a participação de uma manifestação de agricultores com máquinas agrícolas na Esplanada, a presença de Hang na tribuna oficial e a presença do presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, que teria ficado "incrédulo e abespinhado" no que seria uma "cena de palanque eleitoral".
"Combinando com os motes de campanha, patriotismo, cores verde e amarelo, nacionalismo, militarismo, força representada pelas armas, com o contexto cívico da parada, abusar em seu proveito eleitoral de condição que não se oferece evidentemente paritária aos demais candidatos. Exemplo típico de abuso de poder político", disse.
O voto de Benedito Gonçalves pediu que Bolsonaro seja condenado à inelegibilidade por oito anos seguintes ao pleito em discussão e multa de R$ 425,6 mil. E a Walter Braga Neto, então candidato a vice, apenas a uma multa de R$ 212 mil.
No último dia 14, a Procuradoria Geral Eleitoral (PGE) se manifestou pela inelegibilidade do ex-presidente por supostos abusos nas comemorações do 7 de Setembro. O órgão defendeu que houve uma “apropriação” de segmentos da estrutura administrativa do estado “com desvirtuamento de atos oficiais comemorativos de data de singular relevância simbólica no calendário cívico”.
O advogado Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, que representa o ex-presidente, negou as acusações e pedia a rejeição das ações. “A tese da defesa é sim, embora tenha desagradado aos autores, a existência de um cisão factual entre momentos diversos, entre uma fase do dia em que Bolsonaro era presidente e outra fase do dia em que Bolsonaro, como qualquer outro dos candidatos, era também candidato”, ressaltou. O advogado afirmou ainda que não houve uso de bem público, apenas gastos públicos com os eventos oficiais.
Ele argumentou que a equipe de campanha retirou do ar, por conta própria, imagens que mostravam o então mandatário nos eventos. Carvalho citou que seis testemunhas foram ouvidas durante a tramitação do processo.