A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPMI) do 8 de janeiro retomará as sessões nesta terça-feira (1º) com a audiência de Saulo Moura da Cunha, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). O pedido foi feito pela oposição, que vai questioná-lo sobre a série de alertas emitidos nas 48 horas anteriores aos atos de vandalismo na Praça dos Três Poderes. Além desses avisos ignorados pelos órgãos federais de segurança, a reunião deverá ser marcada pelo protesto de oposicionistas contra a negativa do ministro da Justiça, Flávio Dino, em fornecer as imagens das câmeras de segurança do Palácio da Justiça, sede de seu ministério, registradas no dia dos ataques.
Em ofício entregue à CPMI, o ministro alegou que elas seguem sob análise de investigações criminais em andamento no Supremo Tribunal Federal (STF), o que, pelo Código de Processo Penal, impediria o compartilhamento. O gesto, contudo, alimenta especulações de tentativa de dificultar a busca por indícios que confirmem omissões do governo Lula nos atos de 8 de janeiro.
Os oposicionistas lembram, contudo, que a CPMI tem poderes para requerer os materiais e que a própria Suprema Corte já havia autorizado a liberação para o colegiado de imagens daquele dia, como as do Palácio do Planalto, inseridas dentro do mesmo contexto.
“O STF forneceu as imagens gravadas pelas suas próprias câmeras de segurança. O Planalto forneceu as suas gravações até mesmo à imprensa. Já o Ministério da Justiça, esse não pode fornecer?”, questionou o senador Sergio Moro (União Brasil-PR).
O requerimento - considerado fundamental pela oposição e negado por Dino - visa, segundo os parlamentares oposicionistas, tirar uma dúvida essencial sobre o grau de ciência que o ministro tinha em relação aos fatos do 8 de janeiro, assunto sobre o qual o próprio já entrou em contradição. As imagens supostamente comprovariam a presença de Dino no prédio durante os atos, em contato com outras autoridades.
Em relação à primeira testemunha a ser ouvida pela CPMI na volta aos trabalhos, o interesse da oposição em Saulo Cunha está no fato de ele ter comandado a Abin no dia das cenas de depredação na Praça dos Três Poderes. Ele deixou o cargo depois, no início de março. Foram apresentados cinco requerimentos para a convocação de Cunha.
Autor de um deles, o senador Izalci Lucas (PSDB-DF) argumenta que o depoimento do agente é importante porque a agência “produziu diversos alertas sobre riscos de um ataque violento a prédios públicos de Brasília, inclusive na véspera”. O deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), por sua vez, defende que a presença de Cunha na CPMI ajuda com a “transparência nas apurações”.
Já a defesa do ex-diretor da Abin pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) que ele seja ouvido uma sessão secreta no Congresso, de acordo com informações da CNN Brasil. Se a medida não for a acatada, o pedido é para que ele fale à CPMI em uma sessão com portas fechadas.
Inquérito do Exército vê indícios de responsabilidade do Planalto
Reportagem da Folha de S. Paulo revelou, nesta segunda-feira (31), o teor de um inquérito militar que investiga a atuação de oficiais do Exército nos atos de 8 de janeiro, indicando “indícios de responsabilidade” da Secretaria de Segurança e Coordenação Presidencial, ligada ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
O documento sugere que um planejamento adequado do órgão teria evitado ou minimizado os atos de vandalismo no Palácio do Planalto. As investigações conduzidas pelo Comando Militar do Planalto (CMP) destacam o papel da secretaria no “planejamento, acionamento e emprego” de militares na proteção do palácio.
Em nota, o GSI negou ter tido acesso às conclusões do inquérito do CMP.
Na última sessão da colegiado, em 11 de julho, pouco antes do recesso parlamentar, os membros aprovaram - mediante acordo - requerimentos dos oposicionistas considerados por eles essenciais à transparência e à ampla investigação dos fatos. Os pedidos foram aprovados após um "vacilo" dos governistas e possibilitam o acesso aos planos de voo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no fim de semana das invasões às sedes do Legislativo, Executivo e Judiciário.
Relatórios que chegaram à comissão revelam que a viagem de Lula para Araraquara (SP) foi decidida, repentinamente, na tarde do sábado, véspera dos episódios investigados. A oposição entende que a ida do presidente para o interior paulista poderia servir para provocar a sua ausência de Brasília ao longo da manhã e da tarde do fatídico domingo.
Oficialmente, Lula visitou Araraquara para analisar os danos causados pelas fortes chuvas que atingiram o município entre o fim de dezembro de 2022 e o início de 2023.
Investigações priorizaram alvos do governo nos primeiros meses
A senadora Eliziane Gama (PSD-MA), relatora da CPMI e aliada política do ministro Flávio Dino, reconheceu na semana passada que a comissão terá “dias absolutamente intensos” a partir de agosto devido justamente ao acesso a documentos que ajudarão nas audiências.
No grupo dos governistas, ela pretende explorar contradições de testemunhas que já falaram ao colegiado e relatórios sobre movimentos de pessoas e dados de supostos financiadores, dentro do roteiro de trabalho voltado a comprovar a tese de golpe de Estado idealizado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Neste sentido, a parlamentar prevê até mesmo a reconvocação de ouvidos e acareações.
Para o senador Eduardo Girão (Novo-CE), os primeiros dois meses de trabalho da CPMI foram marcados pela tentativa de aliados do governo de “blindar os poderosos”. Ele defendeu a convocação do general Marco Edson Gonçalves Dias, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) em 8 de janeiro, que foi gravado em vídeo interagindo com manifestantes dentro do Palácio do Planalto.
“Após dois meses de trabalho, infelizmente só foi apurado o que um lado pediu, em favor de uma narrativa e em prejuízo da investigação total, com interesse de blindar os poderosos”, disse Girão.
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