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O deputado Ricardo Barros (PP-PR) estreou na condição de líder do governo na Câmara na última terça-feira (18), quando fez um discurso no plenário da casa em que disse que seu trabalho será a continuidade do desempenhado pelo antecessor, Vitor Hugo (PSL-GO). Ele e o ex-líder, entretanto, têm perfis bem distintos.
Enquanto Vitor Hugo está em seu primeiro mandato e iniciou na vida pública em meio à onda que consagrou o presidente Jair Bolsonaro nas eleições de 2018, Barros tem mais de 20 anos apenas na Câmara dos Deputados, foi ministro do governo de Michel Temer (MDB) e líder e vice-líder nas gestões de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Dilma Rousseff (PT).
A chegada de Ricardo Barros à liderança representa mais um sinal da aproximação de Bolsonaro com o Centrão, grupo de deputados com menor vinculação ideológica e que tem peso decisivo nas votações da Câmara. "Governar é com o centro. É com o conjunto. E se o governo é de direita, então é centro-direita; se o governo é de esquerda, então é centro-esquerda. Só com as pontas, ninguém governa", afirmou o novo líder em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo.
Na mesma linha, Ricardo Barros antecipou que o eleitorado mais habitual de Bolsonaro não deve esperar da base do governo o empenho para aprovação de temas ligados à temática comportamental. "Nem todos os partidos da base do governo estão alinhados com a pauta dos costumes", ressaltou.
O parlamentar declarou também que espera a aprovação da reforma tributária ainda em 2020. Já a reforma administrativa deve esperar, segundo ele: a tramitação conjunta dos dois projetos poderia atrapalhar as votações. Barros acredita ainda que o Renda Brasil, programa idealizado pela gestão Bolsonaro para a área social, deve estar em vigor também neste ano.
Na entrevista à Gazeta, Ricardo Barros falou ainda sobre temas como as eleições de 2020 e 2022, o combate ao coronavírus, o imposto sobre transações digitais (apelidado de "nova CPMF") e a operação Lava Jato. "A Lava Jato deve aos brasileiros a mesma transparência que ela exige dos que ela investiga", disse.
Leia abaixo trechos da entrevista com Ricardo Barros.
O senhor fez o primeiro discurso como líder no plenário da Câmara na terça-feira e disse que fará um trabalho de continuidade em relação ao feito pelo deputado Vitor Hugo. Mas o que o senhor pretende deixar como marca? Em qual aspecto a liderança Ricardo Barros será diferente da liderança Vitor Hugo?
Eu não sei qual vai ser a diferença, mas tenho o meu estilo pessoal que todos conhecem aqui em Brasília: "sim, sim; não, não". Se "sim", não precisa pedir de novo. Se "não", não adianta insistir. É isso. Resultado em primeiro lugar.
Podemos esperar a conclusão da reforma tributária em 2020?
Sim, nós vamos votar com certeza esse ano.
Qual das propostas? Há mais de uma em tramitação no Congresso. O senhor tem mais simpatia por alguma delas?
O líder Aguinaldo Ribeiro [PP-PB, líder da Maioria na Câmara], que é o relator da reforma tributária, vai apresentar um texto. É esse texto. Esse texto contemplará todas as propostas.
Em relação à reforma administrativa: o senhor acha que podemos ter o avanço da proposta neste ano?
A reforma administrativa é fundamental para o Brasil. O presidente Bolsonaro está avaliando o melhor momento de encaminhá-la à Câmara, porque ele não quer que a reforma administrativa atrapalhe o andamento da reforma tributária. É isso que nós estamos avaliando neste momento.
Quando o senhor fala de "atrapalhar o andamento", o senhor se refere às reações que a reforma administrativa provoca, especialmente entre categorias de servidores públicos?
Não. É porque há uma concentração de esforço. E o esforço primeiro é aprovar a tributária. É isso. Que já está encaminhada e discutida há bastante tempo aqui. É para não haver dispersão, apenas isso.
Em relação ao imposto sobre transações digitais, que está sendo apelidado de nova CPMF: se o projeto for enviado ao Congresso, a tendência é de aprovação?
Não posso afirmar isso. Não sei nem se será encaminhada. Mas de qualquer forma a desoneração da folha, que é uma proposta do ministro Paulo Guedes que é importante para aumentar os empregos formais do Brasil, tem que ter uma outra fonte. O que vai se perder de arrecadação ao desonerar a folha tem que ser substituído por outra fonte. Então, não é aumento de imposto, é substituição de imposto. Eu não sei se haverá a proposta do imposto sobre transações eletrônicas, e também não sei se ele será aceito na Câmara. Vamos aguardar. Está muito cedo.
Como o senhor vê a possibilidade de implantação do Renda Brasil ainda em 2020?
O Renda Brasil vai ser aprovado esse ano. E ele deve somar outros benefícios. Deve ser um benefício único para os brasileiros. Será a soma do Bolsa Família com outros benefícios, o orçamento do Renda Brasil. Ele pode ter algum recurso adicional, desde que seja encontrada a fonte.
“Presidente precisa do centro. Só com as pontas, ninguém governa", diz Ricardo Barros
Uma crítica que setores bolsonaristas mais convictos fizeram ao longo de 2019 é que não houve um avanço muito grande na agenda de costumes. Acha que é possível a reversão disso em 2020, ou no próximo ano? Qual o empenho que o senhor vai dedicar à pauta?
A pauta de costumes é uma pauta do presidente Bolsonaro. A pauta vai ter um esforço nosso para votação, mas nem todos os partidos da base do governo estão alinhados com a pauta dos costumes.
O senhor falou em entrevistas recentes que o presidente intensificou a relação com "a política como ela é" e que esse tipo de movimento só desagrada os radicais. Como o senhor vê o peso dos radicais de direita para o governo? É um peso grande? Atrapalha a gestão?
Não. Eles já tiveram a sua importância. Porque o presidente assumiu o governo muito atento à sua base eleitoral. Mas ao longo do tempo entende o funcionamento do processo e percebe que precisa do centro para governar. Nenhum dos extremos consegue governar, porque não tem universalidade para isso. Então, governar é com o centro. É com o conjunto. E se o governo é de direita, então é centro-direita; se o governo é de esquerda, então é centro-esquerda. Só com as pontas, ninguém governa.
Qual o balanço que o senhor faz, como ex-ministro da Saúde, da atuação do governo Bolsonaro no combate ao coronavírus?
A avaliação é positiva. O ministro [Eduardo] Pazuello conseguiu dar clareza às metas do Ministério, entregar respiradores, entregar equipamentos de proteção individual e ser eficiente na aprovação das políticas que são necessárias e o formato da informação, estado por estado. Porque tem estado que tá subindo, tem estado que tá caindo [o número de ocorrências da doença]. Então aquele número-Brasil que ele parou de divulgar não tinha realmente nenhum sentido. E também porque o presidente destinou recursos ilimitados para o combate à pandemia. Tanto recursos ilimitados para a saúde quanto para os impactos na economia da crise da saúde, com o programa de renda para os informais e para os formais.
A operação Lava Jato vive um momento de baixa, com críticas à sua conduta e processos contra o procurador Deltan Dallagnol. Qual a sua avaliação sobre o estágio atual da operação?
A Lava Jato foi fundamental no combate à corrupção. Teve excelentes resultados. O que a sociedade e o procurador-geral da República [Augusto Aras] querem saber é se esses resultados foram alcançados dentro da lei. E a operação Lava Jato deve aos brasileiros a mesma transparência que ela exige dos que ela investiga. Não há razão para que ela não queira apresentar os dados que ela colheu, e como ela procedeu, com base em que dispositivos legais ela conduziu a investigação.
Qual será o envolvimento do senhor nas eleições municipais deste ano? Sua filha Maria Victoria [deputada estadual pelo Paraná] é pré-candidata em Curitiba?
O Progressistas vai participar da eleição [em Curitiba]. Ou Maria Victoria será candidata a vice na chapa do Greca [Rafael, prefeito, do DEM], a quem ela apoiou já no segundo turno da eleição passada, ou a Cida Borghetti [mulher de Ricardo Barros e ex-governadora] será candidata a prefeita. Essa é a posição do partido.
Nacionalmente, como o senhor vê o partido para a disputa?
Nós teremos, no Paraná, 130 candidatos a prefeito. E nacionalmente eu estimo mais de 1.500 candidatos a prefeito. É o que nós esperamos obter nas convenções. Pré-candidatos é o que nós temos. Agora, vamos esperar que eles se consolidem nas convenções.
O senhor acha que o presidente Bolsonaro é favorito à reeleição em 2022?
Eu acho que o presidente Bolsonaro precisa encontrar adversário. Cabe às oposições construir um adversário capaz de enfrentá-lo na eleição. No momento, não se percebe.
Ele terá o voto do senhor em 2022?
O nosso partido, como já foi declarado pelo presidente Ciro Nogueira [senador pelo Piauí e presidente nacional do PP], pretende apoiar a reeleição do presidente Bolsonaro.