O ex-diretor do Departamento de Logística do Ministério da Saúde Roberto Ferreira Dias, que depõe nesta quarta-feira (7) à CPI da Covid do Senado, declarou que seu encontro com Luiz Dominguetti em um shopping de Brasília se deu sem que ele tivesse planejado a reunião e negou ter pedido propinas para a compa de vacinas. Ele também falou que não competia a ele, como servidor do Ministério, negociar a compra de vacinas com fornecedores privados.
O encontro de Dias e Dominguetti ocorreu em 25 de fevereiro e deflagrou uma denúncia sobre pedido de propina dentro do Ministério da Saúde. Segundo Dominguetti, que é policial militar e atuava como representante da empresa Davati, eles e mais duas pessoas jantaram em um shopping de Brasília - e, na ocasião, Dias afirmou que a compra de vacinas da Astrazeneca, intermediada pela Davati, seria feita com o pagamento de propina de US$ 1 por dose.
Já a versão que Roberto Dias contou à CPI nesta quarta é distinta. Ele afirmou que foi ao shopping para beber um chopp com um amigo e, sem que ele tivesse conhecimento prévio, foi abordado por Dominguetti. O policial, então, teria o abordado para falar sobre a venda de vacinas. Dominguetti, de acordo com Dias, estava acompanhado de Marcelo Blanco, coronel do Exército que atuou também no Ministério da Saúde. Dias pediu que ele agendasse uma reunião oficial no Ministério. O encontro ocorreu no dia seguinte.
Dias também chamou Dominguetti de "picareta" e fez críticas ao deputado federal Luís Miranda (DEM-DF). O parlamentar de Brasília e seu irmão, o servidor Luís Ricardo Miranda, declararam que Dias fez pressão dentro do Ministério para a compra da vacina Covaxin, em um expediente do praticado em relação a outros imunizantes. A negociação para a aquisição da Covaxin, segundo a acusação, também seria motivada por propina.
O servidor Roberto Ferreira Dias negou ter exercido pressão sobre Luís Ricardo, o que foi denunciado pelo irmão do deputado à CPI. Segundo Dias, a acusação de pressão sobre ele se pauta em uma mensagem que ele enviou a Luís Ricardo - que, segundo o irmão do parlamentar, seria uma exigência para a aquisição das doses de Covaxin. Dias afirmou que sua mensagem na verdade se referia a outras vacinas, que chegariam ao Brasil no dia seguinte após a conversa entre eles.
O servidor declarou ainda que não é de sua responsabilidade a negociação direta para a compra de vacinas. "Não me coube negociar vacinas com Pfizer, com Janssen, com ninguém", afirmou. Segundo ele, a competência do assunto era restrita à secretaria-executiva do Ministério, que à época era ocupada por Elcio Franco, o "número 2" da pasta durante a gestão de Eduardo Pazuello.
Neste ponto, foi contestado por senadores que fazem oposição ao governo de Jair Bolsonaro, que viram contradição entre seu posicionamento e sua fala sobre o encontro com Dominguetti em que relatou ter agendado uma reunião para o dia seguinte.
Dias afirmou ainda que não pode opinar sobre um eventual superfaturamento na compra das vacinas da Covaxin, por não ter gerência sobre o processo.
Antes do início da reunião desta quarta, o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirmou que Dias representava o elo entre dois "escândalos" que envolvem a compra de vacinas - o possível privilégio à fabricante da Covaxin e o pedido de propina para a compra dos imunizantes negociados pela Davati.
Roberto Dias descarta vínculo com Ricardo Barros
O servidor falou à CPI que não tem conexões com o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR). Ele declarou que seus eventuais contatos com o parlamentar se deram pelo fato de Barros ser o representante do Paraná, que é o estado onde Dias tem seu vínculo profissional prioritário - é servidor concursado do estado.
Dias negou ter proximidade com o presidente Jair Bolsonaro e declarou que o fato de estar ocupando cargos de confiança na estrutura pública nos últimos anos se deve ao seu currículo e por, no caso específico do Ministério da Saúde, exercer uma função de elevada complexidade.
Os senadores o cobraram sobre a proximidade que ele teria com o ex-deputado federal Abelardo Lupion, que foi parlamentar pelo Paraná e atuou no Ministério da Saúde já durante a gestão Bolsonaro. Dias afirmou que teve contato com Lupion, mas que ascendeu por critérios técnicos. Lupion, em entrevista ao Valor Econômico, confirmou que indicou Dias ao ex-ministro Luiz Henrique Mandetta à época da transição entre os governos de Michel Temer e Bolsonaro.
CPI adia votação de requerimentos
Antes do início da oitiva com Roberto Dias, a CPI aprovou três requerimentos, todos elaborados pelo senador Randolfe. Os documentos são pedidos de convocação do do líder religioso Amilton Gomes de Paula, presidente da Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários (Senah), que teria participado de negociações de vacinas com o Ministério da Saúde; de Andreia Lima, CEO da VTCLog, empresa de logística que tem contratos com o Ministério; e de William Amorim Santana, servidor do Ministério da Saúde. O depoimento com Santana deve ocorrer já na sexta-feira (9).
Inicialmente, a comissão votaria outros requerimentos nesta quarta. Entre eles, o pedido de convocação do ministro Onyx Lorenzoni (Secretaria-Geral de Governo) e a quebra do sigilo de Ricardo Barros. Também estava na pauta a presença do ex-secretário da Casa Civil da Bahia, Bruno Dauster, que falaria sobre uma denúncia de corrupção que teria sido praticada pelo Consórcio Nordeste, agremiação que reúne os nove governos da região.
O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), declarou que os requerimentos ainda podem ser votados "extra-pauta", em qualquer momento da sessão desta quarta. O depoimento de Dias ainda está em curso.
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