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O líder da oposição no Senado e secretário-geral do Partido Liberal, Rogério Marinho (RN), faz uma avaliação muito positiva da performance da direita nas urnas do último domingo (6), sobretudo nas grandes cidades, embora com ressalvas. Ele observa um avanço significativo do PL e acredita que o ex-presidente Jair Bolsonaro será o candidato em 2026. Mas defende que a expansão continuada da legenda deva se refletir não só nos números, mas também na qualidade. Ou seja, o partido tem que crescer, mas os membros têm que ter coerência e adesão às ideias da direita.
Nesta entrevista à Gazeta do Povo, Marinho destaca que o momento é de o partido “conversar para dentro”, reforçando princípios conservadores e a sua identidade, destacando a volta à Presidência da República como o maior objetivo. Para ele, a nitidez programática e ideológica e a coerência dos filiados são fundamentais para novas conquistas. Nesse sentido, ele cita iniciativas para orientar a sociedade, como o da Academia Conservadora, uma plataforma online de cursos rápidos e gratuitos que será lançada ainda neste ano.
Ao comentar a tese de que partidos da centro-direita cresceram mais, Marinho afirma que esse avanço se deve à tradição e a arranjos locais, ressaltando que o eleitor exige mais clareza de posições no plano nacional, sobretudo em temas como liberdade econômica e defesa de valores essenciais. Ele cita o caso do PSD, presidido por Gilberto Kassab, presente nos governos de Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) e de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). “Suas posições flutuam ao sabor das conveniências do momento”, resume.
Marinho garante a perspectiva da candidatura de Bolsonaro à Presidência até quando puder buscar retomar a elegibilidade, mas adianta que o PL terá candidato próprio ao Planalto em 2026, dialogando com outras forças políticas. “As convergências entre PL, PP e Republicanos, por exemplo, são bem maiores que as divergências. Obviamente, só não conversaremos com a esquerda", enfatiza.
Quanto ao “fenômeno Pablo Marçal”, Marinho refuta a ideia de que o empresário derrotado na corrida pela Prefeitura de São Paulo tenha ameaçado a liderança de Bolsonaro na direita. Para o senador, embora a campanha dele tenha trazido lições, não mostrou consistência política. “Ele se comportou como algoritmo, mudando de posição conforme oscilações nas redes sociais”, avalia. Ainda assim, reconhece que a corrida paulistana evidenciou a inclinação à direita na maior cidade do país.
A seguir, os principais trechos da entrevista.
Qual é balanço que o PL faz do primeiro turno das eleições? A direita se fortaleceu?
O PL sai dessas eleições fortalecido, especialmente considerando que é a primeira eleição municipal desde a entrada de Jair Bolsonaro no partido. Comparado com a anterior, quando o partido obteve 4,6 milhões de votos, o PL atingiu agora 15,7 milhões, um crescimento expressivo de 240% no número de eleitores. Nas 103 maiores cidades, onde pode haver segundo turno, o PL venceu em 10 como cabeça de chapa e em várias outras como vice. Dos 51 municípios que terão segundo turno, o partido está em 23 disputas, ou 32 se considerarmos os vices.
O eleitorado do PL é predominantemente urbano, com maior renda e escolaridade, e, portanto, menos dependente do Estado. Já o PT tem se consolidado como o partido dos grotões e perdeu a conexão com a sociedade atual, comunicando-se a partir de uma visão que remete aos anos 1980. As pessoas que valorizam o mérito, a liberdade de expressão e o progresso material tendem a se identificar hoje mais com o PL.
Nosso partido se conecta melhor com a população que valoriza mérito, liberdade de expressão e progresso material. A missão do PLé refinar sua proposta ideológica, tanto internamente quanto externamente, deixando claro que suas ações vão além da retórica, defendendo menos carga tributária, direito à vida e à propriedade e a redução do Estado. Aqueles dentro do PL que não compartilham dessas convicções devem procurar outra legenda.
O senhor concorda com as análises que apontam o crescimento dos partidos de centro nas eleições como um desejo da população por mais moderação?
O sistema busca, frequentemente, interpretar os resultados eleitorais de acordo com seus próprios interesses. O crescimento do centro é uma repetição do que sempre ocorreu no Brasil, com boa parte da classe política tentando manter-se em sua zona de conforto, evitando tomar posições mais definidas para não perder apoio. Há também uma preocupação com questões locais e a articulação para formar blocos eleitorais ou facilitar as eleições. Essa situação reflete também um Congresso hipertrofiado nas questões orçamentárias, o que faz a diferença em eleições municipais de cidades menores, favorecendo partidos do centrão.
O PSD, por exemplo, é um partido que se autodenomina de centro, mas sem uma definição clara de posicionamento. Gilberto Kassab, seu presidente, admite não ser nem de direita nem de esquerda, o que reflete um pragmatismo exagerado, que flutua ao sabor das conveniências políticas do momento. Esse excesso é percebido pela população, o que dificulta para o partido uma definição de candidaturas majoritárias no plano nacional. O eleitor busca clareza ideológica e programática, o que torna necessária uma maior nitidez no que o centro representa.
Por que o PL é o único partido que abraça o rótulo de direita sem embaraços?
O PL não é um partido novo, mas está sendo reconstruído com nova identidade. Esta é a primeira eleição municipal sob essa nova égide, que está mudando a sua cultura. O Brasil é um país grande e heterogêneo, por isso questões locais sempre influenciarão a política. Não queremos ser um partido hermético, mas temos como objetivo maior voltar à Presidência da República. Desta forma, quando for oportuno, dialogaremos com a centro-direita, especialmente no segundo turno.
Estamos com quase 100 deputados e estamos em negociação para novas filiações de senadores para chegar a 18 até o fim dessa legislatura, nos tornando a maior bancada. Esperamos também trazer mais dois governadores em 2025. A ideia é essa: o partido se agiganta, mas não perde a qualidade e a coerência. Dedicaremos o próximo ano a isso.
O PL não abrirá mão de ter uma candidatura própria à Presidência, e minha missão no partido é deixar claro quem somos e o que defendemos, não só em termos de retórica, mas também na prática. O exercício do mandato é o verdadeiro teste. Defenderemos menos carga tributária, a proteção à vida, aos direitos dos nascituros e a redução do Estado. Até dezembro, lançaremos a Academia Conservadora, uma plataforma online com cursos rápidos, para que a população tenha ferramentas para defender os princípios que nos movem. Queremos formar quadros e promover o pensamento conservador como partido e de forma gratuita.
Há chance de o PL vir a conversar com o PSD, de Kassab, para as eleições de 2026?
Conversas entre partidos com projetos distintos ocorrem naturalmente no segundo turno. Kassab já lançou o nome do governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), como presidenciável. Trata-se de um bom administrador, mas que não compartilha dos mesmos valores precípuos do PL. A nossa aposta continua sendo Jair Bolsonaro. Acreditamos em sua elegibilidade e trabalharemos para que ele esteja na disputa. Só não conversaremos com a esquerda de PT, PSol, PCdoB, PDT, PSB, com pessoas que defendem coisas diametralmente opostas ao que defendemos: Estado inchado, aparelhamento da máquina pública, visão progressista da sociedade em relação a drogas, aborto e desencarceramento e fragilização do aparato policial.
O senador Flávio Bolsonaro mencionou Tarcísio de Freitas como possível substituto do pai nas eleições de 2026, caso Bolsonaro permaneça inelegível.
Nosso candidato será o candidato do PL e estamos focados em fortalecer o partido. Tarcísio é um político importante e próximo, mas está no Republicanos, assim como Ratinho está no PSD. Temos convergências e divergências com todos os partidos de centro-direita, o que é normal em uma democracia liberal. Estamos confiantes de que Bolsonaro será nosso candidato, e só consideraremos outras opções após esgotar todas as possibilidades para recorrer. O senador Ciro Nogueira já indicou que marchará conosco se Bolsonaro for candidato, mas se for outro nome, ele terá que consultar sua base e pode tomar outro caminho.
Como o PL planeja derrotar Lula em 2026?
Se Bolsonaro for candidato, será uma eleição plebiscitária já no primeiro turno, confrontando a sua gestão com a de Lula. O atual governo repete os erros que levaram o país ao colapso econômico e moral em 2015 e 2016. A população percebe as inconsistências éticas e os gastos luxuosos de Lula em viagens e na residência oficial, em contraste com a postura verdadeiramente austera de Bolsonaro. A política externa do Brasil sob Lula também é desastrosa, contrária aos interesses do país, com alinhamentos automáticos com regimes autoritários que vão contra os valores históricos do país.
O surgimento do fenômeno Pablo Marçal na campanha de São Paulo impacta a direita? Ele chegou a ameaçar a liderança de Bolsonaro?
A direita no Brasil se mostrou mais forte e plural do que a esquerda. Bolsonaro é o maior líder, mas a direita permite o surgimento de novas lideranças, ao contrário de Lula, que centraliza o poder. Marçal mostrou a força da direita, especialmente entre a população da periferia que busca o empreendedorismo e o mérito. Reconheço que ele galvanizou o debate nacional, mas sobretudo evidenciou que a direita brasileira é diversificada. Apesar disso, não mostrou consistência em seu projeto político. Receio que 90% dos eleitores dele não saibam quem ele de fato é, em razão das mudanças constantes de posição. Ele se comportou mais como algoritmo do que candidato, mudando de posição conforme oscilações nas redes sociais.
Os erros do governo Lula no exterior estão fazendo a população prestar mais atenção em política externa?
O Brasil está na contramão de seus interesses históricos e atuais. A tradicional diplomacia de não intervenção e uso do soft power têm sido substituídos por um alinhamento automático e ideológico que nos isola e compromete nossas oportunidades. Em um cenário global marcado por conflitos no Oriente Médio, tensões na Europa e resistências à Rússia e à China, vemos um rearranjo econômico com empresas deixando esses países e buscando novas localizações. O Brasil, porém, perde o potencial de atrair esses investimentos [de empresas que foram expulsas ou optaram por sair da Rússia e de outras ditaduras], que migram para os EUA, México e Canadá.
A previsibilidade, a segurança jurídica e a estabilidade, que são essenciais para o crescimento, estão sendo minadas por vieses ideológicos. Enquanto isso, as redes sociais despertam o interesse da sociedade em acompanhar de perto o que ocorre no país e no mundo. Não é à toa que há tentativas de controle das redes, para impor uma narrativa específica. Mas esse controle é ineficaz, pois as pessoas estão mais informadas e conseguem perceber as incoerências de determinadas posturas políticas.
Os valores brasileiros de defesa da democracia estão sendo relativizados. A solidariedade com aqueles que defendem esses princípios parece escassa. Há uma simpatia aparente pela Rússia, mesmo após a invasão da Ucrânia, e uma postura de indiferença diante dos crimes e da barbárie [contra católicos] na Nicarágua e da destruição definitiva da democracia na Venezuela. Por que esse alinhamento automático com Rússia, China e Irã, países que não compartilham dos nossos valores democráticos?
A condenação constante a Israel quando se defende, sem a mesma atitude em relação aos ataques que sofre, revela uma inconsistência difícil de disfarçar. É impossível continuar escondendo essas incoerências.