O chanceler russo Sergei Lavrov ofereceu ao Brasil nesta segunda-feira (17) a possibilidade de ganhar um prêmio há muito tempo desejado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva: uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU. Lula vem perseguindo esse objetivo ao menos desde 2004, quando se dispôs a enviar tropas brasileiras para o Haiti. Porém, analistas ouvidos pela Gazeta do Povo afirmaram que é altamente improvável que o Brasil obtenha esse status, mesmo que Lavrov esteja falando sério sobre articular o apoio russo.
"Estamos fazendo reformas no programa global. Vamos trabalhar no conselho da ONU, onde o Brasil ainda não é membro permanente. Estamos manifestando nosso apoio à participação do Brasil como membro permanente", disse Lavrov em entrevista coletiva no Palácio do Itamaraty.
"As visões do Brasil e da Rússia são similares em relação aos acontecimentos que ocorrem no mundo, e estamos atingindo uma ordem mundial mais justa, correta, baseando-se no direito", disse Lavrov.
A afirmação sobre atingir uma ordem mundial "mais justa" e "baseada no direito" difere muito da atitude tomada na prática pela Rússia ao invadir a Ucrânia para expandir seu território por meio da invasão da Ucrânia
Quando Lavrov disse em março, durante um encontro do G-20 na Índia, que a guerra foi provocada pela Ucrânia, arrancou uma gargalhada geral da platéia.
Mas a audiência desta segunda-feira (17) era formada apenas por jornalistas brasileiros. Eles foram proibidos pelo governo brasileiro de dirigir perguntas ao russo, sob pena de perderem a credencial para cobrir outros eventos do Itamaraty.
De forma semelhante a Lavrov, Lula já havia relativizado a guerra, dizendo que a decisão de começar a guerra foi tanto da Rússia (invasora) como da Ucrânia (invadida).
Agenda política russa não inclui reforma da ONU nem vaga para o Brasil
De acordo com o major da reserva e analista de riscos Nelson Ricardo Fernandes Silva, da consultoria ARP, a Rússia dificilmente gastará energia e recursos para promover uma alteração no Conselho de Segurança da ONU no atual momento político mundial.
Hoje, os membros permanentes são apenas China, França, Rússia, Grã-Bretanha e Estados Unidos.
"A Rússia, assim como a China, não estão interessadas em mexer no Conselho de Segurança. Elas vão se focar em seu projeto de tentar enfraquecer a hegemonia americana, em particular a hegemonia do dólar", afirmou.
Ou seja, segundo ele, a agenda política de Moscou e Pequim não está voltada para reformar a ONU, como disse Lavrov. O objetivo é convencer países em desenvolvimento a abandonar o dólar como moeda global de comércio e valorizar trocas diretas ou fomentar a moeda chinesa yuan.
Fernandes Silva afirmou ainda que para se tornar membro permanente do órgão, um país deve ter forças armadas capazes de influenciar a geopolítica. Embora não seja um requisito oficial, também conta muito nesse ponto possuir armamento nuclear, que o Brasil não tem.
"Outros países têm muito mais chances de entrar que o Brasil, como a Índia, por causa da sua importância estratégica e rede de alianças e a Turquia, que vem exercendo influência em conflitos na Europa e no Oriente Médio.
Membros permanentes da ONU não vão aceitar dividir poder com Brasil
O analista Renato Ribeiro de Almeida, doutor em direito do Estado pela Universidade de São Paulo (USP), afirmou à reportagem que os atuais membros não vão aceitar "dividir" o poder.
"Os membros permanentes têm poder de veto. Para ampliação desses membros seria necessário que houvesse um consenso. O que eu acho que é difícil, porque no âmbito das relações internacionais, embora a diplomacia seja sempre muito cordial, as relações de poder impõem a máxima de que poder não se divide", afirmou.
Também na segunda-feira (17), o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional dos Estados Unidos, John Kirby, classificou as falas de Lula como equivocadas e disse que o presidente está reproduzindo propaganda russa. Ou seja, não adianta ter apoio da Rússia para uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU se a nação tiver o voto de oposição americano.
"Não se abre mão de poder tão facilmente, a menos que acham situações mais complexas. Então naturalmente que os países que fazem parte desse seleto grupo de membros do Conselho de Segurança não vão querer a inclusão de outros países, porque é uma diminuição do seu próprio poder", disse.
Porém, Almeida afirmou que embora o pleito do Brasil seja difícil de ser atingido, o país deve continuar insistindo.
Segundo Fernandes Silva, a ONU tinha uma grande importância quando foi criada, mas com o fim da União Soviética na década de 1990, os Estados Unidos ficaram tão poderosos que passaram a agir mesmo sem o aval da instituição, promovendo até guerras não autorizadas.
Com a emergência atual de novos países em desenvolvimento, que possuem economias muito influentes, é natural que eles busquem mais representação no cenário global, segundo o analista. Mas isso não significa que o Brasil esteja no primeiro lugar da fila para ser beneficiado por esse processo.
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