Lançado no segundo semestre de 2019 como a principal aposta do ministro Sergio Moro para reduzir a criminalidade no país, o projeto Em Frente Brasil colheu resultados: os índices de assassinatos nas cinco cidades que fazem parte do programa caíram entre 9% e 65%. Em 2020, o projeto entra em sua segunda fase. Deve ser expandido para mais municípios ainda no primeiro semestre, e passar a incluir ações além da repressão policial para assegurar que a redução dos índices de criminalidade se mantenham no longo prazo. Para isso, o programa terá a participação de outros ministérios e órgãos estaduais e municipais, além do que já é promovida pela pasta da Justiça e Segurança Pública.
As cinco cidades do projeto-piloto receberam em 2019 apoio da Força Nacional de Segurança Pública para um “choque operacional”, com o objetivo de reduzir rapidamente o número de homicídios. Segundo dados do Ministério da Justiça, entre 30 de agosto de 2019, data do início do projeto, e 11 de janeiro deste ano, houve uma redução de 44,1% nas ocorrências de homicídios nesses cinco municípios. Todos registraram queda nos assassinatos: Ananindeua/PA (-65,2%), Cariacica/ES (-8,9%), Goiânia/GO (-47,9%), São José dos Pinhais/PR (-20,7%) e Paulista/PE (-36,4%).
O número de ocorrências de roubo também teve redução no período, de 29,9%. Os números mostram redução nos roubos em Ananindeua (-17,3%), Cariacica (-24,7), Goiânia (-40,8%), Paulista (-31,6%) e São José dos Pinhais (-28,2%) desde o início do projeto.
Em quatro meses, o Ministério da Justiça afirma que houve a prisão de 1.718 pessoas e a apreensão de 370 menores de 18 anos nas cinco cidades. Além disso, houve a apreensão de cerca de 220 armas, 18 toneladas de drogas e a recuperação de 453 veículos desde o fim de agosto de 2019.
Mais cidades vão ser incluídas no projeto Em Frente Brasil
O coordenador do projeto Em Frente Brasil no Ministério da Justiça, Daniel Barcellos, afirma que a iniciativa pode ser ampliada para outros municípios ainda no primeiro semestre de 2020. A ideia é alcançar mais cidades que concentram altos índices de homicídios no país.
“A gente espera em meados desse primeiro semestre de fato instituir o programa como resultado do piloto implementado e testado em cinco municípios, e aí já objetivando uma escalabilidade, com foco nos municípios com concentração dos homicídios”, afirma Barcellos.
Uma plataforma do Ministério da Justiça concentra as ocorrências de homicídios por município, com base nos boletins de ocorrência registrados em cada cidade. Segundo os dados da plataforma, as cidades que mais registraram homicídios em 2019, em números absolutos, foram Rio de Janeiro (832), Salvador (728), Manaus (607), São Paulo (500) e Fortaleza (478).
Fora das capitais, as cidades que mais registraram assassinatos no ano passado, também em números absolutos, segundo os dados do Ministério da Justiça, são Feira de Santana, na Bahia (241); Duque de Caxias (224) e Nova Iguaçu (223); no Rio de Janeiro, Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco (209); e São Gonçalo, também no Rio (202). Os dados estão atualizados até setembro de 2019.
Planos locais de segurança pública vão incluir ações sociais
Apesar dos resultados colhidos nos primeiros meses de atuação, o projeto-piloto de Moro para a segurança pública não aposta apenas na repressão policial. A segunda etapa do projeto vai incluir ações sociais. As cinco cidades do projeto-piloto estão elaboração dos planos locais de segurança pública, que integram uma série de ministérios e secretarias estaduais e municipais. A ideia é reforçar ações que, no longo prazo, institucionalizem a redução da criminalidade nas cidades que receberam o programa.
“A primeira fase objetiva a redução imediata [do crime]. Então é a ação policial inteligente e qualificada que reduz [a criminalidade]. É preciso manter essa redução. É preciso fazer com que o território em que ocorreu mortes deixe de ser um território propício à ocorrência desses crimes”, explica Daniel Barcellos, coordenador do Em Frente Brasil no Ministério da Justiça.
“A fase dois objetiva transformar aquele território, na perspectiva socioeconômica, para que ele deixe de ser um território que produz crimes de alguma maneira. E isso são ações que impactam curto,médio e longo prazo”, completa Barcellos.
Duas cidades já elaboraram o plano local de segurança: Cariacica e São José dos Pinhais, onde gestores e técnicos se reuniram para elaborar o documento no início de janeiro.
“O plano local é um conjunto de ações, por área temática. Cada uma dessas ações vinculada a um problema específico, com um responsável e um prazo definido para início de implementação”, explica Daniel Barcellos, coordenador do Em Frente Brasil no Ministério da Justiça. “Então a gente sai agora de São José dos Pinhais com um plano local de segurança com 35 ações estratégicas. São cinco ações por área temática. Ações diversas, de baixa, média e alta complexidade. Esse plano será encaminhado para os níveis estratégicos dos entes federados para validação e a partir daí inicia-se a rotina de monitoramento e avaliação dessas ações”, explica.
O plano local envolve sete eixos, cada um com ações estratégicas voltadas ao combate à criminalidade:
- Educação
- Saúde
- Emprego e renda
- Justiça e segurança
- Família, drogas e medidas socioeducativas
- Infraestrutura e arquitetura urbana
- Cidadania, assistência social, esporte e lazer
No âmbito da União, além do Ministério da Justiça e Segurança Pública, fazem parte do projeto-piloto a Casa Civil, Secretaria de Governo, Secretaria-Geral da Presidência da República e os ministérios da Mulher, Família e Direitos Humanos; Economia; Saúde; Desenvolvimento Regional; Cidadania e Educação. No âmbito do governos estaduais e municipais, o programa vai envolver as respectivas secretarias que tratem desses assuntos.
Entre as estratégias adotadas em São José dos Pinhais, por exemplo, estão o monitoramento eletrônico por câmeras de vias públicas, recuperação de espaços públicos, regulação de espaços urbanos, atividades de contraturno nas escolas, projetos para incentivar o empreendedorismo e a entrada de jovens no mercado de trabalho e melhoria de equipamentos de saúde pública.
O que o governo oferta aos municípios além da repressão policial
O Ministério da Cidadania oferece um cardápio amplo de ações do governo federal que podem ser implantadas nos municípios que recebem o projeto. Entre as ações estão o oferecimento de cursos de capacitação para jovens, acompanhamento de jovens que cumprem medidas socioeducativas, oficinas de educação financeira, fornecimento de ônibus para transporte de cidadãos interessados nos cursos e atividades oferecidas, programas de prevenção ao uso de drogas, hortas pedagógicas, aulas de futsal feminino, atividades de esporte, cultura e lazer no contraturno escolar, entre outros.
A pasta oferece ainda uma espécie de curso para melhorar a autoestima de jovens em comunidades carentes. “Aqui nós temos dois meses em que eles ficam sendo tratados sob esse aspecto da autoestima, das oportunidades que eles têm. É elevar a cidadania dessas pessoas, que perderam tudo, estão em outra realidade. A perspectiva deles é zero”, explica a secretária executiva do Ministério da Cidadania, Ana Maria Pellini.
“Não é muito fácil para qualquer jovem, de qualquer camada social, escolher seu futuro. É uma coisa difícil. Imagina para essas pessoas que sentem que as oportunidades são poucas, a família está numa situação com o pai preso, a mãe presa, enfim. Para eles é mais difícil ainda. Essa oficina é para que eles reflitam sobre as oportunidades”, completa Ana Maria Pellini.
O Ministério da Cidadania também vai levar às cidades do Em Frente Brasil o programa Criança Feliz. No ano passado, o programa recebeu o maior prêmio do mundo na área de inovação para educação.
“Esse [programa] muda muito a realidade. Ele pega a gestante, e depois a mãe de crianças de 0 a 36 meses. Vai um visitador uma vez por semana. Depois, uma vez a cada 15 dias. E ensina as mães a cuidarem dos filhos, a brincar com as crianças. Eles levam livros para ler, explicam a importância e como estimular a ludicidade e a interação entre o cuidador, pode ser uma avó, e a criança. A gente ouve depoimentos... É impressionante: os cuidadores dizem que queriam saber disso antes para ter feito com outros [filhos]. O desenvolvimento é totalmente diferente. São mães que nunca foram cuidadas adequadamente, então não sabem cuidar”, explica Ana.
Já o Ministério da Educação participa do programa Em Frente Brasil em parceria com os institutos federais. O objetivo é atender os municípios de acordo com suas demandas emergenciais para o combate à violência – entre as mais importantes estão educação integral, profissional e o combate à evasão escolar.
Investimentos sociais para melhorar a segurança pública
O projeto-piloto de Moro para reduzir a violência encontra respaldo em pesquisas científicas, que apontam que investimentos em áreas sociais podem levar à redução da criminalidade.
No fim de 2019, uma pesquisa do Datafolha mostrou que, para 57% dos brasileiros, o governo deveria investir em ações sociais, como combate ao desemprego e educação, para combater a violência. Segundo a pesquisa, apenas 41% dos brasileiros acreditam que aumentar o número de policiais nas ruas é a solução para o problema.
“A violência e a criminalidade, em especial os homicídios, são um problema complexo. Por problemas complexos a gente entende aquelas cujas causas são variadas e transversais. São problemas que você dificilmente resolve com ações isoladas de temáticas diversas”, afirma Daniel Barcellos, coordenador do programa Em Frente Brasil.
“Em todas as áreas temáticas de atuação do poder público eu vou encontrar uma ou outra ação que, de alguma forma, impacta ou atinge situações, fatos, realidades que compõem esse conjunto de situações e de coisas que levam um determinado território a ter uma maior concentração de crimes”, afirma Barcellos.
“A primeira coisa que o Ministério da Justiça fez nessas cidades foi dar um choque de segurança, através da Força Nacional. É a força da repressão, que funciona bem por um tempo, mas não se consegue manter para sempre. Uma repressão é cara e não traz os efeitos a longo prazo que se deseja”, explica Ana Maria Pellini, do Ministério da Cidadania. “Tem que entrar com políticas públicas de inclusão social, de diminuição da influência das drogas, em especial no caráter da prevenção. Enfim, oferecer oportunidades de capacitação para os jovens, uma série de políticas que fazem com que essa pessoa não se encaminhe para o crime”, diz Ana.
“Por exemplo, um jovem que está envolvido com a criminalidade é um jovem que não entrou ou se evadiu da escola”, exemplifica Barcellos. “Se esse jovem estivesse na escola, não estaria vulnerável ao envolvimento com a criminalidade. Então precisamos ir na raiz para entender por que esse jovem está fugindo da escola para traçar ações relativas à educação para manter esse jovem na escola, para ocupar o tempo desse jovem com ações que sejam atrativas do ponto de vista cultural, de esporte, de lazer, e que ao mesmo tempo estejam preparando-o para uma atividade profissional”, diz Barcellos.
“A gente percebe que esse investimento que a gente faz nas políticas sociais realmente é mais barato do que manter o jovem preso”, ressalta Ana. “O presídio é muito mais caro e não surte efeito nenhum, porque o cara que sai do presídio não sai corrigido, ele reincide na sua maioria. Depois que tu botou o cara no presídio, pode ter certeza que de lá, não vai sair boa coisa”, completa.
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