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Programa Mais Médicos foi criado em 2013 com o objetivo de ampliar a oferta de profissionais de saúde pelo país
Programa Mais Médicos foi criado em 2013 com o objetivo de ampliar a oferta de profissionais de saúde pelo país| Foto: Karina Zambrana/Ministério da Saúde

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está fazendo ajustes para lançar ainda no primeiro semestre uma nova versão do programa Mais Médicos, do Ministério da Saúde. A princípio, não haverá um acordo com a ditadura de Cuba para a contratação de profissionais estrangeiros. Uma das justificativas para isso é que o governo federal considera que o Brasil ampliou o número de médicos nos últimos anos.

A expectativa é de que o governo priorize a contratação de médicos brasileiros, em vez de cubanos, como ocorreu em 2013, quando a então presidente Dilma Rousseff (PT) lançou a primeira versão do programa. No governo da petista, o Mais Médicos chegou a ter 18,2 mil profissionais, dos quais 11 mil eram cubanos trazidos ao Brasil por meio de um acordo de cooperação do governo brasileiro com Cuba, intermediado pela Organização Pan-Americana da Saúde (Opas).

A antiga parceria foi amplamente criticada, tanto pela falta de revalidação do diploma desses médicos para atuar no Brasil, quanto pela retenção de 75% do salário de cada profissional, que ficava com a ditadura cubana. A exportação de serviços médicos e de saúde ainda é uma das principais fontes de divisas da ilha caribenha.

Atualmente, o Mais Médicos conta com cerca de 40% de profissionais estrangeiros dos pouco mais de 8 mil que atuam no programa. A nova versão, no entanto, prevê que médicos estrangeiros possam concorrer apenas às vagas remanescestes do edital. Além disso, a expectativa é de que a proposta passe a exigir o exame do Revalida para os formados fora do Brasil.

O movimento é uma estratégia do governo de tentar amenizar as críticas de entidades médicas contrárias à priorização de estrangeiros sem comprovação do Revalida. O exame é um processo unificado para revalidação de diplomas de médicos estrangeiros compatíveis com as exigências de formação das universidades brasileiras. As provas são aplicada pelo Inep, órgão vinculado ao Ministério da Educação, duas vezes ao ano.

"Não podemos chegar e ofertar para a nossa sociedade médicos sem qualificação, que você nem sabe a origem. O Conselho Federal de Medicina não abre mão dessa prerrogativa", afirmou José Hiran Gallo, presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM).

Governo vai oferecer especialização para os o médicos brasileiros

Para tentar atrair os médicos brasileiros para o programa, a nova versão do Mais Médicos pretende oferecer cursos de especialização para os profissionais de saúde. Os detalhes, no entanto, ainda não foram apresentados pelo Ministério da Saúde.

"O que vamos fazer é estudar formas de maior incentivo aos médicos formados no Brasil, é uma prioridade. A ideia é reapresentarmos o Mais Médicos com incentivo, qualificação e formação. O prazo é ter um desenho do programa e a nova edição sendo feitos", explicou a ministra da Saúde, Nísia Trindade, em entrevista ao Roda Vida, da TV Cultura.

Para Raul Canal, presidente da Sociedade Brasileira de Direito Médico e Bioética (Anadem), o governo precisa oferecer contrapartidas atrativas para que os profissionais brasileiros participem do programa.

"Para que isso aconteça, é preciso a estruturação de programas de incentivo, para que esses profissionais atuem em todos os cantos do território nacional, principalmente naqueles mais distantes dos grandes centros", argumenta.

A proposta para incentivar o provimento e fixação de profissionais será pactuada com estados e municípios.

Além disso, o governo federal avalia a possibilidade de novas prorrogações de contrato – atualmente as bolsas são disputadas via editais e têm prazo de três anos, podendo ser prorrogadas por mais três. Quanto a isso, o Ministério da Saúde informou à Gazeta do Povo que estuda formas de tornar a permanência no programa "mais longa e atrativa", porém, não indicou a estratégia que será empregada e nem o que acontecerá com os médicos cujos contratos estão expirando no começo deste ano.

Justiça determina que cubanos sem o Revalida sejam readmitidos

Representando quase 80% dos profissionais contratados na primeira versão do Mais Médicos, os cubanos deixaram o Brasil no final de 2018, logo após a eleição do então presidente Jair Bolsonaro (PL).

À época, o governo Bolsonaro, crítico do programa e da ditadura dos Castro, condicionou a manutenção dos contratos à realização dos exames de revalidação do diploma e ao repasse integral dos salários para os profissionais de saúde.

“Condicionamos a continuidade do programa Mais Médicos à aplicação de teste de capacidade, salário integral aos profissionais cubanos, hoje maior parte destinados à ditadura, e a liberdade para trazerem suas famílias. Infelizmente, Cuba não aceitou”, justificou o governo Bolsonaro.

Com as baixas, o Mais Médicos foi substituído pelo programa Médicos pelo Brasil, que até outubro do ano passado contava com mais de três mil profissionais contratados. A Gazeta do Povo perguntou ao Ministério da Saúde se o novo governo pretende encerrar o programa criado na gestão Bolsonaro, mas não obteve resposta.

Apesar da saída dos médicos cubanos do Brasil, uma decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF 1), de janeiro, determinou que o governo recontrate cerca 1,7 mil profissionais que tiveram os contratos rescindidos na gestão Bolsonaro. O pedido de recontratação foi apresentado pela Associação Nacional dos Profissionais Médicos Formados em Instituições Estrangeiras e Intercambistas.

De acordo com o desembargador Carlos Augusto Pires Brandão, a liberação dos médicos cubanos, mesmo sem o exame do Revalida, é tão importante para os profissionais, quanto para a saúde pública brasileira, especialmente de regiões de mais difícil acesso.

"Há um outro fato a recomendar esta urgente medida judicial. O Programa Mais Médicos para o Brasil permite implementar ações de saúde pública de combate à crise sanitária que se firmou na região do povo indígena Yanomami. Há estado de emergência de saúde pública declarado, decretado por intermédio do Ministério da Saúde”, justificou.

Apesar disso, a ministra da Saúde afirmou recentemente que a pasta ainda estuda como atender a determinação da Justiça. “Em relação à decisão da Justiça, a própria área jurídica do ministério está analisando para vermos como vamos lidar com os médicos cubanos", justificou Nísia Trindade.

Estudo mostra a concentração de médicos nos grandes centros do Brasil

Uma das justificativas do Ministério da Saúde para não promover acordos com outros países para a contratação de estrangeiros é a de que o Brasil ampliou o número de médicos nos últimos anos. Em 2012, o Brasil tinha 1,9 médico por mil habitantes e, atualmente, essa média está em 2,5, segundo o estudo "Demografia Médica no Brasil 2023" da Universidade de São Paulo (USP) e da Associação Médica Brasileira (AMB).

De acordo com o levantamento, o Brasil alcançou a marca de 562.229 médicos inscritos nos 27 Conselhos Regionais de Medicina (CRMs). Apesar disso, a maior parte dos profissionais está concentrada nos grandes centros do país.

A região Norte tem a menor concentração de profissionais para cada mil habitantes (1,45), já a Sudeste tem a maior concentração entre as regiões, com uma taxa de 3,39. O Distrito Federal tem, em média, 5,53 médicos para cada mil habitantes. Já no Pará, a média é de apenas 1,18.

"Isso significa que o volume não resolve o problema de saúde do Brasil. Não há novidade alguma quando apontamos que em municípios menores e mais distantes dos grandes centros há uma evidente falta de acesso aos serviços de saúde", explica Raul Canal.

Na avaliação do presidente da Anadem, a ausência de profissionais no interior do país não se dá pela falta de interesse, mas por falta de estrutura nessas regiões.

"A má distribuição de profissionais não resulta de um suposto desinteresse dos médicos, que até chegam a migrar para essas regiões. O grande problema é que acabam desistindo de atuar nessas cidades, onde notam a ausência de uma infraestrutura mínima. Não há o mínimo para atender com dignidade", argumenta Canal.

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