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Senador Ismael Alexandrino costurou acordo para flexibilizar decreto do desarmamento de Lula
Senador Ismael Alexandrino (PSD) debate com Jaques Wagner (PT)no Senado| Foto: Pedro França/Agência Senado

Após debates acalorados na semana passada, o plenário do Senado Federal deve votar nesta terça-feira (27) o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) que susta parcialmente o decreto antiarmas publicado em julho do ano passado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O principal ponto a ser derrubado é o que determina um distanciamento mínimo de um quilômetro entre clubes de tiro e escolas, o que na prática inviabiliza a atividade da maioria dos clubes. O governo e Centrão haviam firmado um acordo para aprovar o projeto, mas senadores governistas quebraram o combinado e o resultado da votação deve ser incerto.

O decreto de Lula determinou que os clubes de tiro têm até 27 de dezembro deste ano para buscar uma “adequação à lei”. Segundo estimativa da ABIAMB (Associação Brasileira de Importadores de Armas e Materiais Bélicos), isso poderia resultar no fechamento de mais de 95% das unidades pelo país. Isso porque para se adequar à lei a maioria dos clubes teria que mudar de imóvel, o que gera custos proibitivos.

O Projeto de Decreto Legislativo apresentado pelo deputado federal Ismael Alexandrino (PSD-GO) busca corrigir o que o parlamentar chama de erro cometido pelo governo federal. “A competência para regulamentar a localização de estabelecimentos é municipal. A medida invade a competência municipal e prejudica a segurança jurídica das entidades já estabelecidas, além de não ter qualquer justificativa técnica de melhoria da segurança pública”, afirmou o parlamentar à reportagem.

À reportagem, o secretário de Assuntos Legislativos do MJSP, Marivaldo Pereira, explicou que o tema é de total interesse para o governo. E que a orientação para barrar a flexibilização do decreto do desarmamento não é apenas do ministério ou de um assessor. Mas se trata de uma determinação da Presidência da República, que orientou contra o PDL. (Confira abaixo o posicionamento completo do ministério).

A proposta de Alexandrino já foi aprovada na Câmara em maio deste ano, em duas votações simbólicas, tanto na Comissão de Constituição e Justiça quanto no plenário. A votação só foi possível graças a um acordo articulado por lideranças do PSD com partidos da oposição e da base do governo. A relatora da proposta na Câmara foi a vice-líder da base de apoio ao governo, deputada Laura Carneiro (PSD-RJ).

A expectativa era de que o acordo fechado na Câmara fosse mantido também pelos senadores, mas isso não ocorreu. Na primeira tentativa de votação na CCJ do Senado, o Partido dos Trabalhadores pediu vista do projeto há duas semanas, adiando a apreciação.

O acordo firmado entre os líderes havia sido uma troca de favores. A oposição retiraria destaques apresentados ao projeto PL 1.847/2024, que propunha o fim da desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia. Esses destaques poderiam dificultar a aprovação do projeto, que era de interesse do governo.

Em troca, o governo não colocaria empecilhos para a aprovação do PDL das armas, que poderia ser votado simbolicamente, sem necessidade de registro nominal. Diante da proposta, todos os destaques foram retirados, e o texto de interesse do governo sobre a desoneração foi aprovado sem dificuldades.

No entanto, assim que o PDL 206 entrou em pauta, governistas começaram a manobrar para que ele não fosse votado. Parlamentares envolvidos no debate disseram à Gazeta do Povo sob anonimato que o Ministério da Justiça teria feito pressão sobre deputados governistas para que não aprovassem nada que enfraquecesse o decreto de Lula.

O desarmamento da população é uma das principais linhas de ação do Plano Nacional de Política Criminal e Penitenciária em discussão no ministério de Ricardo Lewandowski.

Aproveitando-se da ausência do relator, senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), que precisou viajar às pressas para Goiânia para acompanhar o enterro de um amigo, a Mesa Diretora nomeou um relator temporário, que decidiu pedir vista e adiar a sessão mais uma vez.

Percebendo que o acordo não seria cumprido, o senador Magno Malta (PL-ES) fez críticas aos senadores da base do governo. “Se não cumprimos esse acordo, será uma vergonha para nós. O Senado já não goza da boa vontade da população. Mas, quando fazemos um esforço, como fizemos na desoneração da folha, as coisas andam por aqui. Eu votei contra! Mas houve acordo, e por isso votamos! Eu não quero sair daqui com a sensação de que fui enganado em pleno plenário”, desabafou o parlamentar.

PSD vai tentar costurar acordo até o limite da votação

Depois de idas e vindas, para tentar acalmar os ânimos no plenário, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, sugeriu a votação por acordo da urgência da matéria. A manobra coloca o PDL como primeiro item da pauta da sessão semipresencial desta terça-feira (27/08), marcada para as 14 horas. Capitaneados pelo PSD, deputados e senadores continuam tentando chegar a um acordo para que a votação seja simbólica, respeitando o que havia sido combinado anteriormente nas votações na Câmara.

Nos bastidores, a queda de braço continua. Parlamentares ouvidos pela Gazeta afirmaram ter recebido visitas ou ligações de assessores do Ministério da Justiça, pressionando por uma posição contrária ao projeto.

Por outro lado, confederações, federações, associações e diversas outras entidades ligadas ao tiro esportivo têm encabeçado campanhas pedindo aos seus associados que entrem em contato com os senadores de seus estados, solicitando apoio ao PDL 206. Caso o acordo não seja honrado pelos partidos do governo, a proposta irá para votação nominal, precisando da maioria simples dos senadores presentes para ser aprovada. Se aprovado, o projeto segue para promulgação direta, sem necessidade de passar pela presidência da República.

PDL pode flexibilizar regras e diminuir exigências para a prática de tiro esportivo

O PDL 206/2024 também altera as regras relacionadas às armas de gás comprimido ou por ação de mola. O decreto 11.615 tornou as chamadas “armas de chumbinho” com calibre superior a seis milímetros de uso restrito, obrigando os proprietários a buscar certificação junto ao Exército Brasileiro e colocando esses produtos no mesmo patamar de armas de fogo como revólveres, pistolas e espingardas. A medida é suprimida do decreto pelo PDL.

O projeto também altera as regras sobre a habitualidade — quantidade mínima de treinamentos exigidos pelo Exército para que o atirador mantenha suas armas ou possa adquirir insumos e munições. Esse ponto do decreto encarece muito as despesas de atiradores esportivos que competem em diversas modalidades de tiro. Além disso, retira do decreto do governo a proibição de destinar uma arma de fogo restrita para uma atividade diferente daquela declarada na compra. Ou seja, uma arma comprada para o tiro esportivo poderá ser incluída nos acervos de caça ou coleção do CAC — sigla para Caçador, Atirador e Colecionador.

Orientação da Presidência da República é votar contra o PDL, diz secretário do Ministério da Justiça

O secretário de Assuntos Legislativos do MJSP, Marivaldo Pereira, explicou que o tema é de total interesse para o governo. E que a orientação não é apenas do ministério ou de um assessor. Mas se trata de uma determinação da Presidência da República, que orientou contra o PDL.

Segundo ele, caso o texto seja aprovado, seria criada uma lacuna perigosa na regulamentação do acesso às armas de fogo no Brasil, colocando em risco todo o esforço feito pelo presidente Lula para retirar o máximo possível de armas de circulação.

“Só para termos uma ideia, um dos pontos do decreto acaba com a obrigatoriedade de que, para ser colecionável, um determinado armamento tenha pelo menos 70 anos de sua primeira plataforma. Dessa forma, qualquer arma poderia ser comprada com a desculpa de que seria para coleção, inclusive armas de grosso calibre, como fuzis, utilizados pelas forças armadas. Além disso, a supressão de outro artigo do decreto 11.615 possibilitaria que uma arma comprada para coleção fosse transferida de acervo, indo parar facilmente em mãos erradas”, justificou o secretário.

Outro ponto delicado para o governo é a questão do distanciamento dos clubes e lojas de armas de escolas. O decreto do presidente Lula estabelece a distância mínima de um quilômetro de qualquer instituição de ensino. A regra vale, inclusive, para os estabelecimentos que já existiam antes do decreto.

“Que pai ficaria tranquilo sabendo que tem um clube de tiro perto da escola do seu filho? Ainda mais diante dos recentes casos de ataques em escola do país”, completou o secretário.

Mesmo assim, segundo ele, o governo está disposto a sentar e conversar sobre ajustes no decreto, que garantam a prática do esporte, mas que não comprometam a segurança do cidadão.

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